Nesta segunda-feira, 7, todas as grávidas com mais de 18 anos começaram a ser vacinadas contra a COVID na capital paulista, seguindo o cronograma do governo estadual. Até então, estavam sendo imunizadas somente gestantes com comorbidades e da área da saúde. Em abril deste ano, as gestantes e puérperas foram incluídas no grupo prioritário do Plano Nacional de Imunização (PNI), como uma forma de minimizar os riscos da infecção pelo coronavírus. Mesmo assim, o recrudescimento da pandemia no Brasil deixa maternidades de São Paulo em alerta.
Com a elevação de casos de COVID-19 e riscos de variantes mais agressivas do coronavírus, o Grupo Santa Joana, o Hospital e Maternidade Christóvão da Gama, do Grupo Leforte, e o Departamento Materno Infantil do Hospital Israelita Albert Einstein já se preparam para uma "terceira onda" de atendimentos.
Do início da pandemia até a segunda quinzena de maio deste ano, segundo dados do Sistema de Informação de Vigilância da Gripe (Sivep-Gripe) do Ministério da Saúde, compilados pelo Estadão, 10.250 gestantes foram internadas por COVID-19 em hospitais do Brasil das redes pública e privada. Dessas, 2.350 gestantes (22,9%) foram encaminhadas para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e outras 819 morreram (8%). Do total, 6.072 gestantes (59,3%) foram infectadas no terceiro trimestre de gravidez.
Quando infectada pela COVID-19, maiores são os riscos de a gestante ter pré-eclâmpsia (caracterizada por pressão alta), desenvolver outras complicações e precisar de tratamento na UTI. Foi o caso da assistente administrativa, Rosana Franzo Batista, de 36 anos, que recebeu o diagnóstico positivo para a COVID-19 quando estava com 27 semanas. Dias depois, ela precisou ser internada na UTI. "Depois que o meu marido testou positivo, realizei por duas vezes o teste antes de ter a confirmação. Eu estava começando a ter dor de garganta, tosse e um pouco de cansaço", lembra.
Com infecção de urina e o quadro respiratório agravado, no dia 8 de março, a gestante foi hospitalizada e na tarde do dia 11 encaminhada para a UTI, apresentando mais de 80% do pulmão comprometido. Depois a situação piorou e precisou ser intubada. "Dei à luz no dia 12 às 19h38 ao meu segundo filho. Depois de sete dias quando fui extubada recebi a notícia da cesária e do nascimento dele. Até o dia 21 de março, fiquei na UTI e depois fui para o quarto. Mas só pude ver presencialmente o Pedro no dia 5 de abril, quando tive alta hospitalar. Até então, só podia olhar as fotos que meu marido tirava. No total, fiquei 28 dias internada", contou a assistente administrativa, que também é mãe do João, de 8 anos.
Diferentemente das mães que se emocionam durante o nascimento da criança, a alegria de Rosana veio quando finalmente pode conhecer o filho. "Não dá para descrever em palavras. Eu tremia muito. Um frio na barriga. Muita emoção", relembra.
O recém-nascido não foi diagnosticado com COVID-19, mas precisou ficar internado por dois meses e dois dias pela prematuridade. "Logo que nasceu também ficou intubado durante oito dias. Ficou internado para ganhar peso. Ele veio para casa em 14 de maio, o que aumentou ainda mais minha felicidade", diz a mãe.
Na residência, todos os cuidados são mantidos pela família. Rosana, inclusive ainda realiza sessões de fisioterapia. "Quando fui para o quarto no hospital, não conseguia andar, não conseguia comer sozinha e sentar. Tomava água com colher nos primeiros dias, foi como se estivesse aprendendo novamente a engolir", afirma.
O administrador Thiago Fagundes Batista, de 37 anos, relata o drama vivido como pai e marido. "É uma situação muito complicada. Eu sempre ficava na porta da UTI, na porta da sala de cirurgia acompanhando o que estava acontecendo e recebendo os boletins médicos. Foi difícil, mas por ser bastante religioso, ter amigos e familiares presentes e situação financeira em dia, consegui manter o controle. Mas receber a notícia de que a Rosana seria intubada foi realmente difícil. Após o nascimento do Pedro tudo deu certo, foi um divisor de águas. Comecei a ficar mais tranquilo, quando a Rosana e o Pedro foram extubados, coincidentemente no mesmo dia", lembra.
Maternidades mantêm protocolos rígidos de atendimentos
Números do Sivep-Gripe revelam uma alta quase três vezes maior entre março e a segunda quinzena de maio de 2021 com 3.469 internações de gestantes na comparação com 1.203 no mesmo período do ano passado, sendo os meses com maiores picos, seja na enfermaria ou UTI, entre março e abril deste ano, com 1.650 e 1.228, respectivamente. Dados parciais de maio já sinalizam 591 internações.
A coordenadora de Infectologia do Grupo Santa Joana demonstra preocupação com a elevação de casos no País da doença. "Praticamente todos os hospitais estão se preparando. A sensação é que está começando uma terceira onda e vamos sentir esse reflexo também nas maternidades", acredita.
Quando a gestante apresenta algum quadro clínico, principalmente de vírus respiratório, como influenza e COVID-19, geralmente precisa de hospitalização. "E as comorbidades sempre entram no fator gestante, como hipertensão e sobrepeso, o que aumenta ainda mais as complicações", afirma a especialista. A maioria das gestantes no terceiro trimestre de gravidez precisou antecipar o parto. "Foi necessário, mas conseguimos cuidar da mãe adequadamente e não perdemos nenhuma criança, mesmo nascendo prematura", acrescenta.
Ainda de acordo com a coordenadora de Infectologia do Grupo Santa Joana, dados nacionais apontam que 4.103 grávidas tiveram Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), além de COVID-19. Deste total no Brasil, 11,5% morreram. No Grupo Santa Joana, das 791 gestantes que passaram pelos hospitais do grupo desde o início da pandemia, 462 internaram (58%). "Das internadas, 92 gestantes precisaram de terapia intensiva. Das gestantes que precisaram de terapia intensiva por sofrer de SRAG, nossa taxa de óbito é de 1,08%, dez vezes menor que a média nacional. O diferencial é oferecer uma assistência precoce para as grávidas, como protocolo institucional muito bem estabelecido. Temos leitos de UTI voltados exclusivamente para gestantes", afirma a doutora Rosana.
Para manter a segurança durante os atendimentos, todos os protocolos estão sendo reforçados nos hospitais e maternidades do grupo. "Logo na entrada, temos uma ala separada para atender gestantes com COVID-19. Se o bebê nasce prematuro, também tem uma unidade dentro da UTI neonatal totalmente separada para crianças de mães com diagnóstico positivo", acrescenta a coordenadora de Infectologia do Grupo Santa Joana. Embora somente 4% dos bebês que nascem de mães confirmadas com COVID-19 venham a nascer infectados, o recém-nascido apenas é liberado para a rotina normal após apresentar dois resultados negativos do teste RT-PCR.
A testagem em todas as gestantes e acompanhantes é um dos protocolos exigidos pelo Hospital e Maternidade Christóvão da Gama, do Grupo Leforte. Na unidade, onde são realizados aproximadamente 100 partos por mês, 23 grávidas apresentaram resultado positivo desde o início da pandemia. "A grande maioria era assintomática e o diagnóstico foi feito porque todos os pacientes internados fazem o teste, mesmo a gestante que chega em quadro de emergência. No caso de resultado positivo, mãe e bebê são isolados, sendo a amamentação estimulada. Se acompanhante é COVID positivo pode ficar no quarto, do contrário, a mãe permanece sozinha. Todas as visitas também permanecem restritas", afirma Raphael Garcia Moreno Leão, coordenador médico de Ginecologia e Obstetrícia do hospital.
Segundo Leão, durante a pandemia, cinco gestantes precisaram de atendimento na UTI. "Dessas, duas eram diabéticas. Todas se recuperaram da doença, assim como os bebês que nasceram prematuros", diz Leão.
O coordenador médico de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital e Maternidade Christóvão da Gama, do Grupo Leforte, afirma que o grupo permanece preparado para um aumento no número de atendimentos. "Desde o início da pandemia aumentamos em quase três vezes o número de leitos. No pico da segunda onda, tivemos superlotação. Precisamos estar preparado para uma terceira onda", afirma.
Linus Pauling Fascina, gerente do Departamento Materno Infantil do Hospital Israelita Albert Einstein avalia que a pandemia continua sendo um desafio. "Nós percebemos que o grau de adaptação do vírus ganha cada vez mais velocidade. Com isso, sempre nos preocupamos com a chegada de uma nova onda e a pergunta que fazemos é se estamos preparados para ela do ponto de vista de resposta imunológica. Para uma terceira onda, estamos até mais preparados. Estamos ampliando o número de leitos. Com o surgimento de novas variantes, sabemos que algumas gestantes acabam apresentando mais complicações", avalia o médico.
Em 2020, de 2.973 internações de parto no Einstein, 68 gestantes estavam com COVID-19. Em 2021, a média se mantém. De 581 hospitalizações, 13 foram diagnosticadas com a doença.
Na maternidade, os protocolos também estão sendo mantidos. "Conseguimos realizar a triagem mesmo para a gestante. Sabemos se está infectada ou não. Com isso, podemos direcioná-la desde a entrada do hospital até a sala onde ela irá ficar", acrescenta Fascina.
Além disso, quando o parto é previsto ou agendado, a recomendação é que o teste de COVID-19 seja feito entre 48 e 24 horas. "Na maternidade, conseguimos ter o resultado do teste RT-PCR em menos de 1 hora. Mesmo se a gestante chegar em trabalho de parto, o exame é realizado e o resultado sai rapidamente", acrescenta o médico.
Apoio psicológico para gestantes com COVID-19
Monalisa Nascimento dos Santos Barros, psicóloga e professora adjunta da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), acredita que as gestantes precisam de um preparo mental para o parto, até porque a própria gestação é um momento de muita vulnerabilidade emocional para a mulher em qualquer situação, independentemente da pandemia da COVID-19. "Quando trabalhamos a gestante do ponto de vista emocional, na ampliação da resiliência e no manejo da ansiedade, ela ganha ferramentas para o enfrentamento de qualquer situação adversa que possa surgir. Particularmente no momento em que estamos vivendo, isso se torna ainda mais necessário quando a gestante é infectada pela COVID-19", avalia a especialista.
Monalisa afirma ainda que o medo em relação ao novo coronavírus acaba provocando uma resposta fisiológica com aumento da adrenalina e cortisol, hormônios do estresse. "Isso acontecendo por repetidas vezes também tem relação direta com a prematuridade e com o comportamento futuro do bebê, que está exposto a uma dose alta de estresse ao longo de toda a gestação", acrescenta.