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Estado de Minas EFEITOS DA PANDEMIA

COVID-19: Estudo avalia condições de trabalho dos profissionais de saúde

Os dados indicam que 43,2% dos profissionais de saúde não se sentem protegidos no trabalho de enfrentamento da doença


22/03/2021 21:58 - atualizado 22/03/2021 22:28

Profissionais de saúde de Belo Horizonte protestam contra a morte de uma técnica de enfermagem, vítima de COVID-19(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 17/08/2020)
Profissionais de saúde de Belo Horizonte protestam contra a morte de uma técnica de enfermagem, vítima de COVID-19 (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press - 17/08/2020)
Há mais de um ano atuando na linha de frente contra a COVID-19, os profissionais da área da saúde estão esgotados. E essa exaustão é resultado não só da proximidade com o grande número de casos e mortes de pacientes, colegas de profissão e familiares. A pandemia provocou também alterações significativas em seu bem-estar pessoal e na vida profissional. 

 

 


De acordo com os resultados da pesquisa Condições de Trabalho dos Profissionais de Saúde no Contexto da COVID-19, realizada pela Fiocruz em todo o país, a pandemia alterou de modo significativo a vida de 95% desses trabalhadores. Os dados revelam, ainda, que quase 50% admitiram excesso de trabalho ao longo desta crise mundial de saúde, com jornadas superiores a 40 horas semanais. E quase metade deles (45%) precisa de mais de um emprego para sobreviver.

O levantamento avaliou o ambiente e a jornada de trabalho, o vínculo com a instituição, a vida do profissional na pré-pandemia e as consequências do atual processo de trabalho envolvendo aspectos físicos, emocionais e psíquicos desses profissionais. 

“Após um ano de caos sanitário, a pesquisa retrata a realidade daqueles profissionais que atuam na linha de frente, marcados pela dor, sofrimento e tristeza, com fortes sinais de esgotamento físico e mental. Trabalham em ambientes de forma extenuante, sobrecarregados para compensar o elevado absenteísmo. O medo da contaminação e da morte iminente acompanham seu dia a dia, em gestões marcadas pelo risco de confisco da cidadania do trabalhador (perdas dos direitos trabalhistas, terceirizações, desemprego, perda de renda, salários baixos, gastos extras com compras de EPIs, transporte alternativo e alimentação)”, detalhou a coordenadora do estudo, Maria Helena Machado.

Falta de proteção e medo de contaminar no trabalho


Os dados indicam que 43,2% dos profissionais de saúde não se sentem protegidos no trabalho de enfrentamento da COVID-19, e o principal motivo, para 23% deles, está relacionado à falta, à escassez e à inadequação do uso de EPIs - 64% revelaram a necessidade de improvisar equipamentos. 

Os participantes da pesquisa também relataram o medo generalizado de se contaminar no trabalho (18%), a ausência de estrutura adequada para realização da atividade (15%), além de fluxos de internação ineficientes (12,3%). O despreparo técnico dos profissionais para atuar na pandemia foi citado por 11,8%, enquanto 10,4% denunciaram a insensibilidade de gestores para suas necessidades profissionais.

Saúde e vida profissional


O levantamento também detectou graves e prejudiciais consequências à saúde mental daqueles que atuam na assistência aos pacientes infectados. As alterações mais comuns em seu cotidiano, citadas pelos profissionais, foram perturbação do sono (15,8%), irritabilidade/choro frequente/distúrbios em geral (13,6%), incapacidade de relaxar/estresse (11,7%), dificuldade de concentração ou pensamento lento (9,2%), perda de satisfação na carreira ou na vida/tristeza/apatia (9,1%), sensação negativa do futuro/pensamento negativo, suicida (8,3%) e alteração no apetite/alteração do peso (8,1%). 

Quando questionados a respeito das principais mudanças na rotina profissional, 22,2% declararam conviver com um trabalho extenuante. Apesar de 16% desses profissionais apontarem alteração referente a aspectos de biossegurança e contradições no cotidiano, a mesma proporção relatou melhora no relacionamento entre as equipes. O estudo demonstra ainda que 14% da força de trabalho que atua na linha de frente do combate à COVID-19 no país está no limite da exaustão. 

Desrespeito x fake news


A equipe responsável pelo estudo aponta que essas transformações decorrem de vários fatores. A falta de apoio institucional, segundo 60% dos entrevistados, é um deles. A desvalorização pela própria chefia (21%), a grande ocorrência de episódios de violência e discriminação (30,4%) e a falta de reconhecimento por parte da população usuária (somente 25% se sentem mais valorizados) também afligem os profissionais de saúde. 

“O estudo evidencia que 40% deles sofreram algum tipo de violência em seu ambiente de trabalho. Além disso, são vítimas de discriminação na própria vizinhança (33,7%) e no trajeto trabalho/casa (27,6%). Em outras palavras, as pessoas consideram que o trabalhador transporta o vírus, e, portanto, ele é um risco. Se não bastasse esse cenário desolador, esses profissionais de saúde experienciam a privação do convívio social entre colegas de trabalho, a privação da liberdade de ir e vir, o convívio social e a privação do convívio familiar”, explica Maria Helena Machado.

A pesquisa abordou, ainda, as percepções deles acerca das fake news propagadas ao longo desta pandemia. Mais de 90% dos profissionais de saúde admitiram que as falsas notícias são, sim, um verdadeiro obstáculo no combate ao novo coronavírus. No atendimento, 76% relataram que o paciente tinha algum tipo de crença referente às fake news, como a adoção de medicamentos ineficazes para prevenção e tratamento, por exemplo. 

Além disso, uma porcentagem expressiva dos trabalhadores (70%) discorda que os posicionamentos das autoridades sanitárias sobre a COVID-19 têm sido consistentes e esclarecedores.

Perfil


O questionário da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) e do Centro de Estudos Estratégicos (CEE) da Fiocruz considerou, além de médicos, enfermeiros, odontólogos, fisioterapeutas e farmacêuticos, todas as categorias profissionais da área da saúde, inclusive administrador hospitalar, engenheiro (segurança do trabalho, sanitarista) e um grande número de residentes e graduandos desta área, em mais de dois mil municípios. 

Os dados revelam que a força de trabalho durante a pandemia é majoritariamente feminina (77,6%). A maior parte da equipe é formada por enfermeiros (58,8%), seguida pelos médicos (22,6%), fisioterapeutas (5,7%), odontólogos (5,4%) e farmacêuticos (1,6%), com as demais profissões correspondendo a 5,7%. Importante registrar que cerca de 25% deles foram infectados pela doença.

A faixa etária relativa aos profissionais da linha de frente mais comum é entre 36 e 50 anos (44%). Trabalhadores jovens, de até 35 anos (38,4%), também possuem grande representatividade na assistência. No quesito cor ou raça, 57,7% se declaram brancos, 33,9% pardos e 6% pretos. O levantamento indica, ainda, que 34,5% dos profissionais trabalham em hospitais públicos, 25,7% na atenção primária e 11,2% atuam nos hospitais privados. A maior parte está concentrada nas capitais e regiões metropolitanas (60%). 

O questionário foi respondido por mais de 25 mil participantes. Desses, aproximadamente 16 mil representam o universo das profissões de saúde, segundo o Conselho Nacional de Saúde, contempladas nesta pesquisa. As demais categorias, que incluem técnicos, auxiliares e trabalhadores de nível médio, fazem parte da pesquisa inédita “Os trabalhadores invisíveis da Saúde”, cujos resultados serão divulgados ainda neste ano.

“A pandemia revelou a essencialidade da saúde em nossas vidas e paradoxalmente, revelou o quanto os profissionais de saúde não são considerados e respeitados nesse processo. Por meio da pesquisa, constata-se o estado de exaustão e sofrimento desses profissionais, que já entraram na pandemia adoecidos e cansados, e a situação sob a qual estão expostos só piorou tal quadro”, finalizou a coordenadora do estudo.
 
*Estagiária sob supervisão do subeditor Eduardo Oliveira 



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