Com o adiamento da retirada do avião da Vasp no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, o seu comprador decidiu também suspender investimento com a carcaça do Boeing 737-200, comprada em um leilão judicial. Dono da aeronave, para no pátio do terminal aéreo há oito anos, o empresário e farmacêutico Rogério Tokarski, 65 anos, ainda estuda um endereço para instalação dela. A princípio, ela seria levada para uma chácara da Quadra 16 do Park Way, na madrugada desta quinta-feira (10/4).
A operação para levar o avião até a chácara do comprador ocorreria na madrugada nas primeiras horas desta quinta-feira. O Boeing seria puxado por um trator em um trajeto de 12 quilômetros pelas vias do Park Way. Mas, uma decisão tomada pela Agência de Fiscalização (Agefis), a pedido da Administração Regional do bairro, suspendeu o transporte. De acordo com técnicos da Agefis, o local onde a aeronave seria estacionada não está regularizado e, por isso, não pode ser usado para esse fim.
Na tarde de quarta-feira (9/4), antes de receber a notícia do cancelamento da operação, o novo dono do antigo avião disse, em entrevista ao Correio, que pretendia fazer da aeronave um estabelecimento comercial voltado ao entretenimento. “Tenho ‘n’ projetos na cabeça, baseados em experiências que vi mundo afora. Pode ser um bar ou um restaurante, por exemplo”, conta.
Já na tarde desta quinta-feira, Tokarski, fundador e dono da rede de farmácias de manipulação Farmacotécnica, afirmou que vai esperar “florescer” uma ideia para o uso do Boeing. “Mas, de qualquer forma, o comprei para preservar a memória da aviação brasileira”, ressaltou. Ele disse ainda que vai procurar a Administração Regional e a Agefis para mostrar a real intenção da destinação da aeronave, que pretende ainda manter na chácara, onde já estão as asas e outros componentes do Boeing.
Massa falida
O 737-200 integrava a massa falida da companhia. Ele e outros 17 antigos aviões da Vasp, sem as turbinas, foram levados a leilão em setembro de 2013. O dinheiro da venda será usado em quitação de dívidas da empresa.
Tokarski disse ao Correio ter decidido participar do leilão por curiosidade. “Vi que poderia preservar a memória da aviação e gerar renda de uma coisa considerada sucata, que poderia acabar em um ferro-velho”, explicou. “O avião não voa, não tem motor, mas o interior está impecável, com as poltronas originais da fábrica da Boeing”, destacou Tokarski.
O farmacêutico e empresário faz questão de ressaltar que não coleciona aviões. Nem sequer é um apaixonado pela aviação. “Me preocupo com a preservação da história do país. E só coleciono peças antigas de farmácias”, comentou.
Museu no Paraná
O Boeing fazia parte do cemitério de aviões no aeroporto de Brasília. Por mais de seis anos, três Boeings 767-200 da Transbrasil e outros três aeronaves do mesmo modelo pertencentes à Vasp ocupavam uma área de terra no pátio do terminal. Há dois anos, por ordem do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dentro do programa Espaço Livre, os seis aviões sucateados começaram a ser desmontados para depois irem à leilão. O dinheiro arrecadado com os lances está sendo destinado ao pagamento dos credores das empresas falidas.
O avião destinado ao Park Way não é o primeiro da Vasp comprado em leilão a deixar o aeroporto de Brasília. Em 9 de janeiro, outra sucata da companhia terminou uma viagem de 17 dias após percorrer 1,7 mil km, entre a capital e Itapejara d’Oeste, no sudoeste do Paraná. O Boeing 737-200 foi desmontado e deixou o terminal candango em 23 de dezembro sob dois caminhões — um levou as asas, e o outro, o corpo. Ela ficará exposta em uma fazenda do comprador, após passar por uma reforma de R$ 200 mil.
Sócio da Táxi Aéreo Helisul, com sede no Paraná, Eloy Biezus comprou o avião por R$ 175 mil, também por meio do leilão judicial em setembro, em que adquiriu ainda outros dois Boeings que estavam parados no aeroporto de Guarulhos (SP). Para retirara a aeronave de Brasília, o empresário teve de pagar R$ 100 mil pelo transporte. Com capacidade para 107 passageiros, o 737-200 voou pela última vez em 2006.
Na viagem, o Boeing chegou a ficar retido por uma semana, em um posto de combustível na BR-376, em Tibagi, região dos Campos Gerais (PR), após a Polícia Rodoviária Federal constatar irregularidades na documentação para o transporte. Para transitar naquele trecho, era necessária uma autorização especial do Departamento de Estradas de Rodagem (DER), já que a rodovia, apesar de ser federal, está sob domínio do Paraná. Só após o dono conseguir tal documento, ele seguiu viagem.
Os últimos 18km do avião entre Brasília e o interior paranaense foram percorridos ao longo de um dia. Desses, 6km foram feitos por rodovias estaduais. Já os outros 12km foram percorridos em uma estrada de chão da área rural de Itapejara d’Oeste, que precisou receber um reforço de cascalho, por causa do peso da carga. A estrada mais curta de acesso à fazenda foi descartada por ficar ao lado de um rio e ser margeada por várias árvores nativas que teriam de ser podada ou até derrubadas.
Sucatas espalhadas pelo país
As 448 toneladas de peças do desmonte de 17 aviões da Vasp, que estavam espalhados em oito aeroportos do Brasil, foram leiloadas pela internet entre 20 e 30 de setembro de 2013. Os lances somaram R$ 1,9 milhões para o Conselho Nacional Justiça destinar à quitação de dívidas da companhia.
Quinze das 17 aeronaves da Vasp — 16 Boeing 737-200 e um Airbus A300 — foram compradas com o intuito de serem preservadas por inteiro. O lote mais disputado e mais caro, o Airbus 300, fechado em R$ 556 mil, deixou o Aeroporto de Guarulhos, sua casa desde 2005, enquanto o Boeing prefixo PP-SPG, que teve o menor valor de venda (R$ 20,7 mil), se despediu do aeroporto de Manaus.
Apenas dois aviões vendidos a empresas envolvidas na comercialização e reciclagem de metais. Um empresário de Curitiba, assim como outros dois compradores, acabaram arrematando, sozinhos, três aeronaves inteiras.
O leilão é parte do programa Espaço Livre, do CNJ, lançado em fevereiro de 2011 a fim de remover dos aeroportos as sucatas pertencentes à Varig, Varig Log, TransBrasil e Vasp, falidas nos últimos anos. Até o leilão da Vasp, havia 43 aviões de grande porte nos terminais.