(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas PREVENÇÃO

Saúde física e mental: capacidade de amar e trabalhar

Se em 2000 já se previa a depressão como quadro prevalente na medicina até 2030, a pandemia antecipou essa tendência


06/12/2020 06:00 - atualizado 07/12/2020 13:24

(foto: CHRISTIAN DORN/PIXABAY )
(foto: CHRISTIAN DORN/PIXABAY )


A Organização Mundial da Saúde (OMS) define que a “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social”, não apenas a ausência de doenças, e amplia: “é um estado de bem-estar no qual cada indivíduo consegue aperceber-se do seu próprio potencial, consegue lidar com o estresse normal da vida cotidiana, consegue trabalhar de forma produtiva e ter sucesso e ainda é capaz de dar a sua contribuição à sua comunidade”.
 
Tal definição, enfatiza a psiquiatra e psicanalista Gilda Paoliello, está intrinsecamente relacionada com o contexto sociocultural em que vivemos, cujos valores vão condicionar os conceitos de saúde e doença mental, implicados pela natureza do homem.

“Afinal, o que nos torna humanos? A pergunta me remete a uma afirmativa de Freud sobre a função da psicanálise: 'Transformar a miséria neurótica em sofrimento comum', este sofrimento que tem a ver com as vicissitudes da vida e do qual não é possível escapar, com o qual temos que saber lidar. Mais tarde, já no final da vida, lhe fazem novamente a pergunta – 'Para que serve a psicanálise?' ao que Freud responde, pontualmente: 'Permitir ao homem amar e trabalhar'.”
 
Ricardo Dias de Castro, psicólogo, destaca que o sofrimento mental pode estar presente na vida de todos(foto: Arquivo Pessoal)
Ricardo Dias de Castro, psicólogo, destaca que o sofrimento mental pode estar presente na vida de todos (foto: Arquivo Pessoal)
 
 
Simples assim. A capacidade de amar e trabalhar são as duas coordenadas que Gilda Paoliello avalia que melhor definem a saúde mental e a natureza humana. Por outro lado, continua, tais pontuações freudianas destituem a felicidade como destino humano.

O completo bem-estar físico, mental e social, preconizados pela OMS, remetem ao princípio de realidade e não ao princípio do prazer: saber lidar com as vicissitudes da vida, saber amar, que significa, sobretudo, respeitar a alteridade, e trabalhar, criando possibilidades para uma vida melhor, para nós e para o outro, explica.
 
Para Gilda Paoliello, os valores da sociedade vão condicionar os conceitos de doença e saúde mental. “Importante refletirmos sobre o tempo atual, tão bem retratado pelo fenômeno da COVID-19: imprevisibilidade, incerteza e o imperativo do presente são as marcas da contemporaneidade. Não podemos ficar esperando que as coisas voltem a ser como antes, porque nada será como antes. Mais que nunca importa viver bem o hoje para que o futuro possa ser construído dentro do novo”, observa.
 
A psiquiatra e psicanalista destaca que tanto a psicanálise quanto a OMS colocam a capacidade de trabalho como uma importante coordenada para a saúde mental.

Entretanto, a globalização, com seus valores e simbologias servindo ao capitalismo, impõe suas condições de trabalho baseado no lucro sob a “bandeira” da informação, multiplicada nas mídias sociais sob o imperativo do “be happy”.

“Cria-se uma sociedade do espetáculo, em que a regra é 'fazer selfie pra mostrar que está tudo maravilhoso'. E nos tempos da COVID-19, essa imagem me parece mais perto do inferno que do paraíso.”

Pedido de ajuda


Gilda Paoliello lembra que estudos mostram o impacto dos tempos atuais sobre a saúde mental, assim como a previsão do aumento do número de quadros ligados ao sofrimento mental pós-pandemia.

“Se em 2000 já se previa a depressão como o quadro prevalente na medicina até 2030, a situação que vivemos com a pandemia já antecipa essa inferência. Lido todos os dias em minha clínica com as consequências, o que fomenta a avaliação de que o impacto na saúde mental é a sequela mais devastadora da pandemia.”
 
O que fazer para minimizar o impacto desses tempos sombrios na saúde mental? Gilda Paoliello aponta que os critérios diagnósticos de sofrimento mental incluem constantemente a condição de os sintomas causarem prejuízo ao funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo, como enfatiza o DSM, sistema classificatório de doenças mentais americano.

“Como vemos, tanto os manuais de diagnósticos atuais como a OMS e a psicanálise associam a saúde mental ao funcionamento social e/ou ocupacional. Entretanto, nos tempos atuais, as relações sociais são muito precárias, de forma excepcional agora, quando vivemos a imposição do isolamento social para sobrevivermos. Mas sobreviver não basta. Torna-se necessário apelar para todas as formas de fortalecimento dos laços sociais, da fraternidade, da solidariedade para mantermos a saúde mental.”
 
Gilda Paoliello, psiquiatra e psicanalista, diz que a capacidade de amar e trabalhar são as duas coordenadas que melhor definem a saúde mental e a natureza humana(foto: Arquivo pessoal)
Gilda Paoliello, psiquiatra e psicanalista, diz que a capacidade de amar e trabalhar são as duas coordenadas que melhor definem a saúde mental e a natureza humana (foto: Arquivo pessoal)
 
 
Para a psiquiatra e psicanalista, mais que nunca, é importante saber pedir ajuda e saber responder a esse pedido. Adoecer é completamente humano, pedir ajuda também. “Se cada um responder como puder, a somatória nos tornará mais fortes.” Gilda Paoliello mostra esperança partindo de uma fala de Nietzsche, “O mundo não possui coração e estúpido seria ter raiva dele por isso”.

Para a psiquiatra e psicanalista “coração, quem tem somos nós. Parodiando o discurso do presidente eleito nos EUA, Joe Biden, precisamos construir um tempo de união, de curar, de cada um emprestar sua luz e ser um farol para o mundo. Nessa fórmula, a melhor vacina para os males de nosso tempo”.
 

Cenário disruptivo

 
Ao longo do tempo, a definição de saúde mental foi alterada. O psicólogo Ricardo Dias de Castro, doutorando em psicologia social pela UFMG e docente dos cursos de serviço social e psicologia da Estácio BH, destaca que os profissionais da área operam com a ideia de saúde mental não só como ausência de doença mental, mas, sobretudo, como uma garantia de um bem-estar e um bem viver coletivo que permita aos sujeitos viverem suas vidas em toda a potência psíquica possível.
 
“Saúde mental, portanto, relaciona-se a como uma pessoa equilibra a si mesmo na relação com o mundo. Diz respeito a como ela enfrenta os desafios de ser gente no mundo contemporâneo embebido em conflitos, perturbações, confusões, imposições, exigências e traumas."

Mas, também, um mundo que se reinventa, redescobre-se e pode, potencialmente, virar outra coisa, inclusive, algo que seja mais potente e saudável para todos os seres humanos. "A saúde mental diz da capacidade do sujeito, ainda que com adoecimentos presentes, mantenha-se capaz de atuar e ser agente na comunidade”, enfatiza o psicólogo.
 
Desta forma, Ricardo Dias de Castro destaca que o sofrimento mental pode estar presente na vida de todos e a forma como ocorre a reação aos sofrimentos aponta para as próprias condições subjetivas, cognitivas, sociais, culturais e econômicas. “Como a saúde mental está, intimamente, relacionada às condições de vida que cercam o sujeito, as exigências sobre o seu equilíbrio vão, de fato, variando a cada período da vida em função das complexidades às quais todos são submetidos a depender da fase de desenvolvimento e condições simbólicas, materiais e econômicas disponíveis.”

Pandemia


Ricardo Dias de Castro explica que a pandemia é um cenário disruptivo, desorganizador e atípico. As regras do mundo alteraram de forma radical desde que a pandemia foi decretada pela Organização Mundial de Saúde.

“Isso, certamente, alterou a pretensa estabilidade mental da vida individual e coletiva. Esta grande tensão, medos e mudanças ocasionadas pelo vírus denunciam que precisamos repensar as prioridades como sociedade. Ainda que, instalado esse caos que 'paralisa' o sistema econômico mundial, é preciso cuidar da saúde mental. É importante investir em novas possibilidades de ser sujeito no mundo”, afirma.
 
Ele acrescenta que cada um precisa estar aberto a reconhecer o que lhe faz bem e potencializa um desejo de vida nesses tempos tão duros. “Houve uma procura muito grande por atendimentos psicológicos individuais no contexto da pandemia. Situações graves, desorganizadoras, tristes ou aquelas em que as palavras comuns não fazem mais tanto sentido no acolhimento ao sofrimento das pessoas, costumam ser catalizadores para a busca por um profissional da psicologia.”
 
Ricardo Dias de Castro ressalta que a prevenção na saúde mental é criar hábitos de autocuidados individuais, coletivos, comunitários e políticos que sejam diários e possíveis nas condições em que os sujeitos se encontram.

“Prevenir significa se antecipar. Não em uma perspectiva que invente causas e problemas inexistentes, mas que a partir dos registros históricos mundiais e locais disponíveis sobre os adoecimentos e seus combates, possamos pensar uma lógica de saúde coletiva que colabore para a potência subjetiva das pessoas de modo que evitemos situações graves e mortíferas.” 
 

» Impacto no pós-pandemia


Quais as consequências vividas agora na pandemia que vão fomentar a avaliação de que o impacto na saúde mental é  a sequela mais devastadora da COVID-19

1 – Medo de adoecer

2 – Angústia

3 – Dor de perder  pessoas queridas

4 – Impossibilidade de acompanhar entes queridos na partida derradeira

5 – A solidão do isolamento social

6 – A devastação física e interior sofridas por quem se contaminou

7 – A insegurança financeira

8 – O horror do desemprego

Fonte: Psiquiatra e psicanalista Gilda Paoliello
 

» Para alcançar o equilíbrio mental procure


• Fazer análise/terapia

• Praticar ioga

• Meditar

• Aprender a respirar

• Respeitar os limites e as vontades

• Ter disciplina e uma rotina organizada

• Fazer coisas positivas por você

• Afastar-se de coisas e pessoas negativas

• Aprenda a controlar sua ansiedade

• Ficar perto de quem te faz bem

• Dormir bem e na quantidade ideal

• Fazer 45 minutos diários de atividade física

• Não ter medo de procurar ajuda se sentir necessidade

• Distanciar um pouco das redes sociais

• Baixar as expectativas

• Ter equilíbrio emocional

• Fortalecer capacidade de decisão

• Aprender a dizer não

• Traçar sonhos e metas para a vida

• Se gostar 
      


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)