Ruilong confessou a investigadores da 38ª Delegacia de Polícia (Irajá) ter agredido Quan com socos no rosto. Numa das agressões, a vítima teve a cabeça arremessada contra uma máquina de fazer massa, causando-lhe grave lesão na orelha esquerda, que ficou desfigurada. A pastelaria foi interditada devido às más condições de higiene.
Em depoimento segunda-feira, 15, no hospital, Quan contou que chegou ao Brasil em maio do ano passado, junto com outros cinco chineses. Todos foram recebidos no Rio por um brasileiro, que os encaminhou aos seus "empregos". Quan e outro chinês permaneceram no Rio, e os outros quatro teriam ido para São Paulo. Um missionário norte-americano, fluente em mandarim, ficou de tradutor durante o interrogatório de Quan, que não fala português.
"A vítima explicou que sua família e a do agressor são vizinhas na China. A promessa é que ele receberia R$ 1.500 por mês para trabalhar na pastelaria, mas na verdade o salário sequer chegava a R$ 200. Segundo Quan, as torturas teriam começado em janeiro deste ano, quando ele manifestou pela primeira vez o desejo de voltar para a China. Ruilong alegava que havia pago a viagem dele para o Brasil, e começou a proibi-lo a sair da pastelaria. Dizia que o estabelecimento tinha câmeras e que se ele tentasse fugir, apanharia ainda mais. Amedrontado e sem saber falar português, Quan permanecia naquela situação", afirmou a delegada Maria Madalena Carnevale, da 38ª DP.
Passaporte
A polícia já sabe que não há registro da entrada de Quan no Brasil. A suspeita é que ele chegou ao país com passaporte em nome de outra pessoa. Os agentes vasculharam a pastelaria, mas não acharam nada em nome do chinês. "Quan disse que Ruilong reteve seus documentos. Vamos tentar incluir a vítima no Programa de Proteção à Testemunha, já que ele está com muito medo. Além disso, soubemos que vários chineses que ele desconhece tentaram visitá-lo no hospital, mas foram impedidos pela direção", disse a delegada.
Cópias do procedimento serão encaminhadas à Polícia Federal, que é a responsável por investigações de tráfico de pessoas. Como está ilegal no Brasil, normalmente Quan seria extraditado. Porém, como foi vítima de tortura e trabalho escravo, pode conseguir o direito de permanecer no país por questões humanitárias, explicou Carnevale. O caso também está sendo acompanhado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).