São Paulo, 14 - Na esquina das Ruas Oscar Freire e a Padre João Manuel, nos Jardins, região nobre de São Paulo, tinha uma bike na calçada. Uma bike-floricultura, com vasinhos de cimento queimado servindo de casa para cactos e suculentas (tipo de planta muito usada no paisagismo). Uma bike-floricultura ornada com cordéis de J. Borges. E sem vendedor à vista. Não era só bike-floricultura: era também um convite à honestidade.
Por uma plaquinha em meio às plantas, o interessado é instruído a ficar bem à vontade: escolha seu produto, faça o pagamento no local indicado (uma caixinha de dinheiro ou uma máquina de cartão) e siga o @matosurbanos no Instagram.
Israel Joaquim de Santana, cearense de 29 anos, acompanha tudo de longe, mas nem sempre. Inventou o projeto para complementar a renda que faz como manobrista de um escritório de arquitetura e uma galeria de arte na Avenida Estados Unidos, nos Jardins, zona sul de São Paulo. Por isso, às vezes deixa a bike e as plantinhas sozinhas por horas.
"Nunca ninguém me roubou", conta aliviado, sem esconder que a hora de retorno é sempre um misto de tensão com confiança.
Medo maior, mesmo, ele tem de algum fiscal da Prefeitura passar e levar a bike embora, enquanto ele está de olho no carro dos outros ou longe da barraquinha. É que ele ainda não tem o Termo de Permissão de Uso.
"Mas o que eu queria mesmo não é ter a autorização para ficar em um só lugar. Queria poder colocar a bike em qualquer lugar, deixá-la com acesso livre para todo mundo. Imagina que legal todo mundo conhecer? E até correr o risco de ser roubado também", diz ele, sonhador.
Tanta confiança vem também da necessidade. Ele trabalha o dia inteiro, não tem como dar atenção para a bike.
'Severino'
O Matos Urbanos é um projeto que nasceu aos poucos e ganhou o formato atual há cerca de três meses. "Sou um Severino da vida, né? Já fui pintor, eletricista, encanador, pedreiro.
Quando dominou a técnica, sugeriu ao arquiteto Gui Mattos colocar os vasinhos em um espaço da casa onde é manobrista. Depois, eles passaram a ocupar uma goiabeira que fica na frente do local. "Mas a situação estava difícil. Ganho R$ 1,4 mil, tenho 4 filhos", lembra. Então tomou coragem e pediu ajuda aos chefes para comprar o que planejava ser um "food bike".
A ideia era que a mulher dele, Viviane, vendesse tapioca, mas não deu certo. " Resolvi então tirar os vasinhos da goiabeira, colocar na bike e comecei a circular à noite, ao sair do trabalho, pelas ruas dos Jardins." Virou garden bike.
No Dia dos Namorados, deixou a bike na Oscar Freire. O público aprovou.
Hoje deixa a bike com as plantinhas estacionada perto do trabalho à noite, mas sonha em aumentar o negócio para ter mais bikes e um carreto para levá-las mais para longe. Nos rolos da vida, Santana também atende por Renato. A confusão vem da época em que ele, ainda adolescente e namorador, dizia um nome diferente para cada namorada. Um dia, uma das moças, que viria a se tornar mulher dele, apareceu grávida. "Aí não dava mais, né? Contei a verdade. Mas todo mundo já me chamava de Renato. Até já tinha me acostumado com o nome." As informações são do jornal
O Estado de S. Paulo.
(Giovana Girardi).