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Estado de Minas COVID-19

Omissão de dados pode colocar credibilidade do Brasil em xeque no exterior, aponta professor

Oliver Stuenkel disse que ausência de números relacionados ao coronavírus no país pode refletir no cenário econômico e institucional. Plataformas paralelas são criadas para divulgação de índices da COVID-19


postado em 08/06/2020 14:19 / atualizado em 08/06/2020 14:52

Governo do presidente Jair Bolsonaro pode ter problemas no cenário internacional(foto: Reprodução/Agência Brasil)
Governo do presidente Jair Bolsonaro pode ter problemas no cenário internacional (foto: Reprodução/Agência Brasil)
Buscar dados relacionados ao coronavírus no Brasil, como os números totais de pessoas infectadas e óbitos causados por complicações da doença, se tornou motivo de polêmica. Isso porque desde a última sexta-feira, o Ministério da Saúde tem fornecido estatísticas somente das últimas 24 horas, apagando, também, do site, os gráficos que mostravam as curvas do aumento de pacientes afetados pela COVID-19 e vidas perdidas pela enfermidade. Diante da omissão de dados, plataformas paralelas foram criadas com intuito de proporcionar maior transparência aos brasileiros. Mas, apesar disso, o preço pela ação do governo do presidente Jair Bolsonaro pode ser alto, principalmente no cenário internacional.

É o que alerta o professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, Oliver Stuenkel. De acordo com Stuenkel, a omissão de dados sobre o coronavírus pode afastar investidores do Brasil, uma vez a credibilidade de números fornecidos sobre o crescimento econômico, inflação e desemprego, por exemplo, podem perder credibilidade.

“O governo sabe muito bem que tipo de impacto isso tem para investidores. Eu, por exemplo, conversei com um investidor hoje de manhã e ele também disse: “Olha, governo que não divulga esses dados sobre os mais relevantes que a comunidade internacional mais quer saber agora para tomar uma decisão, cria uma preocupação adicional”. Governo que não fornece todos dados é um risco a mais”, avaliou Stuenkel.

A parte econômica é apenas uma das áreas que o Brasil pode ter sua credibilidade em xeque. Para o professor, a baixa confiança nos números divulgados pode limitar o espaço do país em discussões a níveis globais sobre o combate à pandemia do coronavírus, acendendo, também, o alerta para nações vizinhas em relação a fronteiras.

“Hoje em dia, tem a atuação de cada país em relação à pandemia, isso limita muito o espaço que o Brasil vai ter nas mesas para discutir o futuro da pandemia, para discutir o desenvolvimento de uma vacina, porque surge a dúvida: “Esse país está me passando dados corretos?””, disse Oliver.

Stuenkel afirmou que, de uma maneira geral, o Brasil perdeu credibilidade nos últimos meses no cenário internacional por ser um país pouco capaz de lidar com problemas internos. Para o futuro, com a melhora gradativa da situação de outras nações no que diz respeito ao coronavírus, a tendência é que o Brasil passe a ficar em evidência no exterior, porém, pelo lado negativo.

“Como todo mundo só fala da COVID-19, isso acaba ganhando uma visibilidade extrema também, porque no exterior, em vários países da Europa, nos Estados Unidos, a situação está melhorando aos poucos. Então o Brasil corre o risco de aparecer nas capas dos jornais da Europa, porque será um dos países mais afetados, enquanto outros países estão melhorando. Então aumenta ainda mais a visibilidade", analisou.

Para o professor, o governo Bolsonaro tenta levar os dados relacionados ao coronavírus para o campo da polarização. “Aqui no Brasil, tem os estados que vão prover esses dados. Os dados vão para o campo da polarização. Essa decisão de fornecer mínimos dados ou dados diferentes, faz com que quem apoie o governo possa dizer: “Bom, mas esses dados também não estão totalmente corretos”. Isso é uma tática que vemos em outros países com poder autoritário, onde cria-se uma incerteza geral para criar uma situação que você possa acreditar nos dados que você quiser, de qual lado você está. Essa tentativa é muito utilizada”, concluiu.

Plataformas paralelas


Com a ausência de informações relevantes do coronavírus, duas plataformas foram criadas nos últimos dias para tentar proporcionar maior transparência à população

Uma delas é gerenciada pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). Os dados para a base são colhidos diretamente nas secretarias estaduais de saúde. A plataforma organiza os estados por meio de um ranking com informações totais de números de casos, óbitos e taxas de letalidade de cada unidade federativa. A página também reúne estatísticas brutas de casos confirmados e mortes por COVID-19, além de informar índices registrados nas últimas 24 horas. O boletim do Conass é atualizado sempre às 18h.

“A ciência, a verdade e a informação precisa e oportuna são fios condutores do processo orientador da tomada de decisão na gestão da saúde”, publicou o presidente do Conass, Alberto Beltrame, que também é Secretário Estadual de Saúde do Pará.

Quem também disponibilizou um site com informações relacionadas aos números do coronavírus no Brasil foi o ex-secretário executivo do Ministério da Saúde, João Gabbardo. Atual secretário-executivo do Centro de Contingência do combate ao coronavírus em São Paulo, Gabbardo também buscará dados sobre a COVID-19 diretamente nas secretarias estaduais de saúde. De acordo com ele, a atualização será de hora em hora.

“Pelo menos no período que o Ministério da Saúde não estiver fazendo isso, nós vamos fazer (a divulgação dos números). Nós vamos diretamente nas bases dos estados e captamos as informações. Tudo é feito de forma informatizada, não existe o contato humano com esses números, não existe manipulação. A medida que os estados forem relatando suas informações, o sistema capta e a nossa base de dados será dinâmica. A cada atualização dos estados, vamos atualizar nosso painel. Significa que o nosso painel estará sempre atualizado com a última hora das atualizações feitas pelas secretarias estaduais de saúde”, disse Gabbardo, em entrevista ao canal CNN Brasil.

Nesse domingo, o Ministério da Saúde apresentou números divergentes à imprensa. No boletim divulgado por volta das 21h20, a pasta enviou informações que indicavam 1.382 mortes e 12.581 novos casos de coronavírus nas últimas 24 horas, totalizando 37.312 óbitos e 685.427 ocorrências da doença. No entanto, os dados divulgados no site estavam completamente diferentes, com 525 vidas perdidas e 18.912 registros de pacientes infectados, além de 6.803 pessoas curadas, dado que não havia sido informado no boletim enviado pela assessoria.

Também em entrevista à CNN Brasil, o ex-ministro da Saúde, Nelson Teich, pediu ‘trégua’ no conflito referente à divulgação de informações relacionadas ao coronavírus. “A saúde precisa de uma trégua. A sociedade precisa de uma trégua. O país precisa de uma trégua. A informação vai chegar. Ela sai das secretarias. Se o ministério não consolidar, alguém vai. Isso vai realçar a informação”, destacou.


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