Jornal Estado de Minas

MPF diz que Funai não cumpre atribuições para proteger índios afetados por Belo Monte

Agência Brasil
A Fundação Nacional do Índio (Funai) não está cumprindo como deveria as atribuições que tem para defender os índios que serão prejudicados pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, diz o Ministério Público Federal no Pará. Segundo os procuradores federais, falta à Funai “rigor” para cobrar da Norte Energia, empresa responsável pela construção e operação da usina, o cumprimento de diversas condicionantes.
O MPF informa ter constatado, na regional da Funai em Altamira (PA), um “ambiente caótico, sujo, sem condições dignas para os servidores e para os indígenas”. De acordo com o Ministério Público, tal situação compromete o atendimento aos índios da região. Em nota, o MPF informa que a licença de instalação concedida à Norte Energia estabelecia que o empreendimento só teria viabilidade se houvesse “maciço e imediato investimento governamental” com a contribuição do empreendedor para o fortalecimento institucional da Funai.

Após receber a licença, a Norte Energia assinou termo de compromisso com a Funai prevendo o fortalecimento institucional do órgão indigenista. Isso incluiria, segundo o MPF, a construção de uma nova sede da fundação em Altamira, a contratação de equipe técnica, doação de equipamentos, material de consumo e prestação de serviços de manutenção. O compromisso expirou no ano passado, com execução apenas parcial. A nova sede ainda não ficou pronta.

Diante desse cenário e da falta de retorno da Funai, os procuradores deram prazo de até 20 dias para que a presidenta da fundação, Marta Azevedo, tome medidas para resolver a situação. Entre as recomendações feitas pelo MPF está a adoção de “medidas adequadas e necessárias para exigir da Norte Energia o cumprimento imediato” das condicionantes. O Ministério Público também pede um relatório detalhado sobre a demanda excedente da Coordenação Regional Centro-Leste do Pará, gerada pela construção da Usina de Belo Monte.

Consultada pela Agência Brasil, a Norte Energia informou não ter recebido qualquer manifestação do Ministério Público ou da Funai, e que ainda aguarda isso para se manifestar sobre o assunto. A Agência Brasil entrou em contato também com a Funai, em Brasília, e recebeu mensagem por e-mail na qual a entidade diz que, embora já tenha tomado conhecimento das recomendações do MPF, não vai se manifestar por enquanto. A Regional Centro-Leste da Funai não respondeu às ligações feitas pela reportagem.

A obra da usina também é criticada por parlamentares, mas por causa de outros problemas sociais. Na quarta-feira, dia 6, o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas, deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), criticou o que classificou de “conivência” do Consórcio Construtor Belo Monte (CCBM) com a existência de prostíbulos próximo ao canteiro de obras. Há poucas semanas uma operação conjunta das polícias Militar e Civil do Pará libertou 16 mulheres, uma adolescente e uma travesti mantidas em cárcere privado e obrigadas a se prostituir.

“Foi desbaratada uma rede de aliciadores, de tráfico humano para fins de exploração sexual de mulheres e adolescentes, dentro do complexo de Belo Monte, algo inadmissível, já que se trata de um projeto que está recebendo financiamento público, do BNDES ”, disse Jordy, após reunião em que membros da CPI pediram ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o reforço do efetivo da Polícia Federal na região sob influência do empreendimento.

“ tivemos que passar por duas guaritas da empresa para chegar a uma das boates. É muito difícil, eu diria impossível, que eles não tivessem conhecimento do funcionamento desta boate, que fica dentro do canteiro , em área desapropriada para fins de utilidade pública”, relatou o deputado.

Também ontem, a CPI do Tráfico de Pessoas aprovou a convocação do presidente do consórcio responsável pela construção da usina, José Ailton Lima, para dar explicações sobre o funcionamento da boate no interior do canteiro de obras e sobre a existência de mulheres jovens, incluindo uma menor, no local. O requerimento para que Lima fosse convocado era de autoria de Jordy, que não descarta a hipótese de, descumpridas as condicionantes, pedir o embargo da obra.

“Dependendo das justificativas apresentadas pelo consórcio, vamos avaliar quais procedimentos adotar. Um deles é pedir a suspensão da obra até que as condicionantes sejam cumpridas, o que, aliás, já deveria ter acontecido”, concluiu Jordy.

Segundo o CCBM, a boate citada pelo deputado está em terreno de propriedade particular que nunca pertenceu ao consórcio, localizado a cerca de 15 quilômetros do canteiro. As guaritas a que ele se referiu estão instaladas para controle de equipamento pesado e de ônibus, e qualquer pessoa pode passar por elas. A presença do CCBM na estrada (Travessão 27) deve-se de estarem sendo executadas obras de pavimentação e sinalização no local.