A fila de pretendentes a adotar crianças no país é imensamente maior que a quantidade de menores disponíveis para a adoção. A realidade, porém, se inverte quando o assunto são os meninos e as meninas de 11 a 18 anos. Um levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ao qual o Correio teve acesso mostra que apenas 154 famílias têm interesse em adotar adolescentes com idade igual ou superior a 11 anos. Isso significa pouco mais de 0,5% do total de candidatos, que é de 26.936. E as restrições não param por aí. Dos 26.936 interessados, 36,5% só aceitam crianças brancas. Enquanto 2,1% só as negras (veja quadro).
Todos aqueles que se encontram em abrigo — que, segundo o CNJ, são 35.285 pessoas — estão nas mãos de juízes, que têm prazo de dois anos, desde a entrada da criança no abrigo, para definir o futuro dos acolhidos. Somente depois de um longo processo de análise é que o magistrado determina se o menor será incluído no Cadastro Nacional de Adoção (CNA) ou se será devolvido aos pais ou às famílias extensas, que são os tios e os avós. Hoje, 4,9 mil crianças e adolescentes fazem parte do cadastro. “A maioria dos pretendentes quer menina, branca, sem doença e que não tenha irmãos”, afirma o juiz auxiliar do CNJ Nicolau Lupianhes.
Em todo o país, os principais motivos do acolhimento de crianças em abrigo estão relacionados a problemas familiares e à omissão do Estado. “Os fatores são normalmente de desestrutura familiar. Os pais, muitas vezes, são alcoólatras, usam entorpecente. As crianças acabam sendo vítimas do abandono, de abuso sexual e de maus-tratos”, detalha o juiz Nicolau Lupianhes. Segundo o magistrado, somente 30% dos menores costumam retornar para o convívio dos pais depois de passarem pelo abrigo. O restante segue para adoção ou, no pior cenário, vive em abrigos até completar 18 anos. No Distrito Federal, 618 menores estão nos abrigos aguardando uma decisão da Justiça.
Pouco indicado
As condições dos 1.973 abrigos do país são as mais variadas possíveis, segundo o CNJ. No entanto, especialistas alertam que o abrigo nunca é um local ideal para a criança viver. “O lugar adequado para a criança é a família. Qualquer lugar que não seja a família não é ideal, mas o abrigo, às vezes, é necessário”, reconhece a psicóloga Soraia Pereira, presidente do Projeto Aconchego — grupo de apoio a adoção que atua há 15 anos em Brasília. Lupianhes, do CNJ, diz que mais importante que o tempo de análise da situação da criança pela Justiça é a cautela, para que prevaleça sempre a decisão que for melhor para ela.
Mudar a idealização geralmente feita pelos interessados em adotar é outra necessidade. “Crianças mais velhas e grupos de irmãos têm mais dificuldade de serem colocados em uma família substituta. Trabalhamos para mudar o perfil desse pretendente, passando a dar informações para eles”, diz Soraia. O juiz Lupianhes destaca que os grupos de apoio à adoção são importantes parceiros do Judiciário para o bom andamento dos processos. “Só conseguimos garantir os direitos se houver trabalhos em parceria.”
Em baixa no DF
Em 2010, segundo dados da Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal, foram autorizados 253 processos de adoção — contra apenas 26 neste ano, conforme mostrou o Correio em reportagem no último dia 5. A média mensal passou de 21 casos para três em 2011, o que resultou em uma redução de 86% no número de adoções na capital do país. Aqui, 98% dos pretendentes desejam crianças com menos de 2 anos, mas, das 167 disponíveis, 100 são adolescentes.
À espera da nova família
Para 4,9 mil crianças e adolescentes, a Justiça decidiu que eles terão de ser adotados. Saiba quem são os integrantes do Cadastro Nacional de Adoção:
Brancos 33,8%
Negros 18,7%
Pardos 46,3%
Têm problemas de saúde 22,5%
Os futuros pais
Conheça o perfil dos 26.936 retendentes à adoção no país:
Casados 80%
Têm filhos biológicos 25%
Têm filhos adotivos 10%
Só aceitam crianças de 11 a 17 anos 0,5%
Só aceitam brancos 36,5%
Só aceitam negros 2,1%
Só aceitam pardos 5,7%
Indiferentes em relação
à raça da criança 33,7%
Fonte: CNJ