Brasília – Na semana em que o chanceler espanhol José Manuel García-Margallo visitou o Brasil e firmou o compromisso de resolver a crise entre os dois países, mais turistas brasileiros ficam retidos no Aeroporto de Bajaras, em Madri. Sem a permissão de seguir viagem pelo território europeu, o artista plástico baiano Menelaw Sete, de 47 anos, e seu assistente Paulo Coelho já estão de volta a Salvador. Ambos faziam parte do grupo de sete cidadãos do Brasil barrados, na última sexta-feira, sob a alegação de não terem a documentação necessária para entrada na Espanha. Desde o dia 2 de abril, a relação entre os dois países se tornou ainda mais espinhosa com a reciprocidade de tratamento aplicada pelo governo brasileiro aos turistas espanhóis que visitam o Brasil.
Na última quarta-feira, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, cobrou do colega espanhol um tratamento "correto e respeitoso" aos brasileiros que chegam àquele país. Como resposta, obteve o compromisso de Margallo de que as equipes espanholas trabalhariam, a partir daquele momento, para que as dificuldades fossem resolvidas de forma imediata. No entanto, não é essa a história que os familiares de Menelaw Sete relatam. O artista embarcou no Aeroporto Internacional de Salvador, na quinta-feira, às 21h50, com destino à cidade italiana de Milão, onde o pintor iniciaria uma temporada de exposições pela Europa.
A mulher de Menelaw, Jaci Ramos, tomou conhecimento da situação às 9h de sexta-feira, ao receber uma ligação angustiada do marido, que se disse constrangido pela atitude das autoridades espanholas. "Há mais de 15 anos ele viaja à Europa para fazer exposições. Todas as vezes levou o mesmo documento, declarando que o Ezio seria a pessoa responsável pela estada. Desta vez ele não conseguiu passar, não sabemos o porquê", conta Jaci. Menelaw e Paulo seguiriam para Domossola, na Itália, onde se encontrariam com o empresário Ezio Dellapiazza, que há anos recebe Menelaw na Europa.
Menelaw detalhou por telefone à mulher que o grupo de turistas impedidos de entrar no país foi mantido durante toda a sexta-feira em uma sala dentro do Aeroporto de Bajaras. Segundo as informações de Jaci, muitas pessoas choravam e o assistente de Menelaw teria sido impedido de tomar sua medicação para hipertensão. "O Menelaw disse que o Paulo sentiu alterações na pressão e não pôde tomar o remédio. Não foi permitido por eles. Só disseram isso." Depois de Domossola, Menelaw iria expor em Milão e em Brisado, na Suíça. O retorno estava agendando somente para 19 de junho.
Dificuldades
O Ministério de Relações Exteriores do Brasil lamentou que fatos como esse continuem a ocorrer. O órgão reforçou que haverá uma reunião entre assessores dos dois países, em 4 de junho, em Madri, quando os acordos bilaterais que regulam o tema deverão ser revistos. De acordo com a assessoria do Itamaraty, a soberania de cada país permite que a Espanha escolha quem deverá ser admitido em seu território, porém a resposta brasileira de adotar as mesmas regras usadas pelo país ibérico poderá ser mantida se as dificuldades continuarem.
Desde que as medidas de reciprocidade entraram em vigor, no início de abril, turistas espanhóis precisam apresentar passagem de volta, reserva de hotel ou carta-convite (em caso de hospedagem em residência), para entrar no Brasil, além de um cartão de crédito com a última fatura para comprovar que o visitante dispõe de pelo menos o equivalente a R$ 170 para gastar por dia de permanência. Em 3 de abril, um médico espanhol foi o primeiro a não atender alguns requisitos para a entrada no país e precisou ser repatriado depois de tentar ingressar no Brasil pelo Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília.
Repatriado
A repatriação de um médico, em abril, foi o primeiro episódio derivado do endurecimento das regras de ingresso no Brasil para turistas espanhóis. Ele embarcou em um voo da companhia portuguesa TAP, em Madri, e aterrissou em Brasília por volta das 6h da manhã. No início da tarde, o médico foi enviado de volta à Espanha. A medida vinha sendo discutida devido ao alto número de turistas brasileiros barrados em aeroportos da Espanha. Em 2010, mais de 1,5 mil brasileiros foram impedidos de entrar no país ibérico sob a alegação de que os documentos que portavam eram insuficientes para comprovar que a estada seria legal.
Entenda o caso
Os conflitos entre Brasil e Espanha tiveram início em fevereiro de 2008. Nessa data, o governo espanhol afirmou que alojava 100 mil imigrantes brasileiros – 60% deles em situação irregular – e decidiu reforçar o controle de entrada para cidadãos do Brasil.
A partir daí, o número de brasileiros barrados pela imigração espanhola aumentou 20 vezes.
As normas foram novamente reforçadas, em junho de 2011, com a imposição de multa equivalente a
R$ 230 mil para quem desse abrigo, comida e trabalho a estrangeiros sem documentação.
A resposta do governo brasileiro chegou em fevereiro deste ano, ao anunciar que adotaria as mesmas medidas tomadas pela Espanha caso o país não mudasse o tratamento dispensado aos turistas brasileiros.
No mês seguinte, a idosa Dionísia da Silva permaneceu três dias no Aeroporto de Barajas, em Madri, após ser retida sem a documentação completa.
Em nome do princípio da reciprocidade, no mês passado entraram em vigor no Brasil as medidas anunciadas no início do ano. - Desde então, 31 espanhóis foram barrados nos aeroportos brasileiros.
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