Divididos entre a dor de perder os amigos e o alívio de não presenciar o horror da tragédia na Kiss, um grupo de 40 alunos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) está no Rio desde o domingo. Alunos do curso de Educação Física, o grupo partiu da cidade gaúcha na noite de sexta-feira para uma visita às instalações dos Jogos Olímpicos de 2016. Naquela madrugada, por volta das 5 horas, a notícia do incêndio chegou pelo celular em uma ligação cortada por falhas da telefonia na estrada.
Às primeiras informações, seguiu-se “um silêncio e uma angústia” diz o estudante Lucas Machado, de 23 anos. Pouco depois, já perto de desembarcar no Rio, veio a confirmação. “A mãe de um colega ligou perguntando onde ele estava. Quando entendemos o que aconteceu foi uma comoção só, o ônibus veio abaixo”, relembra. “Fiquei aos prantos, perdi um amigo muito próximo e muitos outros conhecidos”, diz Machado.
Ao saber da notícia, cogitaram voltar para Santa Maria, mas retornar significaria mais 1.700 quilômetros de estrada ou 25 horas de viagem sem descanso. Mesmo consternados, a programação foi mantida. “Graças a Deus estávamos no Rio”, diz Daniel Carvalho, de 21 anos.
A viagem teve visitas no Complexo do Alemão, Corcovado e canteiros de obras da Olimpíada. Ontem, os estudantes participaram de um encontro com representantes da Autoridade Pública Olímpica (APO). A concentração, entretanto, era pouca. Alguns liam jornais, distraídos, outros buscavam pelo celular notícias dos amigos.
Assim como os jovens que organizaram a festa Agromerados na boate Kiss, o grupo de Educação Física planejava um evento no local, em abril, para arrecadar fundos para a formatura. Maiara Becker, de 23 anos, diz que o namorado, que era da turma de Agronomia perdeu 27 amigos. “Ele só não foi à boate pois eu vim para cá e ele não queria ir sozinho”, diz, emocionada.
Volta para casa
O grupo deixa o Rio nesta quinta-feira e deve chegar a Santa Maria no sábado. “A nossa família sabe que a gente está bem, mas não importa. Eles querem ver, abraçar”, diz Machado. “A todo momento vemos a TV, as manchetes de jornal, não tem como fugir. Nós não estávamos lá, não sentimos na pele. Não sabemos o que vamos encontrar.”
Para Amanda Strassburguer, de 18 anos, será preciso uma nova geração de estudantes para que o trauma da cidade seja superado. Ela perdeu um primo e quatro amigos. “Santa Maria era viva, as pessoas andavam pelos calçadões, se encontravam nas praças. Eram muitos jovens. Era muito divertido, tinha uma alegria grande no ar. Agora...”
Pela internet, amigos de Santa Maria contam que não conseguem dormir no escuro, temem ficar sós, “se sentem desprotegidos”. Outros contam que a cidade está em silêncio profundo, cortado apenas pelas sirenes de ambulâncias. “Uma coisa é você ser solidário com quem perdeu os amigos, outra coisa é perder os amigos”, diz Lucas Machado. “Não sei quando isso vai curar.”