A prática teria começado em setembro do ano passado. Guardas municipais chegam em veículos descaracterizados, tiram os pertences dos moradores e os conduzem a albergues ou abrigos pernoite. Aqueles que resistem levam jato d’água e perdem o pouco que têm. Para a prefeitura de Salvador, trata-se de atendimento. “Eu chamo de pilantragem”, diz Jone, que saiu da casa da mãe “para não dar trabalho” há 19 anos.
É difícil encontrar um morador de rua sóbrio que saiba explicar, em detalhes, o que vem acontecendo entre as 2h e as 4h nas avenidas de Salvador. Muitas vezes, eles acordam com marcas de uma possível surra, mas não conseguem dizer ao certo o que aconteceu. O fato, no entanto, é que a população embaixo de viadutos diminuiu consideravelmente. Eles se escondem, com medo de serem levados. “A gente não pode sair nos fins de semana porque têm muito turista na cidade”, relata um homem. Segundo ele, o mais complicado é a convivência nos abrigos. “Um quer fumar, o outro quer beber e, na abstinência, ninguém é confiável.”
Luiz Gonzaga, um dos líderes do Movimento da População de Rua de Salvador, levou a reportagem do Correio a uma das “malocas” resistentes. O lugar tem cheiro de peixe e de urina, “mas não tenha medo, não”, fala Jone. A conversa acontece em uma espécie de sala de visitas, onde antes era o banheiro e hoje é a casa de mais um homem. Eles têm eletricidade e água potável, fruto de “amigos engenheiros”. A comida, geralmente sobras do mercadão, é feita em um fogão improvisado. Os cachorros cuidam da segurança, mas até eles deixaram o local. “Eram 28, agora são seis”, mostra Jone..