Um estudo brasileiro coordenado pelos principais hospitais privados do País aponta que a hidroxicloroquina, associada ou não ao antibiótico azitromicina, não tem eficácia no tratamento de pacientes internados com quadros leves e moderados de covid-19.
A pesquisa, publicada nesta quinta-feira, 23, na revista científica New England Journal of Medicine, verificou ainda que, no grupo de pacientes que fez uso dos medicamentos, foram mais frequentes alterações nos exames de eletrocardiograma e de sangue que representam maior risco de arritmia cardíaca e lesões no fígado.
Participaram do ensaio clínico 667 pacientes de 55 hospitais, sob a coordenação de nove instituições: Hospitais Albert Einstein, HCor, Sírio-Libanês, Moinhos de Vento, Oswaldo Cruz e Beneficência Portuguesa de São Paulo, além do Brazilian Clinical Research Institute (BCRI) e Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva (BRICNet).
Os participantes foram divididos, de forma randomizada (por sorteio), em três grupos: um foi tratado com hidroxicloroquina, outro recebeu também recebeu o medicamento, mas associado à azitromicina, e o terceiro foi tratado somente com suporte clínico padrão, que inclui medicamentos para sintomas, catéter com oxigênio, entre outros.
Os pacientes que tomaram hidroxicloroquina (isolada ou associada à azitromicina) também receberam esse mesmo suporte clínico.
Os voluntários receberam as medicações por sete dias e foram acompanhados por duas semanas. Ao final do seguimento, os pesquisadores concluíram que não houve diferenças significativas na evolução dos pacientes dos diferentes grupos, o que, segundo o estudo, demonstra que a hidroxicloroquina não traz benefício no tratamento dos casos leves e moderados da doença.
"A avaliação foi feita de acordo com uma escala de sete possíveis desfechos, na qual o 1 é a alta do paciente e o 7, o óbito. Não observamos diferenças na evolução dos pacientes dos três grupos. Neste perfil de paciente, portanto, a utilização da hidroxicloroquina não promove uma melhora no estado clínico", explica a cardiologista Viviane Cordeiro Veiga, coordenadora de UTI da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo e uma das pesquisadoras do estudo.
Para o cardiologista Renato Lopes, pesquisador e professor da Unifesp e da Duke University (EUA), que também participou do estudo, os resultados da pesquisa brasileira mostram que, mesmo nos casos mais leves de covid-19, a hidroxicloroquina não traz benefício. "Outros estudos internacionais já mostraram que ela não tinha eficácia para casos graves, mas muitos críticos diziam que ela não havia funcionado porque foi administrada muito tarde, quando o paciente já estava grave. Mostramos que, mesmo quando o início do tratamento é precoce e em casos leves, não há eficácia", destaca.
Quanto aos eventos adversos, a pesquisa mostrou que os pacientes que tomaram hidroxicloroquina, com ou sem azitromicina, apresentaram, com mais frequência, uma alteração no eletrocardiograma chamada de aumento do intervalo QT, associado a maior risco de arritmia. Esses pacientes também apresentaram com mais frequência níveis elevados das enzimas TGO e TGP, que podem representar lesões no fígado.
O estudo divulgado nesta quinta é um dos nove ensaios clínicos conduzidos dentro da iniciativa batizada de Coalizão Covid-19 Brasil, que tem a participação dos seis hospitais e duas instituições de pesquisa.