Jornal Estado de Minas

ABUSO DE AUTORIDADE

STF suspende inquérito contra desembargador que humilhou guardas municipais

O caso do desembargador Eduardo Siqueira, que viralizou em vídeo no qual constrange guardas municipais em uma praia de Santos (SP), ganhou mais um capítulo. É que o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o andamento de um inquérito do Superior Tribunal de Justiça (STJ). É nesse processo que se apura a existência de crime de abuso de autoridade por parte do magistrado, que chegou a chamar os agentes públicos de analfabetos.





A liminar foi concedida pelo ministro Gilmar Mendes no mesmo dia em que foi protocolado o pedido de Habeas Corpus (HC) no STF, quinta-feira (14/1). Após decorrido o prazo de comunicação das partes, a decisão foi publicada no Diário da Diário da Justiça Eletrônico (DJE) nesta segunda-feira (18/1). Como fundamentação para o pedido, a defesa do desembargador alega que não houve espaço para ampla defesa e contraditório durante a abertura do processo no STJ. Isso porque o inquérito na Corte teve duas etapas.

Em uma primeira análise, o pedido formulado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) foi rejeitado pelo relator do STJ alegando que os fatos apresentados pelo Ministério Público Federal (MPF) não indicavam que o desembargador tivesse usado da sua condição de agente público para receber benefício. Entretanto, o MPF entrou com recurso na Corte Especial do STJ que determinou a abertura do inquérito.

É nessa tramitação, entre uma decisão e outra do STJ, que se encontra o espaço usado pela defesa de Eduardo Siqueira para pedir a anulação de todo o processo no HC que tramita no Supremo. Segundo as alegações, não houve intimação para que o desembargador respondesse ao recurso e, por isso, o direito de defesa dele teria sido limitado.





No STF, Gilmar Medes acatou o argumento da defesa, ainda que em caráter provisório. Agora, a investigação contra Siqueira só poderá andar depois que o Habeas Corpus for definitivamente julgado pelo Supremo e apenas caso ele seja negado pela maioria da Corte Superior. Esse novo julgamento não tem data prevista até o momento.

Entenda
O desembargador Eduardo Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), foi flagrado em vídeo no dia 18 de julho de 2020 agredindo verbalmente dois guardas municipais da cidade de Santos: Cícero Hilário Roza Neto, que foi ofendido, e Roberto Guilhermino. Segundo relatos da época, a briga teria começado depois que os agentes informaram ao desembargador sobre uma lei municipal que obrigava o uso de máscara em locais públicos da cidade.

Siqueira se defendeu logo depois dos fatos dizendo que o vídeo da discussão na praia foi editado. Apesar disso, ele foi novamente flagrado, dias depois, sem máscara nas ruas da cidade paulista e declarou que ignora a guarda municipal. “Não dou a menor bola para eles”, disse à época. E essa não é a primeira conduta duvidosa do magistrado. Ele também foi investigado por ameaçar uma colega do TJSP.





No outro extremo da discussão, os dois guardas municipais acabaram sendo condecorados pela prefeitura de Santos por conseguirem manter a calma durante toda a briga. A ação ocorreu logo depois da comoção gerada pelas imagens na internet. Segundo declaração de Cícero Hilário Roza Neto, a repercussão do caso ajudou a diminuir a tristeza causada pelo constrangimento da briga. “Quando eu cheguei em casa, minha filha perguntou o que eu tinha feito para ele agir daquele jeito comigo, mas eu não sabia o que responder, só disse que estava fazendo meu trabalho”, declarou.

Processo disciplinar
Em outra batalha jurídica, Eduardo Siqueira enfrenta Processo Administrativo Disciplinar (PAD) no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Em agosto de 2020, ele foi afastado por decisão do corregedor nacional, Humberto Martins, que relata o caso no colegiado. No voto, Martins considerou que os fatos eram graves e que havia a possibilidade de reiteração da conduta.

Apesar dessa decisão unânime, não houve andamento no PAD nos cinco meses transcorridos desde então e não consta data para novos julgamentos do processo nos dados públicos disponibilizados pelo CNJ.





Recorrente
Essa não é a primeira polêmica pública envolvendo membros da magistratura e outros agentes públicos no país. Em 2014, por exemplo, a agente de trânsito Luciana Tamborini chegou a ser condenada a pagar multa de R$ 5 mil por multar um juiz durante uma blitz da Lei Seca. Na ocasião, ele estava sem carteira de habilitação e sem os documentos do carro, além disso, o veículos estava sem placa.

Ainda assim, foi Tamborini a condenada por abuso de autoridade. Internautas chegaram a fazer uma vaquinha para pagar a multa aplicada a ela, mas o processo foi extinto em setembro do ano passado, seis anos depois do começo da briga judicial, segundo informações do jornal Meia Hora. Na época, Tamborini chegou a dizer uma frase que ficou famosa em todo o país: “Você pode ser juiz, mas não é Deus”.

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