Fortaleza, 23 - A mãe de uma menina transexual, de 13 anos, acusa a escola onde a filha estuda em Fortaleza, de não querer renovar a matrícula da menina para 2018. Em um post nas redes sociais publicado na terça-feira, 21, Mara Beatriz diz que foi chamada para uma reunião com a direção do colégio, quando lhe "recomendaram" procurar outra escola, que possa atender "as necessidades" da jovem.
A mãe conta que a adolescente estuda no estabelecimento, que é mantido pelo Sistema Fecomércio do Ceará, desde os dois anos de idade. Segundo ela, a relação família-escola sempre foi cordial e amistosa, mas começou a desandar neste ano, quando, com o apoio da família, a jovem começou o processo de transformação da identidade, passando a adotar o gênero feminino.
Desde então, diz a mãe, a escola passou a colocar dificuldades. Primeiro, desrespeitando a resolução número 12/2015, que garante o reconhecimento e adoção do nome social em instituições e redes de ensino de todos os níveis e modalidades. Depois, negando o uso do banheiro de acordo com a identidade de gênero de cada sujeito.
"Desrespeitava o nome social, colocando o nome civil em todos os registros, tais como frequência, avaliações, boletins, a submetendo ao constrangimento. O banheiro feminino também lhe foi negado, com a recomendação que usasse o banheiro da coordenação", relatou a mãe.
A resolução do Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoções dos Direitos de Lésbicas, Gays, Travestis e Transexuais, de 2015 determina que travestis e transexuais tenham o direito de usar o nome social em todas as escolas e redes de ensino do País. O nome social, segundo a norma, deve constar em documentos, formulários e sistemas de inscrição, matrículas ou avaliações. O aluno também deverá ser chamado oralmente pelo nome escolhido.
"Depois, a impediram de pegar a carteirinha de estudante com o nome social, porque se negaram a confirmar a matrícula dela, o que causa danos morais e também financeiros, uma vez que ela não pode exercer seu direito à meia. Hoje (terça-feira), no cúmulo da transfobia, me chamaram para uma reunião e recomendaram que nossa família procure outra escola, que possa atender 'as necessidades' dela. Admitiram que ela é uma ótima aluna, com boas notas e comportamento, mas não vão fazer a matrícula dela para o ano de 2018", disse Mara.
"Simplesmente a expulsaram, a enxotaram. E quando eu questionei nos escorraçaram: 'os acompanhem, já terminamos a reunião'. Nunca nos sentimos tão constrangidos, humilhados, diminuídos, desrespeitados", descreveu Mara.
Indignada com a atitude da escola, a mãe da garota afirma não entender as razões para a não renovação da matrícula. "Escolhemos a Escola Educar Sesc porque acreditávamos no projeto pedagógico construtivista e inclusivo, onde desde cedo minha filha teve oportunidade de conviver com as mais diversas crianças: autistas, down, portadores de deficiência física."
A família da garota registrou Boletim de Ocorrência (B.O.) na Delegacia de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente (Dececa) e constituiu assistência jurídica junto ao Centro de Referência LGBT de Fortaleza.
'Providências'
Na terça-feira, o Sistema Fecomércio e a Escola Educar Sesc emitiram uma nota, na qual informam que a jovem terá sua matrícula renovada e repudiam "qualquer atitude de preconceito”. De acordo com o informe, a escola está averiguando os fatos e tomando as devidas providências. "A premissa básica do Sistema Fecomércio-CE é inclusão e educação. Analisamos o caso e a aluna tem matrícula assegurada em 2018, como todos os veteranos", consta no comunicado.
A resposta veio após ampla repercussão nas redes sociais sobre o caso, motivada por uma nota de repúdio postada pela mãe da garota. A postagem já teve milhares de visualizações e centenas de compartilhamentos.
A família está refletindo se mantém ou não a menina na mesma escola. Segundo a mãe, alguns fatores precisam ser pesados para a tomada de decisão. "Tem todo um laço afetivo estabelecido, uma vez que ela estuda lá desde os dois anos. Por outro lado, houve essa quebra na relação provocada por uma atitude tão preconceituosa. Mas estamos avaliando", disse Mara.
(Carmen Pompeu - Especial para a AE)