Depois da morte do líder seringueiro, o governo despertou para a questão ambiental. Mas não conseguiu diminuir o ritmo da devastação e da transformação das florestas de seringueiras em pasto. Nos últimos 20 anos, as queimadas e derrubadas destruíram 370 mil quilômetros quadrados de florestas primárias. Uma das áreas atingidas foi o seringal Cachoeira, onde nasceu Chico Mendes e que depois de sua morte foi transformado em reserva extrativista que leva o nome dele. Dos 970 mil hectares na zona rural dos municípios de Xapuri, Brasíléia, Rio Branco, Sena Madureira e Capixaba, 5% já foram derrubados. A castanheira e a seringueira, que antes garantiam o sustento dos povos da floresta, aos poucos deram lugar a 10 mil cabeças de gado, o dobro do permitido pela lei ambiental. É tudo o que Chico Mendes não queria.
“Se eu disser que todos os ideais de Chico Mendes foram realizados, não estarei dizendo a verdade. Há muito a ser feito, como na reserva que foi criada. O governo não deu condições para seus moradores, que estão transformando suas colocações em pastos”, afirma a viúva do líder seringueiro, Ilzamar Gadelha Mendes. Ela também preside a fundação que leva o nome do marido. Segundo ela, por falta de alternativas, os seringueiros estão trocando as atividades extrativistas pela criação de gado. “O pessoal cria boi para viver. Tem que ter mais investimentos na área”, acrescenta a viúva.
As preocupações de Ilzamar têm razão de ser. Segundo levantamentos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), os desmatamentos na Reserva Extrativista Chico Mendes ocorrem em mais de 20% da área ocupada pelos seringueiros. A devastação é ainda em um percentual pequeno, mas colocou as autoridades em alerta. “A área regular é de 75%”, afirma Sebastião Santos da Silva, que coordena uma operação com a Polícia Federal para fiscalizar a região.
Conheça os personagens da triste história
Pecuária
Os dados só foram levantados pelo Ibama por causa do controle de vacinação dos rebanhos. Isto significa que o controle é falho e o número de cabeças de gado pode ser bem maior. Cada morador tem direito a criar até 30 animais nos 15 hectares de cada colocação (gleba) destinados a pastagens. Mas o que as autoridades têm observado é que esse número está quase duplicado. “Os desmatamentos também estão bem acima do limite, chegando até a 20% a mais nas áreas ocupadas”, diz Silva.
Foi na região onde hoje é a reserva extrativista que Chico Mendes teve seus primeiros confrontos com Darly Alves. O fazendeiro, que tinha fugido para o Acre depois de cometer outros crimes em Umuarama, no Paraná, queria ampliar a área de pastagem para a criação de gado. Para isso, expulsou seringueiros de suas glebas e começou a devastação. Então presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, Chico Mendes impedia que as castanheiras e seringueiras fossem derrubadas, realizando o que chamou de “empates”. Junto com outros homens, mulheres e crianças, o líder enfrentou as motosserras até que as derrubadas fossem paralisadas.
Polícia
Isso colocou Chico Mendes diante do perigo iminente, que se tornou ainda mais claro quando o líder seringueiro trouxe do Paraná uma carta precatória mostrando que o fazendeiro era procurado pela polícia. Chico recebeu proteção policial, mas isto não foi o suficiente para evitar sua morte. Orientado pelo pai, Darci Alves Pereira ficou de tocaia durante vários dias nos fundos da casa de madeira do sindicalista, até que, na noite de 22 de dezembro de 1988, conseguiu enxergá-lo no banheiro do quintal e acertá-lo com um tiro de espingarda. Chico caiu morto diante de Elenira, sua filha de 4 anos à época.