A descoberta de que o agravamento da infecção causada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2) pode estar relacionado à formação de microcoágulos nos vasos sanguíneos fez os médicos do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, iniciarem há cerca de três semanas experimentos com anticoagulante para o tratamento de pacientes internados em estado grave com COVID-19.
De acordo com os resultados clínicos preliminares do hospital, o que se sabe até o momento é que desacelerar a ampla ação de coagulação, que ocorre com a inflamação causada pelo vírus, pode ajudar a evitar mortes pela doença.
Foram tratadas 30 pessoas de acordo com esse procedimento, das quais 25 não precisaram ser intubadas. As outras cinco estão na UTI e iniciaram o tratamento com o método quando já estavam sob cuidado intensivo. O artigo científico com os resultados dos testes deve ser publicado nos próximos dias e a pesquisadora espera ampliar o estudo.
A professora do departamento de patologia, médica do Laboratório de Investigação Médica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e pneumologista do Sírio-Libanês, Elnara Negri, reconhece que a técnica parece promissora, mas lembra que ela está em fase de observação.
"É pouco. É uma observação clínica de que esses pacientes estão indo bem. Estão ficando sete dias internados, não precisam de aparelhos e vão para casa. Mas ainda não é algo comprovado”, esclarece a professora.
A técnica iniciada há cerca de três semanas no hospital paulistano surgiu após a pneumologista ter ciência da descoberta de outros médicos que estavam examinando os corpos de pacientes que morreram vítimas da infecção. A partir das necropsias feitas nos cadáveres, os patologistas encontraram a presença de pequenos coágulos nos vasos sanguíneos de várias partes do corpo.
O patologista Paulo Saldiva, coordenador do grupo que realiza as autópsias e também professor da FMUSP explicou a importânica da análise dos cadáveres.
"Temos que fazer uma análise rápida, mas examinamos os corpos para informar para os clínicos, que estão cuidando dos pacientes vivos, os mecanismos de ação do vírus", esclareceu.
A reação dos anticoagulantes
De acordo com o estudo, doses mais elevadas de anticoagulantes tem como objetivo contrabalancear a ampla ação de defesa do corpo humano contra a COVID-19. Para invadir células dos órgãos, principalmente do pulmão, o vírus quebra as barreiras celulares, e como mecanismo de proteção, o corpo desencadeia a "tempestade inflamatória".
Segundo os especialistas, essa reação de coagulação está associada à uma resposta inflamatória exaferada do organismo quando o vírus ataca as células. Essa coagulação, fora de controle, pode provocar o entupimento de vasos sanguíneos mais finos, como os capilares que irrigam os alvéolos pulmonares, doença conhecida como tromboembolismo.
"É uma tempestade inflamatória e isso leva a pequenas coagulações nos vasinhos dos órgãos. Com esses microcoágulos, a circulação de sangue e a oxigenação dos órgãos essenciais vai sendo interrompida, o que pode levar à morte", explica Elnara.
Ela também ressaltou a importância do uso de ventiladores mecânicos nessas ocasiões em que o paciente enfrenta problemas de oxigenação.
"O paciente precisa do respirador porque o vírus estimula que o sangue coagule dentro dos capilares pulmonares. Há coagulação intravascular disseminada. É um cabo de guerra", afirma.
Nas autópsias de algumas pessoas que morreram infectadas pelo novo coronavírus foram encontradas bloqueios na microcirculação sanguínea, em especial nos pulmões. Com a microcirculação de sangue atingida, a troca gasosa que ocorre nos alvéolos pulmonares – o oxigênio (O2) entra na corrente sanguínea e o dióxido de carbono (CO2) sai – é prejudicada e, com isso, a pessoa sofre problemas de oxigenação no sangue.
Quando deve ser usado?
Na maioria dos casos testados, o anticoagulante é administrado para prevenir a trombose venosa profunda em pacientes que estão internados a mais tempo em UTIs, e por essa razão, são mais suscetíveis a problemas de circulação e mobilização após receberem alta médica. Segundo o estudo, essa prescrição é estudada caso a caso de acordo com o paciente.
Para Elnara, "é necessário tentar iniciar o tratamento antes de o paciente ir para a entubação. Os coágulos começam a se formar antes mesmo do infectado ficar com um quadro de insuficiência respiratória grave". "Eles começam quando o paciente já está precisando de oxigênio, mas não necessariamente de intubação", explicou.
No Hospital Sírio-Libanês, os pesquisadores têm utilizado o anticoagulante antes da ida para a unidade intensiva, quando a diminuição da oxigenação no sangue do paciente começa.
*Estagiário sob supervisão do subeditor Rafael Alves
O que é o coronavírus?
Coronavírus são uma grande família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus (COVID-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doença pode causar infecções com sintomas inicialmente semelhantes aos resfriados ou gripes leves, mas com risco de se agravarem, podendo resultar em morte.
Como a COVID-19 é transmitida?
A transmissão dos coronavírus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secreções contaminadas, como gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal próximo, como toque ou aperto de mão, contato com objetos ou superfícies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.
Como se prevenir?
A recomendação é evitar aglomerações, ficar longe de quem apresenta sintomas de infecção respiratória, lavar as mãos com frequência, tossir com o antebraço em frente à boca e frequentemente fazer o uso de água e sabão para lavar as mãos ou álcool em gel após ter contato com superfícies e pessoas. Em casa, tome cuidados extras contra a COVID-19.
Quais os sintomas do coronavírus?
Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:
- Febre
- Tosse
- Falta de ar e dificuldade para respirar
- Problemas gástricos
- Diarreia
Em casos graves, as vítimas apresentam:
- Pneumonia
- Síndrome respiratória aguda severa
- Insuficiência renal
Mitos e verdades sobre o vírus
Nas redes sociais, a propagação da COVID-19 espalhou também boatos sobre como o coronavírus é transmitido. E outras dúvidas foram surgindo: O álcool em gel é capaz de matar o vírus? O coronavírus é letal em um nível preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar várias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS não teria condições de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um médico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronavírus.
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