Enfileirados no chão do corredor, cinco potes de plástico evitam que as goteiras dos aparelhos de ar-condicionado encharquem a recepção. Eles estão ligados em 18º C, ainda assim faz calor na prefeitura de Palmeira dos Índios, que até 2017 vivia sua pior estiagem. Fixado na porta, um cartaz adverte: "Não entre sem camisa".
Até recentemente, os visitantes tinham acesso à galeria de fotos de todos os ex-prefeitos de Palmeira, exposta no salão nobre. O mais famoso: Graciliano Ramos de Oliveira, que tomou posse em 1928 após concorrer sozinho à eleição. Graciliano renunciou do cargo em abril de 1930, desgostoso da política, e aceitou convite para dirigir a Imprensa Oficial de Alagoas, em Maceió.
O retrato de Graciliano, o prefeito, porém, não está mais à vista. Agora, há apenas uma foto pendurada na recepção, com moldura fininha. Nela, vê-se o atual prefeito, Júlio Cezar da Silva (PSB), posando de gravata laranja e um sorriso congelado no rosto.
Por lá, a ausência é tratada com naturalidade.
Para acessar o gabinete, atravessa-se um corredor com selos gigantes: homenagem dos Correios aos 128 anos do município em 2017. Eles retratam palmeirenses ilustres, entre os quais o próprio Graciliano Ramos e o ator Jofre Soares (1918-1996). "A capital da cultura de Alagoas", dizem os selos.
Filho de verdureira com ajudante de oficina, o prefeito Júlio Cezar, de 46 anos, senta à cabeceira da mesa de madeira, sobre a qual estão jornais, um telefone fixo e uma bandeirola de Palmeira dos Índios. "Quem leu Vidas Secas mergulha no sofrimento do povo do Nordeste, que até hoje sofre com desigualdade e concentração de renda", afirma Cezar, ex-policial e jornalista, cuja oratória é elogiada até por adversários políticos.
Homenagens
Eleito em 2016, ele explica como Palmeira cultua a imagem do escritor. Graciliano é nome de escola pública, auditório (ainda não inaugurado), museu (fechado para reforma) e de bairro. Também mira transformar o prédio da prefeitura, de 1919, em um memorial.
Questionado sobre o retrato do escritor, Cezar responde onde o quadro foi parar: "Está no Museu Xucurus". Mas um visitante atento pode perceber que há uma série de quadrinhos empilhados sobre uma tábua nos fundos da prefeitura. A pilha encontra-se bem do lado dos banheiros, sem qualquer proteção.