A regra é só uma: escapar antes que o tempo acabe. Já a quantidade de usos pedagógicos desse jogo se multiplica na medida da criatividade dos professores. Febre no exterior - e opção de lazer que também caiu no gosto dos brasileiros -, os escape rooms agora desembarcaram nas escolas. Presos dentro de uma sala misteriosa, cheia de cofres e cadeados, os alunos têm de resolver juntos uma série de enigmas para encontrar a chave da liberdade.
Enquanto os problemas podem passar pela Geografia, Biologia e Matemática, as soluções vêm, necessariamente, do trabalho em equipe. Nos escapes, não existe um ganhador: ou todos saem ou nada feito. Alunos com espírito de liderança ajudam a coordenar o grupo ao mesmo tempo em que outros trabalham para acalmar os colegas.
Foram três meses quebrando a cabeça - até nas férias - para que o professor Renato Aruta conseguisse finalmente montar um escape room à altura da perspicácia dos estudantes do 3.º ano do ensino médio do Colégio Santa Catarina, na zona leste de São Paulo.
"Não acredito que ele fez isso com a gente", pensava Giovanna Coppi, de 17 anos, uma das "detidas", enquanto Aruta monitorava os alunos - e se divertia - por meio de uma câmera instalada na sala. A incredulidade deu lugar ao corre-corre e logo a turma entrou no espírito. Quem tinha intimidade com mapas ajudou a desvendar códigos escondidos em coordenadas geográficas. Fãs da Matemática se debruçaram sobre cálculos.
Mas o reforço dos conteúdos foi apenas um efeito colateral. "A ideia foi unir características de cada aluno, como liderança, capacidade de resolver problemas", explica Aruta. Para professor e estudantes, conhecer mais o outro revelou boas surpresas - e acendeu novas ideias.
"Tem uma amiga que é bem quietinha. Nunca imaginei que ela organizaria tudo enquanto estavam todos nervosos", exemplifica Luísa Pontes, de 16 anos. "Por tomar o controle da situação, gosto de trabalhar o modo como trato os amigos. Não quero ser a que impõe", diz Giovanna. Atividades como os escape rooms se inserem em um contexto de valorização das habilidades socioemocionais, decisivas para a formação dos jovens e o bem-estar na escola.
Bullying em foco
No Colégio Humboldt, na zona sul, a sala foi montada por uma empresa especializada. Uma história fictícia, sobre uma criança que sofria bullying, foi contada aos jovens do 7.º e do 8.º ano como pano de fundo do jogo. "Tínhamos alguns alunos novos e queríamos ter maior integração", diz a professora Melissa Ufer.
Para Corinne Sanchez, de 13 anos, além de divertida, a atividade sem interferência de adultos teve a vantagem de colocar os jovens como protagonistas. "O professor é nossa autoridade, mas também é gostoso ter um pouco do comando do estudo. Gosto de aprender por mim mesma, me virar."
No Colégio Magno, zona sul, o protagonismo dos alunos foi explorado ao máximo em um escape room que eles mesmos construíram. Durante meses, o 9.º ano elaborou enigmas e montou todo o cenário da sala, que propunha reflexões sobre questões ambientais.
Para conhecer a engenhosidade de um escape room, eles chegaram a frequentar salas profissionais, fizeram eleições de charadas e testaram o grau de dificuldade de seus enigmas com os colegas. No final, inauguraram o jogo para outros estudantes, pais, professores e até moradores do bairro. "A gente fazia reuniões, um pesquisava, outro buscava materiais. Juntamos as peças", conta Daniel Bernis, de 15 anos.
Agora, o mesmo processo está sendo replicado com estudantes ainda mais novos. "Ouvi de uma aluna: Nunca me senti com tanto poder. Essa ideia é minha", conta Daniela Camargo, coordenadora de Ciências e responsável pelo projeto. "O que fazemos é mediar. E não há tanto conflito porque eles precisam escutar o outro."
Criatividade
Para Margareth Polido Pires, do Instituto Singularidades, voltado para a formação de professores, atividades desse tipo têm o potencial de colocar os estudantes para "acionar conhecimentos" na resolução de problemas reais. E não precisam de sofisticação técnica para cumprir o objetivo. "Podem ser feitos pequenos estudos de casos que tenham esse caráter de um enigma", exemplifica. "Depende da formação do professor e do acolhimento da instituição a esse poder criativo." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo..