Nos últimos 13 dias, casos de racismo, homofobia e espancamentos marcaram o Distrito Federal. Na madrugada de ontem, quatro mulheres se tornaram vítimas dos três crimes no mesmo episódio. Elas receberam socos e chutes de pelo menos três homens. O rosto de uma das jovens, com vários hematomas, demonstra a violência empregada pelos agressores. A confusão aconteceu no Bar Balaio Café, na 201 Norte. Embora identificados, nenhum dos suspeitos ficou preso. Foram indiciados por lesão corporal, ameaça e injúria.
Na hora em que a discussão começou, por volta da 1h, poucas pessoas estavam no estabelecimento, que tem sete anos e é bastante frequentado pelo público GLS. Dois casais de lésbicas sentavam próximo à porta. A poucos metros, havia uma mesa com seis pessoas, sendo três homens e três mulheres. Não se sabe ao certo por que a confusão entre os grupos começou, mas, durante a briga, uma das meninas foi xingada de “lepra da sociedade, puta, neguinha e sapatona”.
Depoimentos
“Em luto pela impunidade”
“Sinto-me violentada no meu espaço de trabalho. Não tinha nem vontade de abrir a loja depois de tudo o que aconteceu. O meu desejo era de manter o estabelecimento fechado em luto pela impunidade. Não é possível que essa violência seja considerada algo normal, que essas pessoas saiam impunes e que os agressores responsáveis por espancarem a jovem, detidos e encaminhados pelas mãos do poder público sintam-se confortáveis para rir na nossa cara. Porque foi isso o que aconteceu. Mesmo com a polícia presente, continuavam a proferir termos agressivos com relação à sexualidade e à raça das vítimas. Mesmo após entrar na viatura, continuaram a proferir que elas eram uma doença e que eles tinham de matar todo mundo. Fomos à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) e continuaram provocando as vítimas, falando que bateria na cara da ‘neguinha’. A pessoa não pode ser violentada por ser mulher, homossexual e negra. Gostaria de lembrar que o Balaio Café é um território de liberdade de expressão e diversidade sexual. E, pelo resultado que vi na delegacia, sei que não vai dar em nada. Vão registrar apenas como uma lesão corporal. Enquanto não tivermos uma legislação ou um decreto que combata a homofobia, a impunidade, infelizmente, persistirá.”
Juliana Andrade Lima,
33 anos, dona do Balaio Café
“Até agora fragilizada”
“Estava com a minha namorada e um casal de amigas lésbicas nas proximidades do Balaio. Ao fim da confraternização, a minha namorada, por ter um estilo mais ‘homenzinho’, passou perto de uma das pessoas do grupo (de agressores). Ao fazer isso, imagino que um deles achou que ela tenha paquerado a mulher. Foi tudo muito rápido, eu só realmente notei o que estava acontecendo quando eu vi que ele avançou em direção a ela dando um murro e depois outro. O que mais me impressionou foi ver ele dando outro soco nela, o que a fez desmaiar. Tentei tirá-lo de perto dela, mas ele me empurrou, e eu caí para trás. Acho qualquer tipo de agressão algo totalmente errado, quanto mais um homem bater em uma mulher. Os amigos dele começaram a falar um monte de coisa. Estou até agora fragilizada com a situação, porque namoro há um ano e nunca passei por situação semelhante. Sempre andamos de mãos dadas e nunca aconteceu nada, exceto um episódio de agressão verbal em outro bar. Mas nunca pensei que fosse chegar ao ponto de agressão física.”
Maria*,
21 anos, vítima
“Caí no chão desacordada”
“Eu estava com as minhas amigas, numa boa, quando um cara começou a nos xingar. Foi uma violência gratuita, sem explicação. Levei vários socos no rosto, até que caí no chão desacordada. Mesmo caída, ele continuou a me chutar. Enquanto ele me batia, outros dois seguravam as pessoas que se aproximavam para tentar apartar a briga e me tirar dali. Nunca os vi na minha vida, também nunca os vi lá no Balaio. Fui levada para uma parte reservada do café para ser socorrida e acordei um tempo depois. Quando fomos para a delegacia, os rapazes continuavam a nos provocar, debochando da gente, soltando provocações. Eles falavam que não seriam presos porque são ricos. Eles repetiam que os advogados livrariam a cara deles. Fiquei muito revoltada, foi tudo muito desproporcional. Fui para o hospital, passei por exames e fui medicada. Estou esperando resultado da tomografia para saber se tenho algo grave na cabeça.”
Daniela*,
18 anos, vítima