Uma pequena ilha rochosa brasileira tem chamado atenção ao longo dos últimos cinco séculos por uma característica peculiar: ela é habitada quase que exclusivamente por cobras, mais especificamente da espécie jararaca-ilhoa (Bothrops insularis), encontradas apenas nesta ilha. O local fica a 35km do litoral de São Paulo, entre as cidades de Peruíbe e Itanhaém, e chama-se Ilha da Queimada Grande, também conhecida como Ilha das Cobras.
Além da alta concentração de um mesmo animal, a ilha também se destaca por ter o segundo maior aglomerado de cobras por área em todo o planeta. São cerca de 45 cobras por hectare – o equivalente a um campo de futebol. A ilha brasileira perde apenas para a Ilha de Shedao, na China.
Descobrimento
A Ilha da Queimada Grande foi descoberta em 1532, pela expedição colonizadora de Martim Afonso de Souza. Ela possui 1.500 metros de comprimento e 500 de largura – proporcional a 43 hectares. A altitude não passa dos 200 metros.
De acordo com especialistas, o colonizador Afonso de Souza e seus encarregados provavelmente protagonizaram o primeiro caso de devastação do local. Segundo o artigo científico Instituto Butantan e a jararaca-ilhoa: cem anos de história, mitos e ciência, do Instituto Butantan, a expedição estava de passagem pela costa sudeste do Brasil, quando os navegadores ancoraram na ilha, caçaram e, antes de voltarem aos navios, receosos de terem má sorte, atearam fogo na ilha. Entretanto, não existe registro de que Martim e seus oficiais tenham tido qualquer contato com a jararaca-ilhoa.
A prática de atear fogo à ilha se tornou corriqueira algum tempo depois, já no final do século 19. Por causa da implementação de um farol pela Marinha do Brasil, faroleiros que moravam na ilha ateavam fogo na vegetação com o intuito de matar os répteis. Daí o nome “Queimada Grande”, resultado das queimadas recorrentes na ilha que podiam ser avistadas no continente.
Evolução
A história da Ilha das Cobras é bem mais antiga em relação à época em que foi encontrada. Ela se formou no final da última era glacial, há cerca de 11 mil anos, quando o nível do mar subiu, separando aquele morro (que fazia parte da Serra do Mar) do continente. A segmentação acabou isolando uma população de jararacas comuns (Bothrops jararaca), que ao longo dos milhares de anos seguintes se diferenciou de suas parentes de continente e se transformaram na Bothrops insularis.
A jararaca-ilhoa acabou, então, tornando-se menor e menos pesada do que suas parentes, a fim de facilitar a locomoção durante a caçada nas árvores. A Bothrops insularis também adquiriu a capacidade de agarrar coisas utilizando a cauda, além da dentição ter ganho um aspecto mais curvo, para que possam prender as aves enquanto o veneno age. A peçonha destas jararacas são, ainda, muito mais ativa em aves, do que em mamíferos, e altamente potente.
A Bothrops insularis mede entre meio metro e um metro. As fêmeas são um pouco maiores. Outra característica dessa serpente é que ela é vivípara – não põe ovos, mas gesta de maneira semelhantes aos mamíferos – e dão à luz a 10 filhotes no período quente do ano.
Atualmente
O farol localizado na ilha foi automatizado em 1925 e sua manutenção é feita uma vez por ano por uma equipe da Marinha do Brasil. Por causa do perigo, o acesso à ilha é estritamente controlado e requer de autorização do Governo Federal, que é dada principalmente para pesquisadores.
Ameaçada de extinção
Apesar de haver cerca de duas mil cobras no local, biólogos alertam que a jararaca-ilhoa está criticamente ameaçada de extinção. O fato se dá por causa das constantes queimadas feitas por pescadores que querem desembarcar na ilha e do tráfico de animais silvestres. Um exemplar desta serpente pode alcançar o valor de R$ 30 mil.
A Ilha da Queimada Grande é uma Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) e pertence à Área de Proteção Ambiental (APA) de Cananéia-Iguape-Peruíbe.
Dia Mundial da Serpente
Nesta quinta-feira (16/7) é comemorado o Dia Mundial das Serpentes. A data foi criada com o objetivo de sensibilizar e ressaltar a importância deste réptil tão temido. Segundo o Zoológico de Brasília, as cobras existem há 112 milhões de anos e podem ser encontradas nas mais variadas formas e tamanhos. Atualmente, existem cerca de 3,7 mil espécies de serpentes catalogadas em todo o mundo.
“Todos os anos milhares de serpentes são abatidas, a maioria por um medo injustificado, pois nenhuma serpente procura pessoas para picar ou atacar. Elas agem apenas em defesa própria. Nós também ameaçamos as serpentes de outra forma, pelo tráfico de animais silvestres”, afirma o Zoo.
Estima-se que, a cada ano, mais de 5 milhões de cobras sejam comercializadas ilegalmente em todo o mundo. O Zoológico de Brasília, por exemplo, sentiu a dimensão desse problema durante as última semana, ao receber 26 serpentes de 13 espécies vítimas do tráfico.