Decibelímetro. Esse palavrão virou costume no vocabulário de Elizabeth Andrade, de 60 anos. Pressionada pelo barulho de bares em Pinheiros, zona oeste de São Paulo, ela aprendeu a medir ruídos perto de seu apartamento com um aplicativo. "Todo mundo aqui tem", diz a agente de viagens, moradora da Simão Álvares, rua que recebeu novos empreendimentos nos últimos anos.
Mobilizados nas redes sociais e associações, vizinhos em Pinheiros e na Vila Madalena fazem nova ofensiva contra o barulho de bares e miram a ocupação de calçadas e o uso indevido de parklets. As estratégias vão de medições de decibéis ao mutirão de denúncias - houve até quem conseguisse fechar a rua para evitar visitantes ruidosos.
O incômodo, segundo os moradores, aumenta na mesma medida em que bares abrem as portas na região. Perto da já consagrada boemia da Vila Madalena e alçado por mudanças na lei de zoneamento, Pinheiros se tornou nova rota do comércio e da vida noturna.
"Não conseguimos dormir direito", reclama Elizabeth, que usa até tampões de orelha, à noite, para abafar o som da rua. No início do ano, motivada pela previsão de transtornos no carnaval de rua, ela criou um grupo no Facebook, com mais de 800 pessoas. O nome é um apelo: SOS Moradores de Pinheiros e Vila Madalena. "No último domingo, quando teve música ao vivo, o jeito foi fechar janelas, portas do quarto e ficar na sala."
São comuns "mutirões" de vizinhos, conectados pela internet, para reclamar de bares. "Se um estava incomodado, todos faziam denúncia, para dar volume", diz o aposentado José Roberto Cerrato, de 65 anos. Em defesa da Rua Ministro Costa e Silva, em Pinheiros, onde mora desde criança, ele e 14 vizinhos montaram uma associação.
Recentemente, o grupo se mexeu contra um novo bar, que colocava caixa de som e churrasqueira na calçada. A associação até registrou CNPJ. Após autuações pela Prefeitura, há dois meses o bar foi interditado. "É legal ter farmácia, cinema, teatro, bar. Desde que não cause incômodo, que não nos tire a noite de sono", diz Cerrato.
A entidade também obteve aval para fechar a Ministro Costa e Silva com grades. Desde 2018, a via fica cercada todo dia, das 22 horas às 5 horas. "Com a rua aberta, frequentadores de bares deixavam carros aqui e depois vinham buscar de madrugada, conversando", lembra.
Reclamações por poluição sonora no distrito de Pinheiros têm crescido: de 164 no 1.º trimestre de 2017 para 195 no mesmo período do ano seguinte. Em 2019, até março, foram 199 queixas. Em toda a cidade, as reclamações do tipo caíram.
A Subprefeitura de Pinheiros, que engloba os distritos de Pinheiros, Alto de Pinheiros, Itaim-Bibi e Jardim Paulista, tinha, no 1.º trimestre, era a vice-líder em reclamações do tipo, perdendo só para a Sé, no centro. De janeiro a 18 de junho houve seis multas por poluição sonora no distrito. No ano passado, foram 11. E, em 2017, quatro.
O Programa de Silêncio Urbano (PSIU) tem apenas quatro fiscais durante o dia e nove à noite para toda a cidade. Estabelecimentos que prejudicam o sossego estão sujeitos à multa de R$ 11 mil na primeira infração - o valor dobra na reincidência.
Calçada
A ocupação de calçadas por mesas de bares e o uso irregular de parklets também incomodam. Foi depois de ter de caminhar no meio da rua - a calçada estava tomada por mesas - que o urbanista George Frug teve a ideia de criar a Associação de Moradores de Pinheiros (Amor Pinheiros) há dois anos e meio.
A circulação livre dos moradores virou bandeira.
Semana passada, moradores de Pinheiros, reunidos pelas redes sociais, levaram ao Ministério Público abaixo-assinado contra o uso indevido de parklets. Há, afirmam, ao menos 12 irregulares na região, que se tornaram "extensão dos bares".
A Prefeitura disse que, após ouvir órgãos como o Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) e o Conselho Participativo, a Subprefeitura de Pinheiros vai "avaliar não só os equipamentos alvo de denúncias de desvio de finalidade, mas os 74 (parklets) na área". A Subprefeitura de Pinheiros tem metade dos parklets da cidade.
Diálogo
Presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de São Paulo, Percival Maricato defende o diálogo. "É fundamental o morador falar com o dono. Ali está o investimento dele, criando renda, emprego." Há exageros, diz, dos dois lados. "Tem dono de bar que não é profissional, que não zela para que a atividade seja benéfica à sociedade.