O estupro coletivo de uma garota de 16 anos no Rio de Janeiro chocou o Brasil e o mundo. Mas o fato não é isolado. Tem ocorrido com frequência em diversas partes do país e quase sempre com características semelhantes: jovens embriagadas ou dopadas são violentadas por pessoas conhecidas. Levantamento feito pelo Estado de Minas aponta que só este ano foram denunciados pelo menos 10 casos de estupro coletivo, seis deles revelados após a divulgação da violência ocorrida no Rio de Janeiro. Ano passado, foram ao menos 20 casos.
De lá para cá, os registros só aumentam. Mas essas histórias reveladas são pequenas ainda perto da violência de que são vítimas mulheres em todo o Brasil, já que o estupro é uma das formas de violência mais subnotificadas no mundo inteiro. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os casos registrados correspondem a apenas 35% do total de estupros. Ano passado, foram notificados 47,6 mil casos no Brasil, o que corresponde a uma ocorrência a cada 11 minutos. E a maioria das vítimas é crianças e adolescentes. Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em março do ano passado, revela que 88,5% das vítimas desse tipo de violência eram do sexo feminino, mais da metade tinha menos de 13 anos e 70% das vítimas eram crianças e adolescentes.
Para Jeanete Mazzieiro, secretária Executiva do Fórum de Mulheres do Mercosul e integrante do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), o estupro sempre aconteceu e sempre foi escondido, já que a vítima e até a família muitas vezes se sentem envergonhadas e com medo de denunciar. Segundo ela, além disso, ainda é complicado fazer a denúncia, nem sempre tem delegacias especializadas e não existe um protocolo padrão de atendimento às vítimas. “Tudo isso dificulta mais ainda que essa odiosa violência contra a mulher seja denunciada”, afirma Jeanete, que cobra legislação mais eficiente para punir esse tipo de crime.
PROTOCOLO
Com a repercussão do caso do Rio de Janeiro, o Congresso Nacional resolveu se mexer. Foi criada uma comissão externa para apurar os casos mais recentes, entre ele o de Bom Despacho, interior de Minas, onde uma estudante foi estuprada em um congresso, e também as denúncias do Piauí. A comissão está acompanhando as investigações e pretende, ao final, propor mudanças na legislação. Segundo o deputado federal, delegado Edson Moreira (PR-MG), a intenção é criar um protocolo padrão, que já existe no Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul e que está sendo implantado no Piauí, e garantir que seja colocado em prática. Segundo Moreira, será considerado agravante o uso de álcool ou outras substâncias para dopar a vítima e a prática desse tipo de violência por mais de uma pessoa.
De acordo com a deputada Jô Moraes (PCdoB), muito do que vem sendo discutido já tinha sido proposto pela CPMI da Violência contra a Mulher, mas não saiu do papel. Segundo ela, a intenção é alterar a legislação para endurecer as penas para os estupradores. Mas, segundo Jô, é preciso ir além e passar a tratar da prevenção e da educação para evitar que essa cultura de violência e exploração sexual da mulher seja banida.