A realeza britânica esteve na Cracolândia, na região central, chegou atrasada e não conseguiu terminar a visita, mesmo com todo o rigor da programação do Consulado Britânico. Na manhã desta quinta-feira, 26, o príncipe Harry visitou a região, interagiu com dependentes químicos e conheceu as instalações do Programa Braços Abertos da Prefeitura de São Paulo. Antes da chegada, equipes de limpeza varreram e lavaram as ruas da região. O príncipe atrasou em pelo menos 45 minutos sua chegada e deixou o prefeito Fernando Haddad (PT) esperando em frente à Estação Júlio Prestes.
Por volta das 8h45, acompanhado por uma escolta de dez carros (entre seguranças e policiais federais), Harry chegou no local. Enquanto o prefeito aguardava a realeza, um manifestante com um cartaz criticava o programa. "Não tem que investir em assistência social, não. Os viciados não tem jeito e você fica gastando dinheiro com eles. Tem que construir hospital", gritava o vigilante Célio de Souza, 38 anos, para o prefeito.
Harry foi recepcionado por Haddad e a primeira-dama Ana Estela Haddad. O casal o levou para conhecer um ônibus de monitoramento da Guarda Civil Metropolitana (GCM). Ao sair do veículo, ele passou ao lado de grupo de usuários de droga e entrou na tenda da Prefeitura na Rua Helvétia. O secretário municipal de Segurança Urbana, Roberto Porto, e a secretária municipal de Assistência Social e Cidadania, Luciana Temer, também acompanharam a visita do príncipe.
"Pelo contato que tive, que foi limitado, ele gostou do que viu. Ele quis saber a lógica de se ter um local monitorado com as pessoas continuando a venda de crack", afirmou Porto. Um dos princípios do programa é o de oferecer dignidade aos dependentes químicos com trabalho e hospedagem em hotéis da região sem obrigá-los a deixar de usar a droga. Ainda de acordo com o secretário, Harry fez "diversas" perguntas para o prefeito e Haddad explicou os detalhes do programa.
Após passar pela tenda, onde interagiu e tirou fotos com dependentes químicos, Harry seguiu para o galpão dos garis contratados pela Prefeitura, na Alameda Barão de Piracicaba. Do lado de fora, houve um princípio de tumulto devido ao acúmulo de dependentes químicos, moradores da região, curiosos e jornalistas. Com um cachimbo em cada mão, uma viciada começou a gritar para o príncipe e depois agrediu um fotógrafo e um cinegrafista. Um jornalista que subiu sobre uma Kombi para tentar fotografar Harry quase foi agredido pelo proprietário do veículo. "Você amassou o teto, cara. Não estou nem aí se você queria fotografar o príncipe, esse carro eu uso para trabalhar", gritou o dono da Kombi que depois trocou telefones com o fotógrafo.
Enquanto isso, dentro do galpão, Harry tirava fotos com alguns dos 394 inscritos no programa que recebem R$ 15 por dia para fazer serviços de zeladoria urbana na região. Sem usar drogas há três meses, a gari Ieda Santos da Silva, de 56 anos, foi uma das que conseguiu uma foto com o príncipe.
Já a assistente social Michelle Borges, de 26 anos, que há seis meses trabalha no programa, afirmou que a visita pode ser benéfica para outros dependentes químicos. "Vai incentivar outras pessoas em participarem. Tudo que se faz aqui e quebra a rotina da região contribui." Ela também tirou uma foto com o príncipe. "Com certeza vou postar no Facebook."
Outros moradores da região não estavam muito empolgados com a visita. "Não adianta nada a realeza vir aqui e deixar a miséria para trás. Para mim não muda nada, vamos continuar esquecidos no canto mais feio da cidade", disse a comerciante Ednalva Borges Furtado, de 37 anos. "Eu não quero saber de príncipe.
Mas os cabelos ruivos de Harry encantaram um grupo de travestis. "Ele é lindo. O cabelo dele é coisa mais incrível que eu já vi. Fiquei apaixonada por ele", afirmou a travesti que se identificou como Natasha, de 23 anos, e é usuária de crack. Após a visita ao galpão, o príncipe encerrou a visita sem conhecer a quadra do Largo Sagrado Coração de Jesus. No local havia três crianças que fazem parte de um grupo de ciganos que mora na Cracolândia.
Após a saída da família real, das autoridades paulistanas e do efetivo maior de policiais e guardas civis, a rotina do bairro voltou ao normal. Cerca de 30 minutos após o encerramento do evento, os dependentes químicos retomaram as ruas para consumir a droga nas esquinas da Cracolândia. "Venha quem vier, mas a Cracolândia sempre vai ser nossa", disse um viciado que não quis se identificar e ameaçou atirar uma pedra na reportagem.