A babá Thayná de Oliveira Ferreira, que cuidou do menino Henry Borel, de 4 anos, morto em 8 de março com sinais de espancamento, afirmou à polícia que em três ocasiões o menino relatou ter sido agredido pelo vereador carioca Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho.
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Mãe de Isabella Nardoni envia mensagens de consolo a pai de HenryBabá admite que mentiu sobre agressões de Dr. Jairinho ao menino HenryJustiça do Rio nega habeas corpus a Jairinho e a mãe de HenryLaudo comprova que Henry sofreu 23 lesões na madrugada em que morreuBrasil tem dez casos de agressão a menor por horaTestemunha diz que Henry ligou para a mãe após ser agredido por JairinhoJuíza nega pedido de afastamento de Dr. Jairinho da Câmara Municipal do RioNova defesa de mãe de Henry Borel pedirá à polícia um novo depoimentoAs agressões, declarou Thainá, ocorreram em fevereiro, no apartamento em que o político, de 43 anos, vivia na Barra da Tijuca, na zona oeste, com a mãe da criança, a professora Monique Medeiros. A depoente disse que não testemunhou os episódios, mas ouviu relatos de Henry e constatou depois que ele tinha lesões pelo corpo.
Ao longo de mais de oito horas de depoimento, encerrado na madrugada da terça, 13, Thayná admitiu ter mentido em suas primeiras declarações no inquérito na 16ª DP (Barra da Tijuca), em 24 de março. Afirmou ter agido assim por ter medo de Jairinho e também por orientação de Monique e do advogado que defendia o casal.
Também contou que apagou conversas de WhatsApp, que mantivera com Monique, relatando as agressões e lesões de Henry. Segundo a babá, Monique nunca tomou providências para coibir as agressões. Ela e o namorado, disse, brigavam, mas rapidamente se reconciliavam.
"Por ter visto o que Jairinho tinha feito contra uma criança, (a babá) ficou com medo de que algo pudesse acontecer com ela própria", registrou a polícia.
Thayná trabalhou para o casal por 47 dias. Henry teria sido agredido, segundo a babá, por Dr. Jairinho em cômodos fechados e trancados por dentro. Uma vez, uma televisão estava ligada com volume alto. Por isso, ela não viu nem ouviu nada.
O advogado André França Barreto afirmou que o casal, preso na semana passada por determinação da Justiça, sob acusação de atrapalhar as investigação, contesta as acusações. Sustenta que os dois são inocentes. O Estadão não conseguiu falar com os defensores de Dr. Jairinho e de Monique nesta terça.
Agressões ocorreram três vezes, relatou babá
A primeira agressão relatada pela babá ocorreu em 2 de fevereiro, 16 dias depois que Thayná começou a cuidar de Henry. Entre 6h e 7h, a criança, em seu próprio quarto, chamou pela mãe, mas Monique havia saído para jogar futevôlei. Então Jairinho foi até o quarto de Henry, disse à babá que o menino era mimado e o chamou para o quarto do casal.
Eles ficaram por 30 minutos nesse cômodo, com a porta fechada, sem que a babá tenha ouvido qualquer barulho. Quando os dois saíram do quarto, a babá perguntou à criança o que Jairinho havia falado, e Henry disse que "tinha esquecido, que estava com soninho".
Na segunda tentativa, a criança mais uma vez disse não se lembrar. Monique chegou às 9h e a babá lhe contou o que havia ocorrido. A mãe disse apenas que tentaria descobrir os fatos. Nesse dia, a babá levou Henry à brinquedoteca do condomínio em que o menino morava, na Barra da Tijuca (zona oeste), e ele não quis brincar com as outras crianças alegando que estava com dores no joelho. Ao ouvir esse relato da babá, Monique disse a ela que o filho "deveria estar inventando".
Dez dias depois, em 12 de fevereiro, a sexta-feira anterior ao carnaval, Monique saiu às 14h30 para ir à academia e à manicure. Jairinho chegou uma hora depois, "de surpresa", já que ele não costumava estar em casa nesse horário. O padrasto então chamou Henry para o quarto do casal, e de lá a criança gritou: "Ô tia".
Thayná foi até o quarto e tentou abrir a porta, mas estava trancada. De fora, ouvia a TV ligada num canal infantil, com volume acima do normal. A babá relatou à polícia que então chamou Henry duas vezes, mas ninguém respondeu.
Thayná foi então à cozinha e, pelo Whatsapp, contou a Monique o que ocorria. Passados cerca de dez minutos, Jairinho e Henry saíram do quarto e a babá pegou a criança no colo. Ele estava "amuadinho" e reclamou de dor no joelho, contou a babá.
Quando Jairinho saiu da casa, o menino contou à babá que Jairinho tinha chutado e dado "uma banda" (rasteira) nele, e que "sempre fazia isso". O menino disse ainda que Jairinho lhe disse que "não podia contar (para os outros)" o ocorrido e que "ele perturba a mãe". Também afirmou que Jairinho lhe dissera que "tinha que obedecer ele" e que "se não, ia pegar" o menino.
Pelo telefone, a babá relatou o caso a Monique, que sugeriu a Thayná que desse um banho no garoto. Rumo ao banheiro, ela percebeu que o menino mancava. No chuveiro, Henry pediu que ela não lavasse a cabeça dele, pois sentia dores na região. Disse ainda que, em razão da "banda", machucou a cabeça e o joelho. A babá então relatou a Monique as lesões , pelo Whatsapp.
Ela pediu que a babá ligasse por chamada de vídeo, a partir do celular de Henry. O menino relatou as agressões e pediu que a mãe voltasse logo. A conversa ocorreu às 16h10.
Pouco depois da chamada de vídeo entre Monique e Henry, Jairinho chegou em casa. Exaltado, questionou o enteado sobre o que ele havia contado à mãe. Depois de tentar negar, o menino admitiu que tinha narrado a Monique as agressões que sofrera. Jairinho então disse que o menino "não poderia mentir para a mãe" e que ele (o padrasto) "ficava triste". Depois deixou Henry sozinho com a babá.
Monique só chegou em casa às 19h. A mãe pegou uma mala com roupas e outros objetos do filho e disse a Thayná que iria com ele à casa dos pais, em Bangu (zona oeste). A babá foi embora e no dia seguinte, sábado de Carnaval, viu pelo Instagram que Monique e Jairinho estavam juntos em Mangaratiba, na Costa Verde fluminense.
A babá só voltou ao trabalho na quarta-feira de Cinzas (17 de fevereiro). Não conversou com Monique sobre o ocorrido nos dias anteriores. Mas viu o resultado de um exame de raio-x e ouviu da patroa que Henry tinha reclamado do joelho. Fez a chapa, mas "não era nada".
Dias depois, Monique foi a uma psicóloga e deixou Henry e a babá na casa da mãe, Rosângela. Thayná então contou à avó sobre as agressões que o menino relatara. Rosângela ficou assustada e indagou se Henry estava mentindo. A babá respondeu que não, já que havia lesões comprovando as agressões. Em depoimento à polícia, a avó não contou que tivesse sabido de agressões ao neto.
A terceira agressão ocorreu na última semana de fevereiro. Monique estava na academia quando Jairinho chegou e chamou o enteado para o quarto do casal. Ficaram ali, de portas fechadas, por cerca de três minutos.
Depois o menino contou à babá que havia caído da cama e por isso estava com a cabeça doendo e o braço machucado. A babá perguntou então a Jairinho se Henry havia caído da cama e ele respondeu que não. Monique chegou logo depois, e a babá encerrou o horário de trabalho e foi para casa.
Depois da morte, Thayná foi pressionada
A babá disse à polícia que soube da morte de Henry por uma irmã de Jairinho, Thalita, que lhe telefonou no dia 8 de março. Thayná ficou surpresa, mas Thalita não entrou em detalhes. A babá logo associou a morte às agressões que o menino sofria.
Dias depois, Thalita voltou a ligar para a babá e pediu que ela fosse ao escritório do advogado André França Barreto, então responsável pela defesa do casal. A babá foi e, antes de conversar com o defensor, ficou a sós com Monique.
A mãe do menino pediu que ela não relatasse à Polícia as brigas que tinha com Dr. Jairinho e as agressões do político à criança. Também disse que deveria apagar as conversas por WhatsApp. Ela obedeceu, mas a polícia conseguiu recuperá-las, usando um software israelense.
Depois o advogado reforçou as orientações. Convenceu a babá a conceder entrevista a uma emissora de televisão. Segundo ela, teve de fazer afirmações previamente combinadas com o defensor para inocentar Monique e Jairinho.
Thayná disse não ter recebido nenhum dinheiro extra para mentir a favor dos patrões durante o primeiro depoimento à polícia. Além do próprio emprego, no qual ganhava R$ 2.300 mensais, o noivo e uma tia dela haviam conseguido empregos na prefeitura do Rio por intermédio de Jairinho.
A mãe dela trabalha na casa dos pais do vereador, como babá do sobrinho dele. Além disso, relatou ter ficado com medo de uma retaliação de Jairinho. Após a morte de Henry, o contrato da babá foi encerrado.
A babá também afirmou ter sido pressionada por Thalita a "não ser juíza do caso" de Jairinho e insinuou que não falasse tudo o que sabia. Usou a expressão "menos é mais". Thalita também teria perguntado sobre as mensagens de celular que ela trocava com Monique. O Estadão não conseguiu localizar Thalita. O depoimento da babá durou mais de dez horas. Ela só deixou a 16ª DP por volta das 3h desta terça-feira, 13.