O fotógrafo Sebastião Salgado e a esposa, Lélia Wanick Salgado, responsável pelo projeto gráfico da maioria de seus trabalhos, escreveram um manifesto para pedir ao presidente da república, Jair Bolsonaro, além dos presidentes da Câmara e do Senado, que atuem para impedir que o coronavírus se espalhe em aldeias indígenas.
O receio é que a contaminação provoque um número muito grande de mortes e dizime os povos originários do país. O aumento do número de invasões em terras indígenas durante a pandemia também é denunciado no texto.
Sebastião Salgado reuniu assinaturas de autoridades e personalidades de todo o mundo. Assinaram o texto o Príncipe Albert II de Mônaco, Presidente da Fundação Príncipe Albert II, a atriz francesa Juliette Binoche, os cineastas, o músico Paul McCartney , o espanhol pedro Almodovar e os mexicanos Alejandro González Iñarritu e Alfonso Cuarón, os atores americanas Meryl Streep, Glenn Close e Richard Gere, os músicos brasileiros Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, dentre outros.
O texto alerta para a ameaça de sobrevivência dos indígenas por conta da pandemia, e lembra o passado desses povos. “Há cinco séculos, esses grupos étnicos foram dizimados por doenças trazidas pelos colonizadores europeus. Ao longo do tempo, sucessivas crises epidemiológicas exterminaram a maioria de suas populações. Hoje, com esse novo flagelo se disseminando rapidamente por todo o Brasil, comunidades nativas, algumas vivendo de forma isolada na Bacia Amazônica, poderão ser completamente eliminadas, desprovidas de qualquer defesa contra o coronavírus.”
“Essas operações ilícitas se aceleraram nas últimas semanas, porque as autoridades brasileiras responsáveis pelo resguardo dessas áreas foram imobilizadas pela pandemia. Sem nenhuma proteção contra esse vírus altamente contagioso, os índios sofrem um risco real de genocídio, por meio de contaminações provocadas por invasores ilegais em suas terras.
Diante da urgência e da seriedade dessa crise, como amigos do Brasil e admiradores de seu espírito, cultura, beleza, democracia e biodiversidade, apelamos ao Presidente da República, Sua Excelência Sr. Jair Bolsonaro, e aos líderes do Congresso e do Judiciário a adotarem medidas imediatas para proteger as populações indígenas do país contra esse vírus devastador”, solicita o manifesto.
"Chamar a atenção", diz Salgado
À reportagem, Sebastião Salgado falou da importância de uma ação rápida dos poderes da República. “Tentamos chamar a atenção da presidente da República, do Judiciário, Legislativo, para liberar o território indígena dos invasores. Temos um risco real do desaparecimento da comunidade indígena. É do conhecimento do governo o problema. É de conhecimento do governo que desmontou os filtros de penetração nesses territórios que são protegidos pela Constituição Federal. É de conhecimento que o coronavírus pode exterminar grande parcela dessa população. É um genocídio, uma morte anunciada. E se as autoridades não tomarem uma posição, o Brasil passará a ser o responsável pela tragédia”, alertou.
“As pessoas que assinaram a lista, que é significativa, todas têm uma preocupação muito grande com o que está acontecendo. É uma preocupação humanitária. As pessoas têm consciência do que está ocorrendo. As organizações indígenas estão pedindo socorro. Estão reunidas, e nunca houve tanta invasão em territórios indígenas e nem tanto consenso dentro das comunidades indígenas sobre o perigo”, afirma o fotógrafo.
“Eu gostaria que as autoridades tomassem a responsabilidade de criar uma força tarefa para desobstruir o território indígena dos invasores. Que respeitem a Constituição. A lei tem que ser aplicada. É preciso um mandato para permitir que o Exército entre nessas regiões e salve esses povos”, pede.
Procurada, a Fundação Nacional do Índio (Funai) respondeu por meio de nota, e disse compreender “a necessidade de que pessoas estranhas à comunidade não permaneçam em Terras Indígenas, sobretudo neste momento em que se faz necessário o isolamento social frente à pandemia do novo coronavírus”.
“Nesse sentido, a Fundação vem atuando na vigilância, fiscalização e monitoramento dos territórios indígenas, por meio de suas unidades descentralizadas, e em parceria junto a órgãos governamentais, ambientais e de segurança pública, no sentido de articular e fortalecer ações conjuntas de proteção e fiscalização nas áreas pertencentes aos povos tradicionais”, justifica o órgão.