O corte de 30% no orçamento das universidades públicas anunciado pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, "praticamente inviabiliza a faculdade", segundo diagnóstico do reitor da Universidade Federal Fluminense (UFF), Antonio Claudio Lucas da Nóbrega. A UFF foi uma das três instituições citadas pelo ministro ao falar em cortes por "balbúrdia" nesta semana - posteriormente, o MEC recuou e falou em bloqueio linear de verbas para todas as federais. "Com esse corte, vamos, mal, só pagar conta. E tem de sobrar para pagar água e luz. Se não, nem abro a porta", afirmou.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o reitor da UFF (2018-2022) reclamou da falta de interlocução da atual gestão com as instituições de ensino e criticou a punição por questões políticas.
O ambiente universitário da Universidade Federal Fluminense é de "balbúrdia"?
Naturalmente, uma universidade com 50 mil pessoas em nove municípios, produzindo conhecimento e interagindo com a sociedade do jeito que a UFF faz, é regida muito mais por compromisso e trabalho do que por eventuais problemas.
O ministro postou que "para quem conhece universidades federais, perguntar sobre tolerância ou pluralidade aos reitores (ditos) de esquerda faz tanto sentido quanto pedir sugestões sobre doces a diabéticos"...
Não sei qual a experiência do ministro ou de onde ele tira essas experiências. A gente entende que a universidade não é perfeita e está aberta ao diálogo. O que é perigoso é ver o problema de maneira superficial.
A questão política mudou o ambiente acadêmico?
Com essa polarização infeliz que aconteceu no País, apareceram movimentos (de direita), o que por um lado é positivo do ponto de vista da construção do diálogo, mas (se apresentaram) de forma ultrarradicalizada, o que é muito ruim.
Como o senhor vê as atuais diretrizes do MEC em relação às universidades públicas?
É difícil definir. Mas a interlocução não tem sido muito fluida. Não há um canal aberto.
O ministro declarou um corte linear de 30% nos recursos...
Ele praticamente inviabiliza a universidade. Mas temos de ser justos: o fato é que, desde 2014, a universidade pública vem sofrendo cortes.
O ministro, na terça-feira, comparou o custo do aluno de graduação com o da pré-escola. São universos comparáveis?
Se me perguntarem: deveria ter mais investimento em educação infantil? Eu vou dizer que sim, mas não em detrimento do investimento em ensino público superior. Nós precisamos é tomar decisões governamentais que atendam a preceitos constitucionais da prioridade na educação da pré-escola ao pós-doutorado. Constitucionalmente, é atribuição dos municípios e Estados educação básica e média. À União cabe a superior. Então, a União vai estar se "desresponsabilizando" do ensino superior, que é um preceito constitucional? É uma discussão muito mais ampla do que um mero tuíte de duas linhas que diz que é mais importante creche do que universidade. Não, por favor, vamos debater sobre o tema... É tão importante no País a educação básica quanto a superior.
O episódio da faixa estendida contra o presidente Jair Bolsonaro na UFF, durante as eleições, contribuiu para esta situação?
Não sei dizer. Se, eventualmente, ele entender que a faixa foi um problema, eu vou explicar ao ministro que houve uma manifestação do TRE (Tribunal Regional Eleitoral) e do STF (Supremo Tribunal Federal), dizendo que era um ato legal e justo. Então, por favor, vamos deixar isso no passado.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo..