Brasília – O acesso dos brasileiros a alimentos sem venenos ainda está longe de ser realidade, pelas dificuldades enfrentadas pelos produtores de orgânicos – sem o uso de agrotóxicos ou insumos químicos. Em 20 de março, a presidente Dilma Rousseff participou da abertura da colheita de arroz orgânico no Rio Grande do Sul. No início deste mês, o Instituto Nacional do Câncer (Inca) recomendou o consumo de alimentos livres de agrotóxicos como maneira de diminuir o número de casos da doença.
A presença desses produtos nas gôndolas, porém, ainda é escassa e cara, embora o mercado de orgânicos no Brasil cresça entre 20% e 40% a cada ano, em média, de acordo com números de diferentes organizações. Frutas e hortaliças são mais facilmente encontradas em feiras orgânicas, ainda que o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) tenha identificado apenas 290 feiras orgânicas nos mais de 5 mil municípios do país. Nas grandes lavouras de arroz, feijão, milho e soja, a presença de cultivos orgânicos é quase inexistente. No caso da soja, o mercado é amplamente dominado pelas variedades transgênicas, que se tornaram o padrão do mercado – elas responderam por 91% da produção brasileira da oleaginosa na última safra.
De acordo com o Inca, os produtos obtidos da maneira convencional, com uso intensivo de venenos, são causadores de uma série de graves problemas de saúde. Entre eles, infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.
Especialistas em agroecologia asseguram que é possível substituir progressivamente lavouras convencionais por orgânicas, como sugere o Inca.
Produtores de soja reclamam de muita insegurança para a produção de orgânicos. Segundo eles, são grandes os problemas de contaminação dos produtos pelos similares convencionais e transgênicos. “Muitos agricultores orgânicos deixaram de produzir pela dificuldade de evitar a contaminação com a soja transgênica”, constata a pesquisadora da Embrapa Soja (Londrina) Claudine Seixas, que há 10 anos auxilia agricultores na região.
“Desde que o transgênico emplacou no Brasil, tivemos muitas dificuldades”, diz Marcio Challiol, gerente agrícola da empresa Gebana, de Capanema (PR), dedicada ao mercado de orgânicos. “Não há oferta de sementes para cultivo e são necessários enormes cuidados, desde a colheita até a entrega do produto. Muita gente saiu do mercado por contaminação com transgênico e por agroquímico”, completa.
Contaminação
Segundo a pesquisadora Claudine Seixas, agricultores que precisam alugar máquinas colheitadeiras ou caminhões estão mais expostos à contaminação. “Esses equipamentos são também contratados por agricultores convencionais. Às vezes, a limpeza não é completa e ficam grãos de outra lavoura, o que acaba contaminando a produção orgânica e representando prejuízos para o agricultor.” O prejuízo vem em dose dupla: o produtor fica obrigado a vender a mercadoria como transgênico, que tem preço menor, e a empresa que detém a propriedade sobre a semente geneticamente modificada ainda cobra royalties sobre o lote contaminado.
Os produtores orgânicos, segundo Claudine, ainda encontram dificuldades para fazer o controle de plantas indesejadas e de insetos. “Ainda não temos um produto alternativo que substitua o herbicida”, diz. Na lavoura transgênica, para eliminar ervas daninhas, os agricultores fazem várias aplicações de venenos classificados como provavelmente cancerígenos.
Apesar dos problemas, de acordo com a pesquisadora, a produtividade das lavouras orgânicas tende a se aproximar da média obtida na agricultura convencional. Em relação aos custos, pode haver uma elevação no início, diz, mas, depois, eles podem se igualar ou ficar abaixo da lavoura convencional, pela menor dependência de insumos.