Brasília dorme cedo. Bares e restaurantes começam a fechar a partir das 22h, mas, independentemente do horário, o movimento nos estacionamentos 1 e 2 do Parque da Cidade Sarah Kubitschek, próximos ao Pavilhão de Exposições, nunca para. O Correio visitou esses locais durante três semanas para acompanhar a rotina no local. Encontrou pessoas em busca de prazer, aventurando-se dentro de veículos ou entre as árvores da região apelidada de Floresta dos Sussurros. O público se mostra diversificado, mas a maioria é homem. Engravatados, com roupas de malhar, brancos, negros, casados, solteiros, jovens e idosos. Todos estão lá por um motivo em comum: sexo rápido e sem compromisso.
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O estacionamento próximo à Floresta dos Sussurros é iluminado. Vários buracos e uma pista desgastada denunciam o trânsito intenso. Em menos de duas horas, cerca de 30 carros passaram pela região. Boa parte dos frequentadores não cobra pelas atividades sexuais. Porém, homens mais velhos e com condições financeiras costumam oferecer dinheiro para os jovens a fim de convencê-los a fazer o que quiserem na hora do sexo.
Entre as árvores, o ambiente muda. Fica mais escuro. Não se consegue ver direito o rosto dos parceiros, fora os momentos em que um veículo manobra e direciona os faróis, iluminando a “floresta”. Nesse momento, muitos se escondem, protegendo os olhos da luz ou tentando manter a identidade oculta. As abordagens são rápidas. Alguém se aproxima, cumprimenta e solta um rápido: “Curte o quê?”. A pergunta tem como objetivo descobrir se os homens são compatíveis sexualmente, mais especificamente, se são ativos ou passivos.
Caso tenha uma combinação, a relação se inicia.
No fim da madrugada, o público na Floresta dos Sussurros muda. Às 6h, muitos passam no local antes de seguir para o trabalho. Usam roupas formais, como terno e blazer, e trabalham na área central de Brasília. “O meu emprego fica na Asa Sul.
Por volta das 9h, o movimento diminui. Nesse horário, a interação ainda ocorre, mas de forma tímida, e o público muda outra vez. Agora, no lugar dos engravatados, gente com roupas esportivas toma conta dos estacionamentos próximos ao Pavilhão de Exposições. Salta de um veículo para outro e dá início à relação sexual em plena luz do dia.
Pegação
As histórias e os mistérios nos estacionamentos do Parque da Cidade ocorrem, no mínimo, desde os anos 1990. Em sites de dúvidas, fóruns e até em grupos nas redes sociais, são encontrados tópicos com pessoas questionando o motivo de haver tantos carros em movimento pelo local. Atualmente, a região é mais conhecida pelos frequentadores como Pegação. O termo é uma gíria usada para identificar qualquer local onde ocorra sexo casual e fácil.
Memória
Relações em áreas públicas
Práticas de sexo gay em locais públicos ocorrem há pelo menos dois séculos. Elas tiveram início quando os atos sexuais entre homens começaram a ser recriminados, fazendo com que ficassem marginalizados. No início, esse tipo de relação era mais comum com homens que, apesar de homossexuais, se casavam com mulheres. Com o passar das décadas, esses espaços públicos viraram pontos de paquera onde gays poderiam se encontrar longe da violência e da homofobia. Em 2013, a prática inspirou o filme francês Um estranho no lago, que narra a história de um local na Europa onde gays se encontravam para manter relações sexuais próximo a um lago. No Brasil, além de Brasília, alguns pontos conhecidos de pegação são o Parque Trianon, em São Paulo; a Praia do Phil, em Vitória (ES); e a Floresta dos Gatos, no Arpoador (RJ). Fora do país, ocorre no Central Park, em Nova York, e nos banheiros públicos de Bethnal Green, Hyde Park e Carnaby Street, em Londres.
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