Um projeto coordenado por um hospital e uma organização não governamental (ONG) na região metropolitana de Curitiba garante que mães transportem seus filhos recém-nascidos em equipamentos veiculares de segurança desde a saída da maternidade.
Denominada Motorista Cegonha, a iniciativa é inédita no país, de acordo com seus organizadores, o Hospital Angelina Caron, sediado em Campina Grande do Sul (PR), e a ONG Instituto Paz no Trânsito. Mais de 90% dos atendimentos do hospital, que é privado, são feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
O projeto consiste na entrega do bebê-conforto, equipamento indicado para o transporte de crianças até 1 ano de idade. Após esse período, as famílias trocam o bebê-conforto pela cadeirinha, adequada para crianças de 1 a 4 anos. Por fim, recebem o assento de elevação, destinado a crianças de 4 até 7 anos e meio. As futuras mães recebem os equipamentos como empréstimo, comprometendo-se a trocá-los e a devolvê-los conforme o crescimento de seus filhos.
"Não podemos permitir às mães o primeiro erro. Se o bebê chega com segurança em casa sendo carregado no colo em sua primeira viagem de carro, isso pode gerar uma falsa impressão de que os braços são um local seguro, o que não é verdade", disse à Agência Brasil o neurocirurgião Arnaldo Dias dos Reis, coordenador do projeto. "Em caso de colisão, a criança pode ser arremessada ou mesmo esmagada pelo próprio corpo da mãe", alertou.
Tanto os pais como as mães são treinados para usar os equipamentos do modo correto. "Usar o bebê-conforto desde a primeira viagem é fundamental para que a criança já se acostume com o equipamento desde os primeiros dias", declarou Reis. "É uma contenção parecida com a do útero materno."
Os recursos para a viabilização do projeto foram obtidos pelo Instituto Paz no Trânsito por meio de doações e parcerias com a iniciativa privada. Mais de 40 famílias já foram beneficiadas, inclusive as que não têm carro. "Elas também precisam dos equipamentos quando andam de táxi ou pegam uma carona com parentes para ir ao pediatra, por exemplo", observou Christiane de Souza Yared, presidente da ONG, em entrevista à Agência Brasil. "Também estamos buscando financiamento público", disse.
Christiane Yared fundou a ONG há cerca de dois anos, após seu filho, Gilmar Rafael Souza Yared, ter morrido em um acidente de carro, em maio de 2009. O então deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho, que estava em outro veículo, foi denunciado por homicídio pelo Ministério Público por dirigir alcoolizado e em alta velocidade. Ele renunciou ao mandato após o acidente e aguarda o julgamento em liberdade.
"Fui dar uma palestra no hospital e um pai perguntou se eu sabia quanto custava um bebê-conforto e uma cadeirinha. Respondi que não, mas sabia quanto custava um lugar no cemitério, um caixão, um choro que dura para sempre", lembra Christiane. "As mortes não param. A morte sobre rodas é uma indústria que beneficia seguradoras, advogados, hospitais, funerárias, cemitérios. No acidente do meu filho, quem me acordou de madrugada com um telefonema foram dois agentes funerários, interessados no Dpvat [Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores Terrestres]. É desumano."
Equipamentos como o bebê-conforto e a cadeirinha chegam a custar de R$ 180 a R$ 300, ou mais. E nem sempre as famílias têm dinheiro para adquiri-los ou mesmo estão sensibilizadas para a necessidade do equipamento. "Recebi o bebê-conforto com 36 semanas de gravidez, cerca de 15 dias antes do parto", relatou Isabel Aparecida dos Santos, de 35 anos, que deu à luz a um menino, Moisés Rafael dos Santos Rosa. "Ele foi bem na primeira viagem, parte dela feita pela BR-116, não chorou nem nada."
Isabel disse que, antes das palestras sobre a importância do equipamento, não tinha a noção exata da sua necessidade. "Hoje, eu acho um absurdo o fato de muitas pessoas carregarem as crianças soltas no banco de trás", ressaltou. "Os preços ainda são muito altos, as empresas e o governo deveriam trabalhar para torná-los mais acessíveis."
Transportar crianças em veículo automotor sem observar as normas de segurança é uma infração gravíssima segundo o Código de Trânsito Brasileiro. A multa por descumprir as normas é R$ 191,54, e 7 pontos na Carteira Nacional de Habilitação. O cumprimento da Resolução nº 277 do Conselho Naciontal de Trânsito (Contran), que regula esse transporte, está sendo fiscalizado desde setembro de 2010.