A meta de erradicação do trabalho infantil em 2020 pode não ser cumprida por falta de investimentos e de políticas públicas unificadas, no entender de Isa Oliveira, secretária-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI). Ela contou que, de 2000 a 2011, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Brasil tirou apenas 502 mil crianças, do total de 3,4 milhões, da situação de risco. "E 20% delas ainda estão em locais onde não deveriam estar", denuncia. O problema maior é que apesar de vários órgãos do governo dedicarem recursos com esse fim, não existe uma liderança para consolidar os dados e cada um trabalha em separado.
O resultado é um quadro alarmante quando se trata de cuidados com a infância. Isa aponta que 9,6% das famílias têm crianças que não estudam; 10% tem menores de idade que estudam e trabalham; e 4,3 % só trabalham. "Se somarmos tudo, boa parcela vive sem proteção. Falta liderança política que ponha o assunto em pauta", reforça, aos explicar que a meta divulgada por governos e entidades de defesa desse público era de, até 2016, acabar com o trabalho degradante e, até 2020, com qualquer tipo de trabalho a que crianças e jovens estejam submetidos.
Isa Oliveira entende que a melhor saída é transferir renda pela as famílias para incentivar os estudos dos filhos e mudar a realidade daquele núcleo. A opção disponível até agora é o Programa Bolsa Família, do governo federal, que ficou, diz, abaixo das expectativas. "Outro dado importante que se pode tirar do Censo do IBGE é a triste estatística de que 2,9 milhões de adolescentes, de 14 a 17 anos, trabalham e desses 1,6 milhão estão fora da escola, sob o pretexto de que têm de assegurar o sustento da família", conta.
A secretária-executiva da 3ª Conferência Global do Trabalho Infantil, que acontecerá em outubro, em Brasília, Paulo Montagner – que representou o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), no evento de ontem - , admitiu que não conhece os números globais do governo. Contou que, só o MDS investe cerca de1% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas produzidas no pais), que equivale a cerca de R$ 1 bilhão, por ano, em programas de erradicação do trabalho infantil. "O Bolsa Família dedica mais 0,5% do PIB. Mas não sei precisar agora os aportes dos ministérios da Educação e do Trabalho", admitiu
Pesquisa
Até mesmo os pesquisadores da Consultoria Tendências, que apresentaram um estudo, em pareceria com a Fundação Telefônica Vivo, sobre os resultados dos trabalhos até agora levados a cabo, acham difícil mudar o quadro da educação no país em tão curto prazo. "É um grande desafio. Em parte, o jovem não vai à escola porque ela não faz muito sentido para ele", admitiu Fernando Botellho. Ele disse, também, que, daqui para frente, as dificuldades serão ainda maiores, tendo em vista que o tratamento de casos menos graves foram tratados, embora timidamente, e agora serão feitos estudos e ações focados nos mais vulneráveis.
"Situações em que os pais não têm interesse em estudar e consideram melhor o filho trabalhar que estar na rua. Eles não têm consciência de que, se o filho for cedo para o mercado, ele pode nunca mais sair daquele mesmo rudimentar emprego. Os avanços profissionais ficam comprometidos. É importante entender que esse pensamento leva a criança a uma armadilha", reforça. O também consultor da Tendência Ernesto Moreira Guedes explicou que, dos US$ 77,1 bilhões previstos como retorno futuro para crianças e adolescentes que passarão a frequentar a escola, de 2006 a 2016, no Cone Sul, US$ 35,5 bilhões devem ser investidos no Brasil.
"Dinheiro a ser aplicado em ensino, programas de transferência de renda para as famílias e intervenções diretas, contando, inclusive com o custo que pode acarretar a retirada das crianças do trabalho", assinala Guedes. O futuro da educação muitas vezes fica comprometido, na análise do consultor, porque os resultados são de longo prazo e não aparecem com facilidade.