Jornal Estado de Minas

''Não foram só essas''

Famosa pelos ''bons drinks'', Luisa Marilac desabafa sobre transfobia e conta histórias de amigas assassinadas

Famosa pelo vídeo dos "bons drinks" que viralizou na internet há cinco anos, Luisa Marilac usou o Youtube para um desabafo que, desta vez, nada tem de engraçado. Em gravação publicada nesta segunda-feira, 11, a travesti nascida em Minas Gerais denuncia casos de transfobia — ódio contra pessoas transexuais — e narra a trajetória de amigas assassinadas no que ela aponta como crimes de ódio. "É muito triste pegar um álbum de fotos e ver que eu perdi tantas amigas. E não foram só essas."





Luisa já não trabalha como prostituta há alguns anos. As histórias violentas que ela revela, contudo, estão ligadas à profissão e ao mundo de riscos que cercam quem vive da noite. "Nunca gostei de me prostituir e nunca gostei de trabalhar à noite mas, infelizmente, a gente tem que 'se virar nos trinta' para sobreviver", diz ela, que atualmente se apresenta em boates e festas com um espetáculo de comédia stand-up.

Confira em vídeo o desabafo de Luisa Marilac (contém palavras de baixo calão):

O vídeo do bordão "se isso é estar na pior...", de 2010, já ultrapassou a marca de 3,5 milhões de visualizações. Desde então, Marilac parou de fazer programas e trabalhou como coordenadora de limpeza em um hotel de São Paulo. Mas foi antes de tornar-se uma das celebridades de internet no Brasil que a travesti enfrentou as perdas que conta no vídeo.

Em Guarulhos, interior paulista, viu a colega de apartamento morta a tiros em uma estrada vicinal. Micaela tinha "no máximo 16 anos", ela recorda. "Era uma criança. Uma menina gentil, doce."





Desaparecida após ser vista embarcando no carro de um homem em ponto de prostituição, a jovem transexual foi executada, segundo Luisa, depois de uma relação sexual. "É tão difícil enterrar pessoas de quem a gente gosta, principalmente com a violência e brutalidade com que são feitas essas coisas", reflete a comediante.

Ela mostra, em uma foto, Micaela fazendo pose ao lado de outra vítima da violência. "Essa loira, nós começamos juntas no Brasil. Fomos juntas para a Europa. E eu tive que reconhecer o corpo dela" diz Luisa, segurando a imagem em que as amigas aparecem juntas. Sem mencionar nome, a mineira diz que a outra transexual na fotografia foi morta por um ladrão que se passava por cliente.

Em meio a outros relatos, Luisa Marilac aproveita o alcance de suas palavras — conquistado graças à repercussão do viral — para espalhar um grito contra a violência. "Vivemos em um país onde as pessoas maltratam, humilham, matam pelo simples prazer. Pelo simples fato de que nada vai acontecer", ela observa. Aponta ainda que a discriminação contra uma pessoa trans pode chegar a níveis intoleráveis: "Tem muita travesti que se mata porque não aguenta. A pressão em relação ao homossexual é grande em relação ao travesti nem se compara", afirma.

Luisa ainda ressalta a necessidade de levantar a voz contra agressões que fazem parte da rotina de pessoas transexuais. "A gente tem que aprender a gritar e reivindicar nossos direitos hoje e sempre, não importa onde", declara. Ela detalha humilhações a que travestis são sujeitas em público e explica que, para muitas, a violência se torna reação natural à discriminação. "Quando você vê um travesti gritar, fazer escândalo, tente entender. Não bata martelo culpando."