Jornal Estado de Minas

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Fracasso em licitação deixa hospitais sem remédio para intubação

Fracassos em licitações têm deixado a maioria dos Estados à beira de zerar estoques de medicamentos essenciais para o uso de respiradores por pacientes graves da COVID-19, como sedativos. Segundo levantamento do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), 13 de 20 tentativas recentes de comprar fármacos do tipo terminaram sem ofertas ou com propostas acima do edital. O motivo, segundo representantes da indústria, é a alta demanda dos produtos.


O analgésico opióide "fentanil", por exemplo, está em falta em Amazonas, Bahia, Maranhão, Rio Grande do Norte, Tocantins e São Paulo. Outras cinco unidades federativas têm produto disponível para menos de uma semana. Os dados foram apresentados ontem à comissão da Câmara dos Deputados que trata da COVID-19.

Estado com maior número de casos e óbitos, São Paulo tem estoques zerados de 10 dos 22 produtos usados para intubar pacientes listados pelo conselho. Outros cinco se esgotam em menos de uma semana, segundo os dados do Conass.

Na reunião da Câmara, representante de entidade médica disse que a "angústia" da COVID-19 passou da busca de respiradores para encontrar uma forma de sedar pacientes. No procedimento, que fica sob risco pela falta de sedativos, médicos introduzem um tubo na traqueia do paciente. A estrutura é usada para auxiliar na ventilação. "Nossa angústia era, no primeiro momento, por respiradores mecânicos e equipamentos de proteção individual. Agora é estratégia química. Hoje estamos sem estratégia em alguns locais, o que vem trazendo bastante angústia", disse Marcelo Maia, futuro presidente da Associação de Medicina Intensivista Brasileira (Amib).


Segundo o consultor do Conass Heber Dobis, "quase todos os medicamentos estão zerando em todos os Estados". O setor privado também alerta sobre dificuldade para compras. A Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) informou na reunião que 81% das unidades têm dificuldade para compra de bloqueadores musculares.

Tempo
Coordenadora nacional do gabinete que acompanha ações da COVID-19 no Ministério Público, a subprocuradora-geral da República Celia Regina Souza Delgado disse que a busca por medicamentos está "equalizada", mas o desfecho das compras levará alguns dias.

Delgado explicou que havia um impasse. O Ministério da Saúde alega já ter repassado recursos para compras de medicamentos, mas Estados e municípios diziam não conseguir adquirir os produtos, pois as licitações terminavam desertas.


A saída foi o ministério mediar a compra. A pasta deve abrir "ata de registro de preços" de diversos fármacos. Na modalidade, são solicitadas ofertas para grande volume de produtos, que vão sendo comprados aos poucos, com os valores das propostas registradas. A ideia é que os Estados entrem nesta ata e comprem os produtos.

Além disso, o ministério afirma que buscará compras emergenciais no exterior pelo fundo rotativo da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).

Assessor da Secretaria Executiva da Saúde, Alessandro Glauci afirmou que a pasta "não consegue saber" o porquê das compras terminarem frustradas nos Estados, pois a indústria não tem alegado falta de estoque.

O presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos, Nelson Mussolini, disse aos deputados que o setor não tem capacidade de fornecer estoques para muitos meses. "Houve aumento muito grande de leitos para COVID-19. Subiu em três vezes a necessidade de produtos (como sedativos)", disse. Ele afirmou que a falta dos produtos é global. "Eram usados para cirurgias, durante 3 ou 4 horas. Agora, usa-se 24 horas no paciente intubado", disse.