A triste marca de 1 milhão de mortes por coronavírus em todo o mundo expôs uma fratura exposta voltada ao Brasil, que, sozinho, representa 14,2% das vidas perdidas em escala global - mais de 142 mil óbitos já foram confirmados pelo Ministério da Saúde. O percentual chama a atenção, uma vez que a população brasileira corresponde a 2,5% dos habitantes em escala mundial. Mas, afinal: os números apontam falha na gestão da pandemia no país? O Estado de Minas consultou especialistas, que também falaram sobre o aumento expressivo de casos em Manaus, capital do Amazonas, que está prestes a adotar lockdown.
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Brasil registra 317 mortes por COVID-19 em 24h, total chega a 142.058Taxa de contágio indica desaceleração da COVID-19 no BrasilBrasil registra média diária de 687 mortes causadas pela covid-19 nesta segundaPara a maior parte dos médicos ouvidos pela reportagem, houve falha na condução da gestão da COVID-19 no Brasil, principalmente pela falta de sinergia entre o governo federal, estados e municípios, chegando a ponto de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter de intervir e transferir a autonomia das tomadas de decisão aos dois últimos poderes citados. O fato de não ter havido um denominador comum - agravada com a troca constante de ministros da Saúde -, foi um dos erros apontados por Rodrigo Molina, infectologista e professor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM).
“No final, jogaram toda a responsabilidade para cima das prefeituras, sendo que algumas não tinham condição nenhuma de fazer uma gestão adequada. Tem município que não tem hospital, imagine fazer uma gestão pública ampla desse jeito? A gestão foi atribulada, o que culminou, sim, em um não controle efetivo quanto ao número de casos. Tanto que foram aumentando rapidamente, chegando a 100 mil mortes rápido”, analisa Molina.
A falta de alinhamento também foi destacada por Antônio Jorge, médico e ex-secretário de Saúde de Minas. Para Antônio, a decisão do STF foi importante, mas, na visão do especialista, faltou união entre os poderes para gerir a crise no país e classificou como “muito ruim” o fato de o Brasil concentrar 14% das mortes por coronavírus no mundo.
“O Supremo tomou uma medida importante, que foi: dada a urgência, os gestores municipais e estaduais têm alçada para tomar suas decisões. Isso pode ter sido benéfico em um aspecto, mas não é igual dizer que não deva haver uma cooperação nacional. O Ministério (da Saúde) precisa cada vez mais atualizar seus protocolos. Antes, era se você tivesse sintomas leves, que era para ficar em casa. Hoje, por qualquer sintoma tem que procurar a unidade de saúde. Esse papel normatizador deve ser feito pelo Ministério”, opina.
Já para Sylvia Lemos Hinricsen, médica infectologista da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), não só o Brasil, mas como todo o mundo, passou por um processo de aprendizado sobre a COVID-19. “ Acho que o que houve no mundo inteiro foram dificuldades de se entender a etiopatogenia do vírus e ter que aprendê-la com a linha do tempo, à medida que algum centro publicava alguma coisa sobre suas experiências. Foi muito observacional e muito em cima de tentativa de se fazer uma série de procedimentos, e hoje a gente já começa a ver algumas tendências”, afirma.
Manaus
Manaus, capital do Amazonas, registrou, entre 24 e 28 de setembro, 1.627 casos confirmados de COVID-19, número que, no mesmo período de agosto, estava em 1.255. Ou seja, um salto de quase 30%. Por isso, o prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB) chegou a propor ao governo do estado que fosse feito um lockdown para controlar a velocidade da doença que, apesar de estar alta, especialistas descartam que seja uma “segunda onda”, como vem acontecendo na Europa.
Para Rodrigo Molina, saltos no número de casos devem ser frequentes, uma vez que a população tem saído mais de casa em função das medidas de flexibilização de setores da economia, sendo que algumas pessoas ainda insistem em não usar máscara, formando, ainda aglomerações. O especialista chama a atenção para os feriados nacionais, como o próximo dia 12 de outubro, quando é celebrado o dia de Nossa Senhora da Aparecida - padroeira do Brasil.
“Devemos prever aí sempre novas ondas de aumento - não estou dizendo segunda onda -, mas períodos de elevação de casos. Estamos tendo um aumento de casos relativos ao feriado de 7 de setembro. Até falei com os alunos na aula que o brasileiro decretou o fim da pandemia no dia 7 de setembro. Foi todo mundo para a praia, todos os ambientes cheios, hotéis com 100% de ocupação, então agora estamos vendo, na verdade, o que esse fato está causando.”
Na visão de Antônio Jorge, o aumento do convívio social cria tendência de algumas localidaded do Brasil terem novos picos de incidências de casos. Apesar disso, o especialista não acredita que o caso de Manaus seja uma segunda onda. "Eu acho que, tanto na experiência internacional quanto aqui, a gente viu que passado aquele tsunami inicial, quando a gente flexibiliza o convívio social há um pique no número de casos. Isso está acontecendo em alguns locais, como em Manaus, de forma significativa, mas acho que é inevitável que tenhamos pequenas acelerações”, salienta.
Sylvia Lemos Hinricsen também acredita que, com fato de as pessoas estarem mais expostas ao vírus nas ruas, a incidência de casos aumenta, mas que é muito cedo falar em segunda onda. “Houve as flexibilizações, saiu de uma situação de que antes era uma quarentena de pânico, as pessoas dentro (de casa) e a partir do momento que elas começam a sair, elas começam a se expor.”
Cuidados
Para Antônio Jorge, há uma “naturalização” no número de mortes diárias por coronavírus no Brasil. Com as medidas restritivas cada vez mais flexíveis, de acordo com o especialista, é criada uma sensação de “relaxamento” por parte das pessoas, que acabam deixando de lado cuidados básicos, como a troca de máscara e a higienização das mãos, uma vez que, na visão do médico, deve demorar a ter uma escala industrial de uma vacina, mesmo que ela for liberada à população.
“Nem todos andam com álcool em gel, a máscara já dura mais de um dia, porque do ponto de vista comportamental, é muito difícil essa situação. Há um relaxamento, infelizmente as mortes acabam virando paisagem, a gente já acostumou a ver os números - apesar de estarem diminuindo, caiu para 800, é uma tragédia, ainda. Vai exigir muito das autoridades, recomendações de reforço desses cuidados”, salienta.
Sylvia Lemos Hinricsen também reforça o pedido para que a população redobre os cuidados, uma vez que a COVID-19 ainda circula pela sociedade e que a comunidade científica ainda está aprendendo sobre como combatê-lo de maneira efetiva.
“O vírus ainda circula. Ele não foi embora. Não se acaba uma pandemia apenas achando que a pandemia acabou, porque isso seria negar a circulação do vírus. Então todos os cuidados, os quatro pilares (uso da máscara, higienização das mãos e do ambiente, distanciamento físico de 1,5m a 2m e o distanciamento social), são importantíssimos, principalmente porque não temos ainda definições. O vírus ainda está sendo aprendido”, alerta.
Assim como Antônio Jorge, Rodrigo Molina chamou a atenção para a vacina, que não deve ser distribuída à população à curto prazo, fazendo com que as pessoas mantenham os cuidados, como a higienização e o uso da máscara.
“O vírus ainda está circulando. Isso não deve acabar tão cedo. A vacina não é uma realidade tão próxima. Mesmo que a vacina esteja liberada, ela não vai conseguir ser distribuída para toda a população, provavelmente será por segmentos, como a gente vê até hoje com a vacina da Influenza, e que a população até então que haja uma vacina efetiva liberada - incluindo a distribuição - é que tem que ter uma rotina de cuidados. Tratamento, uso de máscara, evitar aglomeração e se cuidar”, conclui.
O que é o coronavírus
Coronavírus são uma grande família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus (COVID-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doença pode causar infecções com sintomas inicialmente semelhantes aos resfriados ou gripes leves, mas com risco de se agravarem, podendo resultar em morte.
Vídeo: Por que você não deve espalhar tudo que recebe no Whatsapp
Como a COVID-19 é transmitida?
A transmissão dos coronavírus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secreções contaminadas, como gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal próximo, como toque ou aperto de mão, contato com objetos ou superfícies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.Vídeo: Pessoas sem sintomas transmitem o coronavírus?
Como se prevenir?
A recomendação é evitar aglomerações, ficar longe de quem apresenta sintomas de infecção respiratória, lavar as mãos com frequência, tossir com o antebraço em frente à boca e frequentemente fazer o uso de água e sabão para lavar as mãos ou álcool em gel após ter contato com superfícies e pessoas. Em casa, tome cuidados extras contra a COVID-19.Vídeo: Flexibilização do isolamento não é 'liberou geral'; saiba por quê
Quais os sintomas do coronavírus?
Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:
- Febre
- Tosse
- Falta de ar e dificuldade para respirar
- Problemas gástricos
- Diarreia
Em casos graves, as vítimas apresentam:
- Pneumonia
- Síndrome respiratória aguda severa
- Insuficiência renal
Vídeo explica por que você deve 'aprender a tossir'
Mitos e verdades sobre o vírus
Nas redes sociais, a propagação da COVID-19 espalhou também boatos sobre como o vírus Sars-CoV-2 é transmitido. E outras dúvidas foram surgindo: O álcool em gel é capaz de matar o vírus? O coronavírus é letal em um nível preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar várias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS não teria condições de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um médico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronavírus.Coronavírus e atividades ao ar livre: vídeo mostra o que diz a ciência
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