Rio, 26 - A Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro estuda medida jurídica para obrigar o Exército a colaborar com as investigações sobre o paradeiro de desaparecidos políticos.
O presidente da comissão, Wadih Damous, informou que está discutindo o assunto com juristas. "Tenho discutido a hipótese de medida jurídica. Não sei se seria ação ou se uma interpelação judicial. Mas um mecanismo para obrigar o Estado brasileiro a se pronunciar oficialmente sobre o que aconteceu", afirmou Damous. A declaração foi feita no dia seguinte ao depoimento do coronel reformado Paulo Malhães à Comissão Nacional da Verdade, em que ele confirmou ter torturado e assassinado presos políticos, mas se recusou a fornecer nomes de vítimas e torturadores. Ele também negou ter sido o oficial que desapareceu com o corpo do deputado Rubens Paiva - embora tivesse assumido a autoria deste crime à Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro.
"Tenho reiterado que não há mais nada a se fazer a respeito dessas declarações. Nunca vamos ter certeza se é verdade ou mentira.
O Exército tem que vir a público e esclarecer o que aconteceu. Não é pedir documento A, B, C ou D. É de se presumir que não haja mais documento. Agora é fazer pergunta direta: o corpo de Rubens Paiva foi jogado no rio?", afirmou Damous. Ele comentou ainda as informações contraditórias nos depoimentos e entrevistas de Malhães. "Para nós, ele disse que pessoalmente se livrou do corpo. Pegou o saco e levou a um rio. Ao Globo, disse que jogou no mar. À Comissão Nacional, que não foi ele. Para quem mentiu? Não dá para assinar embaixo do que ele fala. Tem que ter a palavra oficial", defendeu, alegando questão humanitária.
O Ministério Público Federal também tem cobrado maior transparência do Exército. Em fevereiro, quando foram denunciadas seis pessoas pelo envolvimento no atentado do Riocentro, os promotores entraram com pedido de busca e apreensão de documentos em posse do Exército. A Justiça ainda não se pronunciou.
"O Exército demora, não fornece informações completas ou dá informações contraditórias ao que havia informado. Das três forças é a que mais dificulta o acesso", afirmou o procurador Sergio Suiama, que integra o Grupo de Trabalho Justiça de Transição. "A gente nem espera mais ter o paradeiro. O que a gente gostaria é que o Exército cumprisse a lei e fornecesse as informações requeridas".
A recusa de Malhães em fornecer nomes de presos políticos que passaram pela Casa da Morte ou informar os destinos que tiveram frustrou as expectativas das famílias de desaparecidos durante a ditadura que, na manhã de terça-feira, assistiram à audiência pública sobre o centro de tortura que funcionou numa casa em Petrópolis, na Região Serrana do Rio.
"O governo jamais reconheceu a morte do meu irmão, nunca soubemos as reais circunstâncias. Tudo o que sabemos é o que foi levantado pelo Tortura Nunca Mais: ele foi preso em 27 de outubro de 1973 e enterrado como indigente no Cemitério de Ricardo de Albuquerque. O corpo nunca foi achado. Nesse período a Casa da Morte estava em funcionamento. As investigações avançam em dose homeopática. Meu pai tem 95 anos, está lúcido e quer saber o que foi feito do filho", afirmou o engenheiro Romildo Maranhão do Valle, irmão de Ramires, militante do PCBR.
No depoimento à Comissão Estadual da Verdade, Malhães disse que os corpos jamais serão encontrados. "Podem esburacar o Brasil todo.
Não vão achar ninguém", afirmou. O Serviço de Comunicação Social do Exército foi procurado ontem pelo Estado, mas informou que precisaria de tempo para elaborar a resposta..