A extravagância do consumo na capital do país parece não ter limites. Cada vez mais comum em lojas de renome e nos badalados restaurantes da cidade, esse comportamento agora tomou conta da noite dos brasilienses. Em festas regadas a muita vodca com energético e garrafas de champanhe, jovens chegam a gastar, em poucas horas, entre R$ 5 mil e R$ 8 mil. Há casos ainda mais emblemáticos, como o de um aniversariante que bancou a bebida de todos os convidados e, em uma única noitada, desembolsou quase R$ 40 mil em uma boate da cidade.
No escuro, embalados pela batida frenética da música eletrônica, baladeiros pagam, sem reclamar, valores estrategicamente inflacionados. Enquanto um litro de vodca sueca custa R$ 310 em casas noturnas, nos supermercados o mesmo produto pode ser comprado por R$ 70 — 4,5 vezes menos (veja mais exemplos na arte). A maior e mais cara champanhe da noite candanga vale R$ 2.799. E, mesmo assim, as garrafas de 3 litros não passam muito tempo na prateleira.
Seduzidas pelo potencial de uma Brasília com a maior renda per capita do país — o Produto Interno Bruto (PIB) per capita chega a R$ 50 mil, três vezes mais do que a média nacional —, repleta de servidores públicos bem remunerados e com iniciativa privada em expansão, marcas internacionais de boates resolveram apostar na cidade, assim como já ocorrera com as grifes de roupas e as lojas de produtos exclusivos. “Brasília está cheia desses malucos que estouram champanhe para aparecer. Para eles, a noite é uma vitrine. Como empresário, acho uma maravilha”, define André Etrusco, 35 anos, proprietário de casas noturnas.
Este mês, resultado de um investimento de R$ 2 milhões, chegará a Brasília a Kiss & Fly, club com sede em Nova York e que no Brasil já funciona por meio de uma franquia na Villa Daslu, em São Paulo. A empresa colocou à venda 50 cartões vips, a R$ 3 mil ou R$ 6 mil cada. Todos ganharam dono em menos de uma semana. Com um desses em mãos, a pessoa tem o direito de curtir as festas ao longo de um ano, com acompanhante. Quem pagou mais poderá reverter metade do valor em consumação.
Para março de 2012, está prevista a inauguração de um complexo de lazer às margens do Lago Paranoá. Orçado em R$ 36 milhões, terá duas boates e provavelmente uma casa especializada em música sertaneja. Entre os estabelecimentos confirmados está a Pachá, danceteria de luxo da badalada ilha de Ibiza, na Espanha, e presente em diversos países. No Rio de Janeiro, o sócio da marca é Thor Batista, filho do bilionário Eike Batista.
Reis da noite
O Brasil tem os seus “reis da noite”. Trata-se de um grupo seleto de clientes dispostos a pagar o que for em uma balada. São geralmente homens, solteiros, entre 30 e 40 anos, que exigem as melhores bebidas e em grande quantidade. Muitos, por pura diversão ou mesmo para impressionar, ainda costumam bancar todo o consumo da casa por um tempo determinado. Nessa brincadeira, garantem os produtores de festas, há quem gaste, em São Paulo, mais de R$ 100 mil em uma noite.
Em Brasília, com a abertura de boates estrangeiras, onde apenas a entrada pode custar R$ 120, os empresários torcem para que baladeiros desse tipo apareçam. “O público da noite brasiliense mudou. Os clientes vips não gostam de se misturar. Quando um lugar começa a se popularizar, eles deixam de ir e cobram do mercado alvo novo”, afirma André Etrusco, sócio da Moena, no Pier 21, que aglutina 900 pessoas em dias de casa lotada.
Ricardo Batista, empresário do ramo imobiliário, encara a balada quatro vezes por semana. “Tenho 30 anos, sou solteiro, vou ficar em casa fazendo o quê? Olhando para o teto?”, pergunta ele. A cada saída, torra aproximadamente R$ 700. Numa “noite inesquecível”, confessa ter dividido com um amigo uma conta de R$ 5 mil. “É muita coisa, eu sei disso, mas não devo nada a ninguém. Não sou playboy, me considero um bon vivant.” Se for uma vez por semana à boate, o empresário gastará R$ 2,8 mil por mês, o equivalente a cinco salários mínimos.
A “seleção natural” da noite sempre leva Ricardo para lugares privilegiados nas boates. Depois de pedir duas garrafas de vodca acompanhada de latinhas de energético, os produtores da festa costumam reservar para ele um camarote, onde os gastos aumentam. “Como você não vai pagar uma champanhe para uma mulher gata? Vamos falar sério: eu vou para a noite atrás de mulher, não é de música. No fundo, a realidade é essa.”
Colaborou Antonio Temóteo
Filas
Os donos de boates reconhecem que adotam a estratégia da fila, mas a atribuem aos concorrentes. As filas são formadas para atrair mais público. Após determinado horário, geralmente 23h, o preço dos ingressos sobe.