O governo de São Paulo anunciou nesta quarta-feira (24/3) o início da vacinação, a partir de 12 de abril, de educadores acima de 47 anos que trabalhem em creches e escolas até o ensino médio nas redes municipais, estadual ou privada.
O secretário da Educação, Rossieli Soares, disse se tratar de um "dia de esperança para o professor que tem seus medos, mas sabe a importância de estar com seus estudantes, de pais e mães que sabem a importância da escola". O sindicato que representa professores da rede estadual paulista (Apeoesp) disse que a medida foi uma "vitória da mobilização" da categoria.
Entidades profissionais ligadas à educação vêm reivindicando a priorização de trabalhadores de escolas na vacinação, como forma de dar segurança à volta das aulas presenciais e, dessa forma, minimizar os danos causados por um ano de fechamento quase completo das escolas.
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No início de março, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, chegou a comemorar como uma "vitória da educação brasileira" o pedido ao Ministério da Saúde pela inclusão de professores entre os grupos prioritários, mas até agora a medida não teve efeitos práticos: nas versões mais recentes do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, do governo federal não constam mudanças no status de educadores na ordem dos grupos prioritários.
Na Câmara, ao menos dois projetos de lei em tramitação pedem a inclusão de professores entre os prioritários.
Não é uma equação fácil, em um momento em que o país dispõe de poucas vacinas e ainda sequer conseguiu vacinar sua população mais idosa - considerada a mais vulnerável à covid-19 - mas que vê o vírus avançando também entre grupos mais jovens e sem comorbidades, explica à BBC News Brasil Carla Domingues, ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde.
"Sem dúvida professores e policiais (também contemplados na decisão do governo paulista desta quarta-feira) precisam ser priorizados, mas no ponto em que chegamos é uma 'escolha de Sofia' entre quem tem que ser vacinado antes. Vamos ter que ir achando um ponto de equilíbrio, porque o aumento de jovens em UTIs coloca a gente em uma situação dessas", afirma Domingues.
O risco disso, junto a uma política nacional "pouco clara" até agora, é a migração de profissionais de outros Estados para tentar se vacinar, principalmente em municípios fronteiriços.
'Educação de volta nos trilhos'
Em dezembro, um comunicado emitido pela Unicef, braço da ONU para a infância, pediu que países priorizem a vacinação de professores logo em seguida à vacinação de profissionais da saúde, como "um passo crítico para colocar a educação das crianças de volta nos trilhos".
"Embora decisões sobre alocações de vacina caibam aos governos, as consequências da continuidade das perdas ou diminuições da educação são profundas, principalmente para os mais marginalizados. Quanto mais tempo as crianças permanecerem fora da escola, menores são as chances de elas voltarem, principalmente as mais marginalizadas", dizia a entidade.
"São decisões difíceis que exigem difíceis sacrifícios (trade-offs, no original em inglês). Mas o que não deve ser difícil é a decisão de fazer tudo em nosso poder para resguardar o futuro das próximas gerações. Isso começa por resguardar as pessoas responsáveis por abrir o futuro a elas."
Lentidão da vacinação
No âmbito internacional, um artigo recente publicado por integrantes da organização Teacher Task Force (TTF) apontou que, "apesar da urgência em proteger professores e outros profissionais da educação (...), eles não estão sendo priorizados em planos nacionais, em parte devido à lentidão na distribuição (de vacinas)".
Entre as exceções, diz a TTF, estão a região de Nova Déli, na Índia, onde "todas as equipes, incluindo professores, que estiveram ativamente envolvidos nos esforços de gerenciamento da covid-19 na cidade serão vacinados com prioridade como trabalhadores da linha de frente", e também o Chile, país latino-americano mais avançado na imunização (em relação a sua população) até agora, com cerca de 9 milhões de doses aplicadas em uma população de quase 19 milhões de pessoas.
"O Chile tem sido relativamente bem-sucedido em seu programa de vacinar professores. Para preparar para o retorno das aulas, o governo chileno incluiu professores e trabalhadores da educação desde cedo no esforço massivo de vacinação do país", diz o artigo.
"Nas duas últimas semanas, mais da metade dos 513 mil professores do país receberam doses a tempo de começar o ano letivo."
Em muitos outros países, dizem os autores, os educadores estão listados dentro do segundo grupo prioritário. Nos EUA, que tem um alto número absoluto de vacinas aplicadas, "foi solicitado que todos os Estados deem prioridade a professores nos esforços de vacinação, de acordo com o objetivo de ter todos os professores da pré-escola ao ensino médio e cuidadores de crianças vacinados com a primeira dose até o final de março".
Docentes 'relegados a posições mais baixas' no Brasil
Ao falar da situação brasileira, o artigo aponta que "em países como Itália e Brasil, professores estão relegados a posições mais baixas nos planos de priorização da vacina, junto a trabalhadores de segurança e prisionais, o que provocou greves".
Mas mesmo a Itália já começou a vacinar professores, em fevereiro.
De modo geral, a preocupação dos autores é de que "muitos países de renda baixa provavelmente não obterão doses o bastante para vacinar seus professores por um bom tempo. Isso coloca uma enorme pressão sobre os professores ao dar aulas presenciais enquanto colocam a sua saúde e da de outros em risco".
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