Brasília, 10 - A Justiça Federal determinou, no fim da tarde desta quinta-feira, 10, que os cinco suspeitos de fraudar o sistema de cotas do concurso para a carreira diplomática, do Itamaraty, estão liminarmente impedidos de ser nomeados, convocados ou tomar posse. Os candidatos ainda podem recorrer.
Assinada pelo juiz Renato Coelho Borelli, da 20ª Vara Federal (Distrito Federal), como resposta a uma ação civil pública ajuizada segunda-feira pelo Ministério Público Federal (MPF), a decisão só não contempla aqueles que alcançaram, desde a primeira etapa do concurso, notas suficientes para a ampla concorrência - o que não seria o caso de nenhum dos réus. Três estão na lista de aprovados pelas cotas; os outros dois teriam se beneficiado da política para avançar nas primeiras etapas, mas, na última, acabaram na lista geral.
Um deles já havia sido denunciado em um ofício enviado ao Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, assinado por dois advogados do DF. "Caso não constasse como negro, sequer estaria na segunda fase do concurso", diz o texto, indicando que o candidato "buscou burlar a política de cotas, tomando para si uma justiça compensatória a que, na prática, não era sujeito", pois seria branco.
O juiz destaca que o Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores (MRE), ao iniciar o concurso, "foi omisso em não criar, previamente em edital, mecanismo de verificação da autodeclaração de candidatos que se intitularem negros ou pardos". O Itamaraty abriu a seleção em 24 de junho, mas só instituiu a ação do Comitê Gestor de Gênero e Raça (CGGR) na segunda-feira, horas depois de ajuizada a ação pelo MPF.
"Tenho que os critérios de avaliação e o momento de sua aplicação devam constar no edital, sob pena de serem impugnados por falta de previsão", afirma o juiz na decisão. Ele salienta, ainda, que a ausência, no edital, de critérios objetivos para a avaliação da banca examinadora é um "vício grave", que possui "condão de anular a fase em que se encontra o certame".
A decisão da Justiça também considerou uma petição apresentada na quarta-feira, em que o MPF avalia que a instituição do comitê não necessariamente evitaria a posse dos suspeitos. "A possibilidade de eliminação dos candidatos só é expressamente prevista para os casos de `não comparecimento ou não assinatura da declaração', mas não é prevista para o caso de fraude".
Os candidatos beneficiados pela política de cotas compareceram ao Palácio na manhã de quinta (antes de publicada a decisão da Justiça), onde tiveram de assinar uma autodeclaração presencial e passar por uma entrevista, a cargo do comitê, formado por sete diplomatas. O MPF recomendou que os pareceres sobre cada um dos concorrentes sejam divulgados publicamente, mas o Itamaraty não confirmou se seguirá a sugestão.
De 12 candidatos convocados para as entrevistas (o dobro do número de vagas disponíveis), 11 compareceram. Depois de avaliar os traços físicos dos concorrentes, a banca deveria enviar os pareceres à organização do certame. Com base neles, seria detectado se houve ou não fraude e, finalmente, seriam divulgados os seis nomes que preencheriam as vagas reservadas para negros ou pardos. O Itamaraty preferiu não se pronunciar sobre a decisão da Justiça nem sobre os efeitos dela nas próximas etapas da seleção.
Outra recomendação do MPF foi para que os demais concorrentes - fossem da lista geral ou da de cotas - pudessem acompanhar as avaliações. Candidatos ouvidos pelo Estado relataram, porém, que as entrevistas se deram em uma sala de vidro, sendo possível ver, mas nada ouvir.
"Me sinto prejudicado, pois minha vaga depende da saída dos fraudadores", diz um candidato suplente, que preferiu não ser identificado.
Esta é a primeira vez em que a política de cotas é adotada em todas as fases do concurso, devido à lei - sancionada ano passado - que prevê 20% das vagas federais a candidatos autodeclarados negros ou pardos.