Érica Ferreira é uma travesti de 54 anos e namora Jorge, de 49 anos. Os dois estão juntos há 16 anos e recolhem lixo reciclável em uma carroça no centro de Franco da Rocha, na grande São Paulo, e são bastante conhecidos pela população. Com a ajuda de uma ONG, da prefeitura e de moradores da cidade, os dois puderam oficializar a união no último domingo, 22, com direito a vestido branco e terno.
O casamento foi realizado durante a II Parada LGBT de Franco da Rocha, idealizado pelo Instituto Nice, que atua na reinserção social da população LGBT, em parceria com a prefeitura da cidade. Valéria Rodrigues, presidente do instituto, conhece Érica há anos, mas nunca conseguia conversar muito com ela. Até que, em abril, isso mudou.
- Foto: Reprodução/Facebook/Prefeituradefranco"Eu finalmente consegui bater um papo mais demorado com ela, de meia hora. Eu perguntei: 'Qual é o seu sonho? Diz pra gente. Eu me sinto impotente de não poder fazer algo por uma igual, uma trans. Ela disse: 'Meu sonho é casar, porque eu sinto que não vou durar muito tempo e tenho medo do meu companheiro ficar desamparado e, se eu casar, ele poderá ficar assegurado ao menos com um cantinho para ele descansar", contou Valéria ao E%2b.
Valéria pediu para gravar Érica contando sobre o seu sonho.
O vídeo foi divulgado e criou uma corrente do bem em Franco da Rocha. De supermercados a salões de beleza, de empresas de produção de filmagem e fotografia a confeitarias, muitas empresas e pessoas doaram seus serviços e produtos para tornar o sonho de Érica realidade.
- Foto: Reprodução/Facebook/PrefeituradefrancoEntão chegou o dia 22 de julho. Érica chegou ao Parque Municipal Benedito Bueno de Morais em um carro de luxo, com um vestido branco bordado e rodado e um longo véu, e atravessou uma multidão que estava ali para celebrar seu amor com Jorge por meio de um tapete vermelho ao som da marcha nupcial. Valéria contou que Érica lhe disse, após o casamento, que aquilo "deu vida para ela" e, que antes, "ela só chorava, não dormia, ficava chorando pedindo para que alguma coisa acontecesse".
- Foto: Reprodução/Facebook/Prefeituradefranco"Ela nem sabia que poderia mudar o nome e o gênero no documento. Uma advogada da rede fez todo esse trâmite para ela, de mudar os documentos, e o cartório da cidade deu de presente a documentação do casamento. É muito lindo, sabe? Ela diz que ainda está acordando. A gente que é trans sabe qual é a realidade, e ela sempre ficou desconfiada, dizendo: 'Isso não existe, não dá pra mudar o nome porque eu não sou operada'.
E a gente mostrou para ela que é possível", disse a presidente do Instituto Nice.
O Instituto Nice atua nas cidades de Caieiras, Franco da Rocha, Francisco Morato (onde fica a sede), Mairiporã e na capital, e tem como foco auxiliar pessoas transexuais e travestis na reinserção social e profissional. Os profissionais atuam de forma voluntária e se mantêm com parcerias com empresas, órgãos públicos e com doações. A primeira Parada LGBT de Franco da Rocha foi idealizada pela ONG e, após o sucesso, entrou no calendário oficial da cidade.
A ONG celebra por conseguir, "com um trabalho de formiguinha", mudar a história de algumas pessoas e fazer o amor vencer. "Depois da cerimônia, Érica foi para casa, trocou de roupa e voltou com o Jorge para a balada. Eu falei: 'Mulher, vai para a sua lua de mel', e ela respondeu: 'Eu vim é agradecer. Eu nunca senti tanto amor na minha vida. Eu quero sentir mais e mais, porque isso é muito bom!'", contou.
(HYNDARA FREITAS).