A “carteirada” dada sábado (18/7), em Santos (SP), para refutar a obrigatoriedade de usar máscara cobrindo boca e nariz em locais públicos, não foi a primeira do desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Em outro vídeo que circula por redes sociais, ele já havia tido comportamento similar, desrespeitando outro agente da Guarda Civil Municipal de Santos. Esse episódio teria ocorrido em 26 de maio.
“O que perdeu (a eleição para o governo paulista, em 2018), o Márcio França (PSB), foi meu aluno na falculdade. Mas me convenceram a votar no João Doria Júnior (PSDB), votei contra meu amigo, votei no Doria, que só tem feito besteira. Se pago laudêmio (taxa equivalente a 5% do valor do imóvel, paga no momento da transferência do imóvel) para a Marinha, de quem é a competencia no terreno da Marinha? Se a Marinha não tem competência para legisalar aqui, não deveria receber”, diz o desembargador que acusa a Guarda Municipal de estar “amontoando gente” de um lado da via pública.
O doutor sabe falar francês. pic.twitter.com/cHyBbt98Gw
— Diego Amorim (@Diego1Amorim) July 19, 2020
O agente, que seria um inspetor da GM, ainda tenta argumentar, diz que “a ideia é conscientizar todo mundo”. “O senhor é muito mais esclarecido que todos nós aqui, mas o senhor fazendo esse tipo de coisa acaba motivando outras pessoas”, diz o guarda, que é interrompido por por Siqueira com frases em francês, em clara tentativa de provar superioridade.
Em seguida, o desembargador ameaça os interlocutores ao afirmar que eles não têm poder de polícia. “Não sei nem se vocês (da Guarda Municipal) têm Inquérito Policial Militar (IPM). Meu irmão, chamado Francis, é o procurador de Justiça que atua nos IPM. Vou entrar em contato com o presidente do Tribunal de Justiça Militar, Coronel Geraldi (na verdade, vice-presidente), e vocês vão ter um problema. Eu não quero, mas se vocês insistem...”.
A Prefeitura de Santos esclareceu que a gestão das praias está sob a competência e responsabilidade do município. De acordo com o artigo 14 da Lei Federal 13.240/2015, a administração municipal celebrou, em 2017, termo de adesão com a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), que repassa ao município a gestão das praias marítimas urbanas, inclusive bens de uso comum com exploração econômica, pelo período de 20 anos.
Coordenador de saúde
Siqueira foi coordenador da área de saúde do TJSP. Por isso, deveria saber que o uso de máscaras sanitárias é uma das principais medidas preventivas adotadas em todo o mundo para conter a pandemia do novo coronavírus. Como se trata de uma doença respiratória e altamente contagiosa, serve justamente para a prevenção. Segundo o o tribunal, Siqueira não exerce mais a função.
O Tribunal paulista informou que, ao tomar conhecimento, determinou imediata instauração de procedimento de apuração dos fatos; requisitou a gravação original e ouvirá, com a máxima brevidade, os guardas civis e o magistrado.A nota da assessoria de imprensa completa que o TJSP não compactua com atitudes de desrespeito às leis, regramentos administrativos ou de ofensas às pessoas.
Entenda o caso
O desembargador Eduardo Siqueira, sem máscara de proteção, ofendeu um guarda municipal que o abordou em Santos, no litoral paulista. No município, a medida protetiva é obrigatória desde 1º de maio. As multas variam de R$ 100 a R $200.
A cena pode ser vista em um vídeo divulgado nas redes sociais nesse sábado (18/7). Ao ser parado, o desembargador conversa com o guarda por um breve momento e logo faz uma ligação no celular. Durante a chamada, ele diz "Estou aqui com um analfabeto" e tenta fazer com que o agente converse com a pessoa que está na linha. O guarda nega.
É nesta hora que o homem se identifica como desembargador. Ele trabalha no Tribunal de Justiça de São Paulo e já foi coordenador da área de saúde do órgão.
O guarda aplica a multa ao desembargador, que rasga o documento ao meio e joga o papel no chão, dando as costas aos guardas municipais e prosseguindo com a caminhada.