Em clima de expectativa e disputa por espaço, o julgamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), do processo sobre o direito de as gestantes interromperem a gravidez nos casos em que há fetos anencéfalos (malformação do tubo neural) envolveu nesta quarta-feira favoráveis, contrários e curiosos. O plenário da Suprema Corte lotou deixando muitos do lado de fora à espera de um assento. Alunos de direito também comparecem por considerar este um dos principais momentos da história jurídica do país.
No entanto, os seguranças da Suprema Corte não registraram momentos de tensão nem confrontos entre os grupos antagônicos. Por cautela, a Polícia Militar (PM) do Distrito Federal foi acionada para ficar em alerta e acompanhar o julgamento.
“[Estamos aqui para defender] o direito da autonomia reprodutiva. A mulher deve decidir com o apoio de médicos, sem a necessidade de autorização judicial, o que deseja fazer [manter ou não a gravidez sabendo que o feto é anencéfalo]”, disse o médico Cristão Rosas, da Federação Brasileira da Associação de Ginecologia e Obstetrícia.
De acordo com o médico, pesquisa na Universidade de São Paulo (USP) feita com 80 mulheres que deram à luz a bebês anencéfalos mostrou que em 5% dos casos elas perderam o útero devido às complicações no parto porque a criança tinha a malformação cerebral.
Mas para os contrários à descriminalização do aborto em caso de grávidas de fetos anencéfalos, os argumentos apresentados por especialistas e também pelo ministro Marco Aurélio Mello, do STF, único a votar até o momento, são insuficientes.
“Vivemos em uma democracia. Se vivemos em um mundo democrático, não podemos tirar esses direitos das crianças, pois elas nem podem se defender. Para mim, isso é um preconceito: querer tirar a vida de um bebê só porque vai nascer defeituoso. O aborto é um crime. Não acredito que há mães que fazem essa distinção”, disse Valéria Cristina Almeida, de 28 anos, mãe de um bebê de 4 meses.
O padre Luiz Carlos Ludi, de Anápolis (Goiás), lidera a vigília em frente ao prédio da Suprema Corte. Ludi disse que batizou dois bebês com anencefalia. “Temos direito absoluto à vida desde a concepção até a morte natural independentemente do tipo de deficiência, inclusive no caso de anencefalia”, disse ele.
A sessão de julgamento começou por volta das 9h40 de hoje, depois foi interrompida por cerca de duas horas para o almoço e será retomada às 14h30. A previsão é que o julgamento dure todo o dia com possibilidade de ser ampliado até esta quinta-feira.
Faltam votar os ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso. O ministro Antonio Dias Toffoli não votará, pois no passado, quando era advogado-geral da União, manifestou-se favorável à interrupção da gravidez no caso de anencéfalos.