Jornal Estado de Minas

MEIO AMBIENTE

Queimadas fazem setembro ser pior mês da história do Pantanal

O Pantanal viu o último mês apresentar um aumento de 180% dos incêndios em relação ao mesmo período do ano passado. Com 8.106 focos de calor, o mês recém-encerrado foi o pior de todos os já observados desde o início do monitoramento feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em 1998.



Anteriormente, a marca pertencia a agosto de 2005, com 5.993 focos de calor. A três meses para o encerramento do ano, o Pantanal já compila um total de 18.259 focos, o pior índice já registrado na série histórica desde 1998. Entre os recordes negativos, especialistas alertam que as consequências serão sentidas em todo o Brasil.



Para pesquisadores da área, 2020, no quesito das queimadas, é ainda pior do que 2019, ano em que o fogo na Amazônia chamou a atenção de todo o mundo. Ao observar a situação vivenciada no Pantanal, que tem o cenário mais crítico, uma das maiores preocupações são as áreas devastadas. Segundo o coordenador-substituto do Programa de Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Alberto Setzer, cerca de 23% da área do bioma já foram queimados neste ano.

“O ano de 2020 está sendo extremo. O pior que nós tivemos”, disse Setzer, em audiência da comissão externa destinada a acompanhar as queimadas em biomas brasileiros, da Câmara dos Deputados. O especialista afirmou que o número de brigadistas disponíveis para conter os focos de calor da região é insuficiente. “São centenas de quilômetros de frente de fogo que deveriam ser combatidos. Para isso, hoje, contamos com centenas de brigadistas, heróis, na verdade, que estão tentando o possível para controlar isso. Só que não é com uma centena, ou algumas centenas, que vamos resolver a situação”, alertou.



(foto: Editoria de ilustração)

Na última quarta-feira, a comissão externa do Senado que acompanha as ações de enfrentamento aos incêndios no Pantanal convidou o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, a dar explicações sobre as medidas adotadas pelo governo a fim de conter e prevenir as queimadas no bioma. Segundo a assessoria de imprensa da pasta do Meio Ambiente, a participação do ministro está “prevista”.

O cenário caótico chama a atenção de ambientalistas, que afirmam que os números vistos são reflexo da falta de políticas públicas. “Nós avaliamos que isso é um reflexo da política anti-ambiental que tem sido implementada pelo governo Bolsonaro. Os números já foram bem ruins, em 2019, e estão piores, em 2020. Apesar de ter o conhecimento de que o Pantanal passaria por uma estação mais seca, o governo não tomou as medidas necessárias para prevenir que o fogo se alastrasse dessa maneira”, declarou a gestora ambiental do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.

Segundo ela, os esforços para impedir que o fogo se alastrasse na região deveriam ter sido maiores. “É um processo preventivo, no qual são colocados aceiros para evitar que o fogo passe de uma área para outra. Mas, também, é preciso ter mais fiscalização porque o que a Polícia Federal tem apontado nas investigações é que, mesmo no Pantanal, o fogo teve início em algumas fazendas de maneira criminosa”, indicou. Na sexta-feira passada, a PF revelou que os incêndios começaram em quatro fazendas de grande porte em Corumbá (MS). A suspeita é de que produtores rurais tenham colocado fogo na vegetação para transformar a área em pastagem.





Amazônia

O mês de setembro também apontou um aumento nos focos de calor de 60,6% na Amazônia, em relação ao mesmo período no ano anterior. Foram observados 12.092 focos a mais do que em setembro de 2019. A professora do departamento de química da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Adriana Gioda alerta que, independentemente de onde ocorra o incêndio, as consequências serão sentidas em todo o território nacional, e até mesmo em nível mundial. “É preciso que se entenda que essa queimada, quer seja no Pantanal, na Amazônia, na Califórnia, vai ter impacto na nossa vida. Pode não ser diretamente, mas vai ser de alguma forma”, afirmou.

Gioda ressaltou, ainda, que as queimadas emitem toneladas de gases e partículas, que afetam o aquecimento global, a produção de chuvas e até mesmo a saúde das pessoas. Além disso, ela explicou que a saúde dos biomas está interligada. “O desmatamento da Amazônia, por exemplo, influencia na produção do vapor d’água que é responsável pelas chuvas que ocorrem no Centro-Oeste. Tudo indica que no Pantanal está ocorrendo um maior índice de queimadas em função da falta de chuva.”

STF dá 48h para Salles explicar decisão (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)


A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber deu um prazo de 48 horas para que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, explique a decisão do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), presidido por ele, que revogou resoluções que protegiam as áreas de manguezais e de restingas. Uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) foi protocolada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) na segunda-feira, quando houve mudanças nas regras.





O despacho, proferido na quarta-feira, destaca a urgência e relevância da questão. Rosa também pediu pareceres da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Advocacia-Geral da União (AGU), antes de decidir se concederá ou não a liminar pedida pelo PT. “Diante da urgência qualificadora da tutela provisória requerida e da relevância do problema jurídico-constitucional posto, requisitem-se informações prévias ao Ministro de Estado do Meio Ambiente, a serem prestadas no prazo de 48 horas. Dê-se ainda vista ao Advogado-Geral da União e ao Procurador-Geral da República, no mesmo prazo”, diz um trecho do documento.

Destruição

“Os riscos que tal situação traz ao meio ambiente são inúmeros, não sendo exagero destacar que o ser humano destrói em segundos aquilo que a natureza demora séculos para construir. A questão é urgente. A ausência normativa protetiva poderá ocasionar na atuação imediata de diversas destruições ao meio ambiente, sem qualquer espécie de sanção ou meio de desincentivo”, escreveu o PT na ação, assinada pelo advogado Eugênio Aragão, pelo senador Jacques Wagner (PT-BA) e pelo deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP).

Na ADPF, a legenda pontua que as resoluções revogadas preveem regras imprescindíveis à preservação da biodiversidade e à proteção das formas de vida contidas nos ecossistemas por elas alcançados, e que a mudança não foi para instaurar novas regras, mas para extinguir “quaisquer regulamentações a nível nacional”. Uma decisão na Justiça Federal do Rio de Janeiro suspendeu, na terça, a reunião do Conama que revogou as referidas resoluções.