O novo coronavírus pode se dissimular no organismo humano e contagiar outras pessoas sem que o infectado saiba que está disseminando o vírus. De acordo com o professor do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Saldiva, além de ser mais agressivo que o H1N1, a covid-19 tem um tempo maior de latência no organismo.
Saldiva está à frente de um grupo da USP que desenvolveu um protocolo para que se coletem tecidos durante a necropsia das vítimas da covid-19, montando um biobanco que poderá ser compartilhado pelos pesquisadores para estudar a doença e suas manifestações sistêmicas. Ele já atuou em outras pandemias, fazendo a análise de corpos de dezenas de vítimas do H1N1.
Até a tarde de ontem, a equipe tinha feito necropsia pelo método minimamente invasivo em 15 corpos. A expectativa é de chegar a 50 para entender a dinâmica da doença e planejar ações terapêuticas.
É possível comparar o novo coronavírus com outros vírus, como o H1N1?
Esse vírus é mais agressivo que o H1N1. A contagiosidade é similar, mas a agressividade dele é um pouco maior. A outra característica que o torna mais letal é que o tempo de latência, entre você estar contaminado e desenvolver doença clínica, também é maior. No H1N1 em no máximo dois dias você estava com febre. Nesse vírus pode ficar até 10 ou 12 dias sem sintomas, enquanto ele vai minando o organismo. Isso significa que a pessoa com o vírus pode estar contaminando outras sem saber.
Já dá para entender como o vírus age e se há diferença nos corpos de homens e mulheres?
Fizemos 15 necropsias, mas só temos as análises de dez. Vamos ter a resposta para isso mais à frente. Agora estamos fazendo o PCR (exame molecular) de todos os órgãos para saber para onde o vírus foi. A gente sabe que, além do pulmão, os vírus estão indo para o cérebro, os rins e os testículos. O que sabemos é que é muito rápido e extremamente agressivo, principalmente no sistema respiratório. A maioria estava com as vias sanguíneas que irrigam os pulmões obstruídas por tromboses.
Alguma dificuldade para conseguir material para o estudo?
Os familiares, mesmo em momento de perda, autorizam o uso desse material. Já que não podem doar o órgão, entendem que estão doando conhecimento. O número sobe todo dia, e todo dia tem necropsia.
Quando os resultados dos estudos estarão disponíveis?
O material analisado já está sendo oferecido, por isso, que a gente dividiu em equipe. Já temos artigo científico escrito sobre trombose e está saindo outro sobre a técnica que a gente usa. A gente acha que vai chegar rápido em torno de 40 ou 50 casos; vamos ter pacientes de várias faixas etárias, com comorbidades e vários tempos de internação para entender o que acontece ao longo do tempo de internação, como a doença evolui. Entender por que algumas pessoas morrem com poucos dias e outras com mais dias.
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