Enviada especial
Recife – Mães ansiosas, com seus bebês quase sempre envoltos em mantas, com enormes laços de fita e gorros no tórrido calor, enchem os hospitais pernambucanos envolvidos no diagnóstico de microcefalia. Os olhares desconfiados surgem de todos os lados. Quem está ali por outro motivo quer matar a curiosidade e confirmar se está diante de um dos 1.236 casos que transformaram Pernambuco nos quatro últimos meses. Quem carrega um desses bebês no colo também “corre o olho” no do lado. Perceber que não estão sozinhas traz um certo conforto para essas mães. Nada de pais. Quase sempre elas estão acompanhadas das próprias mães, avós, tias e irmãs.
Na manhã da última quinta-feira, a sala de espera do Departamento de Infectologia Pediátrica do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), era uma reunião de mulheres desconfiadas. E tristes.
“Não sei o que vai ser da minha filha. Espero que ela seja uma criança normal, mas se ela tiver qualquer coisa vamos amá-la do mesmo jeito.” A incerteza de Juliana Pontes Souza, de 20 anos, acompanha a de outras mães de bebês diagnosticados ou com suspeita de microcefalia em Pernambuco. A família de Laura, que nasceu com o crânio medindo 21 centímetros, pouco sabe sobre a microcefalia e sua evolução. Apesar da condição ser descrita na medicina há anos, esta é a primeira vez que a anomalia congênita tem tantos diagnósticos, e pelo que tudo indica, por um vírus novo e sobre o qual pouco se sabe.
O desconhecimento não justifica, entretanto, as derrapadas do Ministério da Saúde. E do titular da pasta, que semana passada deu uma declaração infeliz enquanto anunciava o investimento em pesquisas para uma vacina contra o zika vírus. Marcelo Castro disse que não seria possível vacinar 200 milhões de brasileiros e que a estratégia se concentraria em pessoas em período fértil. E completou dizendo que torceria para que essas pegassem zika antes, pois, assim, ficariam imunizadas pelo próprio mosquito. Mesmo reconhecendo como ágil o enfrentamento do ministério, especialistas criticam a rápida associação do surto com o vírus zika. Apesar das evidências serem muito fortes, ainda não há comprovação científica. Tudo ainda é uma suspeita. Uma suspeita forte.
Certo é que, no Pernambuco de hoje, temem-se duas coisas: tubarão e Aedes aegypti. Mas quem não está no mar curte a brisa com pernas e braços de fora.
As praias de Boa Viagem e Porto de Galinhas estão lotadas. Segundo a Empresa de Turismo de Pernambuco (Empetur), as notícias sobre os casos de microcefalia não alteraram a expectativa de reservas para o verão; mas, claro, muitas grávidas deixaram de desembarcar na capital pernambucana, que notificou os primeiros casos de microcefalia, em outubro, e lidera em número de casos suspeitos.
REVOLTA E ACEITAÇÃO A recepcionista Rosana Vieira Alves da Silva, de 25 anos, é uma das mães dessa geração especial. Com as filhas Vitória Evillen, de 7, Layane Sophia, de 2, e Luana, de 3 meses, aguardava a coleta de uma amostra de sangue da recém-nascida, diagnosticada com microcefalia, com uma expressão bem mais leve que a das outras mães ao seu lado. Luana também é um caso diferente, porque, apesar de nascida no meio do surto, teve um exame positivo para toxoplasmose e a mãe não relata sintomas de zika na gestação. Mas saber a causa é o que menos importa agora. A experiência como mãe lhe permite enfrentar a condição de Luana com mais serenidade.
“Quando me falaram que ela tinha a cabeça no limite do que poderia ter, fiquei doida.
O jeito como Rosana curte sua filha é uma exceção. A maioria das mães não consegue conter as lágrimas à primeira pergunta. Carla Fernanda Reis da Silva, de 30 anos, com a pequenina Luane no colo, ainda aguarda o resultado da tomografia para ter o caso confirmado. Mas a cabecinha da filha é tão pequena que não sobram esperanças. A menina nasceu, dois meses atrás, com perímetro cefálico de 29,5cm. Carla não lembra de ter tido sintomas de zika na gravidez. Aos oito meses de gestação, ficou apavorada com o noticiário sobre a microcefalia. Semanas depois, aquilo se tornou sua realidade.
“Imagine o que é estar às vésperas de dar à luz e descobrir que as crianças estão nascendo com problemas. Quase fechando nove meses, fiz um ultrassom. A médica me alertou que ela tinha a cabeça pequena. Fiquei péssima. Sem comer, sem dormir. Só chorava. Tenho tristeza, raiva. Esperei tanto por essa filha... mas ela é especial”, lamenta a mãe, ainda longe da aceitação. Algumas desistem. Uma criança com microcefalia foi deixada em um abrigo no Recife. Outra foi rejeitada pela mãe, mas está sendo criada pelas tias.
Kits para grávidas
O teste para identificar simultaneamente dengue, zika e chikungunya será disponibilizado prioritariamente para mulheres grávidas, afirmou ontem, no Rio, o ministro da Saúde, Marcelo Castro. Um dia após a confirmação das três primeiras mortes por chikungunya no país, o ministro apresentou na Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz) o novo kit de diagnóstico desenvolvido pela instituição. Atualmente é necessário realizar os três exames separadamente. Até o fim do ano, o ministério vai encomendar 500 mil kits. Durante a divulgação do kit, o vice-diretor de Desenvolvimento Tecnológico do Instituto Carlos Chagas, Marco Krieger, explicou que a leitura da análise sairá em duas ou três horas..