Jornal Estado de Minas

COVID-19

Avanço da COVID-19 pelo interior do Amazonas tem reflexo em Manaus



O Amazonas registrou 14 mortes pelo novo coronavírus no último domingo, o menor número em 24 horas desde o início da pandemia. O estado tem 29.867 contaminados e 1.758 óbitos. Mas a situação continua preocupante por causa do avanço da doença pelo interior do estado, que é o maior desafio agora do governo do Amazonas, que tem grande extensão territorial. A falta de estrutura acaba provocando a transferência de pacientes para a capital, agravando o atendimento. Em uma semana, houve aumento de 42,8% no número de pessoas infectadas. De acordo com a Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas, foram notificados mais de 8 mil novos casos.



Manaus, a capital, tem 13.881 casos, o que equivale a 46,48% dos infectados no estado. O governo estadual está preocupado com a velocidade com que o vírus está se espalhando pelo interior, que registra 53,52% dos contágios. De todo o Amazonas, somente os municípios de Envira e Ipixuna não têm casos confirmados, apenas suspeitos.

Apesar da recomendação do Ministério Público, Manaus não aderiu ao lockdown. Até o último dia 20, cinco cidades do interior decretaram medidas rígidas de isolamento social. São Gabriel da Cachoeira e Silves prorrogaram o bloqueio total até o dia 31 deste mês.  Entretanto, o governador Wilson Lima (PSC) planeja reabrir gradualmente o comércio no estado a partir de 1º de junho. No último domingo, Lima afirmou que os planos podem mudar conforme a curva de casos.

“Desde a semana passada, sentimos queda significativa no número de casos de coronavírus no Amazonas, e eu me refiro a óbitos. Temos acompanhado a quantidade de enterros na capital, que é um parâmetro mais seguro. Entre o final de abril e início de maio, houve um dia em que foram 167 enterros. Ontem, houve 48, então, tivemos diminuição significativa”, afirmou o governador em entrevista à CNN.



Apesar da queda no número de óbitos, o Amazonas contabiliza 561 pacientes internados por COVID-19 em leitos clínicos (48 na rede privada e 298 na rede pública) e em UTIs (68 e 147 respectivamente). Além disso, o estado conta 576 suspeitas de infecção pelo novo coronavírus internados e que aguardam a confirmação do diagnóstico. Neste contexto, o governador afirmou que vai inaugurar uma ala indígena no Hospital de Combate à COVID-19 em Manaus. Para este projeto, o governo federal enviou, no último dia 22, novos respiradores que possibilitam a abertura do espaço.

O ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, deve desembarcar em Manaus nesta semana. “O general Pazuello estará aqui, juntamente com sua equipe, para acertar os detalhes para a inauguração dessa unidade. Vamos disponibilizar uma ala para a montagem desses leitos. Começamos a montar no fim de semana, nosso pessoal já vai trabalhar aqui na questão da sinalização, da calibração desses respiradores e em outras providencias que são necessárias para começar a funcionar”, comentou o governador.


ENTREVISTA:


Marcus Lacerda - 
Infectologista da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira, EM MANAUS (am)


O que que agravou a situação no estado?
Primeiramente, acho que a gente não sabia o contágio do vírus. Viu que, de fato, tem a capacidade de se propagar de forma muito fácil. Fomos aprendendo, ao longo do tempo, no Brasil e no mundo inteiro, que a gente precisava se proteger mais. A introdução da máscara, por exemplo, que veio na sequência do vírus, aqui no Brasil, pode ter ajudado no controle da pandemia, mas no início, pouca gente usava máscara. Porém, a gente estava com a ideia de que a máscara deveria ser usada apenas pela pessoa que tinha sintomas. Hoje, sabe que quem não tem sintomas também deve usar a máscara. Cada local teve um tempo de entrada do vírus diferente e quantidade de pessoas infectadas. No início, Manaus deve ter tido número maior de pessoas que entraram infectadas na cidade vindas da Europa ou de São Paulo e isso deve ter contribuído para a disseminação rápida da doença. Também tem o fato de que março, abril e maio são os meses que em mais chove aqui em Manaus. Então, a gente chama isso de inverno amazônico, com temperaturas mais amenas e pessoas mais aglomeradas dentro de casa com janelas fechadas. Assim, a gente teve a introdução do vírus numa época em que a temperatura é mais amena do que a nossa temperatura média, o que faz com que haja maior transmissão de um vírus de transmissão respiratória, como a COVID-19.



Houve demora na adoção de medidas de isolamento social? O lockdown está sendo seguido na capital?
O isolamento social na cidade nunca passou de 40%, em média. Isso em todos os momentos da pandemia na capital. O isolamento social não chegou nem sequer à metade da população. E, de fato, não foi adotado o lockdown, mesmo quando a gente estava com número excessivo de pessoas morrendo pela doença. A gente também nunca entendeu se o lockdown seria aceito pela população. Obviamente, sempre tem a dúvida entre recomendar o isolamento social ou tomar medidas mais agressivas, como o lockdown. Acho que poucos lugares do Brasil tiveram essa iniciativa. Somente dois municípios do Amazonas fizeram isso. Em Manaus, de fato, teve discussão muito grande sobre fazer ou não lockdown, porém, por fim, não foi tomada essa medida pelo governo.

Quais as maiores dificuldades enfrentadas na luta para conter o novo coronavírus?
A maior dificuldade para todo mundo é, certamente, a disponibilidade de leitos de terapia intensiva, o que causa muita angústia. Manaus já tem diminuição gradual do número de casos, mas, hoje, a pandemia está concentrada mais no interior do estado. Os outros 61 municípios do estado são muito distantes da capital e não têm infraestrutura de hospitais equipados com leitos de UTI. Então, hoje, a gente está vendo essa nova guinada da pandemia dentro do estado. As pessoas mais graves são trazidas para a capital, que tem que dar esse suporte de trazer, por via aérea, pessoas de localidades muito distantes, tendo em vista o tamanho do nosso estado. (ARL)

* Estagiária sob supervisão do subeditor Paulo Nogueira