Jornal Estado de Minas

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Áudio em que Bolsonaro parece xingar a primeira-dama antes do desfile de 7 de setembro é falso

É falso o áudio de um vídeo compartilhado mais de 31 mil vezes nas redes sociais desde 7 de setembro de 2022 como se mostrasse o presidente Jair Bolsonaro (PL) xingando a primeira-dama Michelle Bolsonaro no bicentenário da Independência, em Brasília.



As imagens são reais e foram captadas ao vivo pela TV Brasil, mas, o teor da conversa não foi captado pela emissora. Além disso, peritos afirmam que a voz presente no vídeo viralizado não coincide com a de Bolsonaro.

"É muito amor envolvido", diz uma das publicações compartilhadas no TikTok, Twitter e Facebook. O conteúdo também foi enviado ao WhatsApp do AFP Checamos para verificação.

Segundo a sequência viralizada, o presidente Bolsonaro teria dito à primeira-dama Michelle, em uma aparente discussão na manhã de 7 de setembro: 'Tá querendo me foder, porra? Vai subir lá e fazer cara bonita. Tira essa cara feia, tira essa cara de cu. Tem que subir lá e sorrir para todo mundo'.



Uma marca d'água presente no vídeo indica que o registro foi feito pela TV Brasil, que acompanhava a saída do comboio presidencial do Palácio da Alvorada em direção à Esplanada dos Ministérios, onde foi realizado o desfile em comemoração ao bicentenário da Independência, em Brasília.

Mas, ao contrário do visto no vídeo viral, o áudio da conversa não foi captado pela transmissão ao vivo da TV Brasil.

Informações de bastidores divulgadas pela imprensa (1, 2) indicaram que o presidente tentava convencer a primeira-dama a acompanhá-lo no desfile no Rolls-Royce. Michelle Bolsonaro teria resistido a desfilar com o marido no carro aberto, mas acabou cedendo ao pedido do presidente.

Peritos afirmam que voz não é de Bolsonaro


A pedido da equipe do Comprova, projeto do qual o AFP Checamos faz parte, o perito Mauricio de Cunto elaborou um relatório preliminar. Segundo esse relatório, os parâmetros de Vocal Profile Analysis (VPA) - uma análise do perfil vocal - 'da voz presente no vídeo não coincidem com a voz original da pessoa flagrada nas imagens', ou seja, Bolsonaro.



Além disso, o documento ressalta que a gravação é curta, ruidosa e de baixa inteligibilidade. Os parâmetros técnicos do áudio foram considerados pobres, similares aos da transmissão de uma rádio AM, mas com baixíssima intensidade sonora.

'Por se tratar de uma gravação de apenas 13 segundos e muito ruidosa, editada e legendada, transmitida por WhatsApp, tal conjunto de características acaba favorecendo enormemente qualquer tipo de edição fraudulenta, visto que não existe nenhuma forma de rastreabilidade, originalidade, materialidade e confiabilidade quanto à ligação com o material original', aponta o relatório.

Assim, a gravação da TV Brasil se tornou 'alvo fácil para adulteração de frases e/ou palavras, dublagens, montagem de frases com inserção e/ou remoção de palavras, escondidos pelo intenso ruído de fundo, ruído este que poderia ter sido minimizado mas, inexplicavelmente, foi a única coisa que o editor não o fez'.



Quanto ao movimento labial, o documento informa que a qualidade da imagem é pobre e impede sua decodificação. O relatório também chegou à conclusão de que 'o áudio não condiz com uma voz distante que deveria ter menor inteligibilidade independente do ruído intrínseco'. Isso ocorre porque o vídeo mostra Bolsonaro a certa distância da câmera, onde supostamente estaria a gravação do áudio.

Para Cunto, o áudio é comprovadamente editado, com nenhuma garantia de rastreabilidade (o arquivo analisado foi enviado por WhatsApp e, com isso, perdeu metadados que poderiam indicar sua criação), originalidade (não é possível confirmar o tipo de câmera em que foi feita a gravação) e integridade.

O áudio viral também foi analisado pelo professor Mário Gazziro a pedido de veículos de imprensa. O conteúdo foi comparado com o áudio de um vídeo publicado por Bolsonaro nas redes sociais em setembro de 2018, quando estava internado após sofrer um atentado à faca durante a campanha daquele ano. A publicação de 2018 foi amplamente reproduzida pela imprensa e por apoiadores de Bolsonaro.



De acordo com Gazziro, a similaridade verificada foi apenas de 6%. O especialista explica que o porcentual abaixo de 80% demonstra que praticamente não há relação entre as vozes comparadas. Para chegar à conclusão, Gazziro analisou o trato vocal, que são as características específicas de cada pessoa.

Esse conteúdo também foi verificado pela Folha de S.Paulo, pela Agência Lupa e pelo Boatos.org.

Esse texto faz parte do Projeto Comprova. Participaram jornalistas do Metrópoles, d'O Popular e da CBN. O material foi adaptado pelo AFP Checamos