O crime de racismo, hoje inafiançável e imprescritível, pode perder status e deixar de ser punido se forem aprovadas integralmente as propostas para a nova redação do Código Penal Brasileiro, elaboradas no Congresso Nacional. Para tentar evitar que isso aconteça, a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial criou nessa terça-feira um grupo de trabalho que vai acompanhar as sugestões do Congresso Nacional. O principal ponto de divergência é o entendimento do conceito de princípio da insignificância, que consta tanto no anteprojeto elaborado pela Comissão de Juristas no Senado quanto no relatório de reforma do código da Subcomissão de Crimes e Penas, da Câmara dos Deputados, entregue ontem.
No entendimento do grupo de trabalho, o mecanismo que pode fazer com que uma pessoa que furtou um pacote de biscoito não vá parar atrás das grades pode fazer com que alguém que insultou ou cerceou direitos do outro por racismo não responda pelo crime. O advogado e ex-secretário de Justiça e Direitos Humanos de São Paulo Hédio Silva acredita que esse entendimento abre uma porta larga para quem entende que o racismo não tem importância.
Segundo Silva, caberá ao juiz a interpretação. “Ele pode, por exemplo, não considerar o fato criminoso quando, em sua interpretação, for mínima a ofensividade da conduta do agente, for reduzidíssimo o grau de reprobabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica. A maior parte dos juristas não está a par dessa alteração e do alto grau de risco que isso representa como retrocesso no enfrentamento ao racismo.”
MUDANÇASO grupo, no entanto, não se restringe a essa questão. A ministra Luiza Bairros explicou, ontem na abertura do trabalho da equipe, que o objetivo é produzir não apenas uma avaliação, mas também propor mudanças no código. “Não é preciso dizer da importância que a questão penal sempre teve para a população negra no Brasil. Em muitos sentidos, o racismo se constitui pela criminalização da negritude. O fato de ser negro e as manifestações todas que se referem à presença negra no Brasil sempre foram criminalizados.”