"É Pfizer? Melhor", diz o rapaz na fila da Unidade Básica de Saúde (UBS) Bom Retiro, na região central de São Paulo. "É, veja bem... acho que dá para confiar mais nos americanos do que nos outros", completa. Se não é a regra, Caio Silveira, de 34 anos, tampouco chega a ser a exceção na corrida pela vacina contra a COVID-19.
A desconfiança que leva à preferência pelo imunizante da farmacêutica norte-americana em relação à Coronavac e à Oxford/AstraZeneca vem, muitas vezes, do acesso a informações desencontradas sobre reações indesejadas e níveis de proteção contra esta ou aquela variante do vírus. Em outras, o motivo é mais prático: algumas pessoas querem estar prontas para viajar quando a pandemia passar e temem a criação de um "passaporte da vacina".
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CEO diz que Pfizer pode produzir vacina contra cepa resistente em 100 dias Risco de infecção pelo coronavírus cai pela metade 13 dias após 1ª dose da PfizerDoria afirma que Ministério da Saúde ainda não entregou novas doses da PfizerEntrada de viajantes brasileiros nos Estados Unidos deve continuar suspensaMãe de vendedora morta no Rio desabafa: 'Parem de matar a gente'Opas alerta para casos na América Latina e sobre riscos da Copa AméricaPor ora, a imunização com a Coronavac não garante o acesso à União Europeia, por exemplo. Mas em alguns casos é só a vacinação em massa que deve liberar fronteiras. Desde 26 de janeiro, passageiros que nos últimos 14 dias estiveram em Reino Unido, Irlanda e 26 países europeus, além de África do Sul e Brasil (por causa das variantes), estão proibidos de entrar nos EUA.
No início deste mês, a Organização Mundial da Saúde (OMS) aprovou o uso emergencial da Coronavac, a vacina contra a COVID-19 mais comum no Brasil. A autorização foi um passo importante para que a União Europeia, que atualmente discute a flexibilização das suas fronteiras, comece a aceitar a entrada de pessoas já imunizadas com ela. Ainda assim, para quem tomou a vacina produzida no Instituto Butantan acessar o território europeu não é tarefa nada fácil. A viagem é condicionada à apresentação de um teste PCR feito até 72 horas antes do embarque e a uma quarentena de 14 dias no país de desembarque, com isolamento e rastreio de contatos.
Essa é uma das preocupações da comerciante Kika Kim, de 49 anos, um lugar à frente de Caio na fila. "Por enquanto não tenho nada planejado, mas é melhor tomar logo a que posso viajar se eu precisar", afirma.
Para Caio, viagens internacionais ainda são uma realidade distante. A preocupação do administrador é mesmo não ter reações adversas e poder contar com o que ele acredita ser a maior proteção da vacina da Pfizer. Ele sofre de asma e saiu do Tatuapé, na zona leste, após ouvir falar que ali conseguiria receber a primeira dose desse imunizante. Atestado médico à mão, ele busca o que seu irmão, que também sofre com a asma, já fez. Isso à parte, o medo de se infectar com uma cepa para a qual a vacina da AstraZeneca seja menos eficiente que as demais também pesa.
A cerca de 2 km dali, na UBS Santa Cecília, também na região central de São Paulo, a policial civil aposentada Rosimeire Ferreira, de 49 anos, foi atrás da "xepa", a sobra da vacina. Preferência? "A da Pfizer", diz. "A gente ouve que é melhor do que a Coronavac, então é essa. A da AstraZeneca parece que dá muita reação."
Cinco lugares atrás dela na fila, o estudante Maurício Kalife, 19, está ainda mais decidido. Para sua sorte, nesta terça-feira, 8, a vacina da farmacêutica americana era a que estava sendo oferecida. Não fosse o caso e ele procuraria outro posto de saúde. "Confio mais nos europeus e americanos", afirma.
Crítica
Não deveria ser o caso, explica a infectologista do Hospital Sírio-Libanês Mirian Dalben. Todas as vacinas disponíveis hoje no País são eficazes e seguras. "É muito complicado comparar a eficácia global das vacinas", diz. "O estudo da Pfizer foi feito antes da maioria das variantes surgir, no meio do ano passado, e a da Coronavac, depois." Lançadas após a fase três das pesquisas, todas elas ainda passam por acompanhamento para se medir a eficácia em populações maiores ao longo do tempo, a chamada fase 4. "Pode ser que depois de um tempo, no futuro, possa se dizer que uma é melhor que a outra para determinada população", afirma a infectologista. "Agora, o importante é tomar qualquer uma das três e não adiar. Não dá para ser sommelier de vacina."
Procurada, a Prefeitura de São Paulo afirma que todas as vacinas disponíveis no Brasil foram aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e têm eficácia comprovada. "A pasta orienta que não seja feita escolha de um imunizante e nem que a vacinação seja atrasada por isso." Em nota, a administração municipal afirma que "o Município dispõe de doses suficientes de vacinas contra COVID-19 para vacinar o público elegível e, neste momento, estão disponíveis os imunizantes da Pfizer para a primeira dose, Oxford/AstraZeneca para a primeira e segunda dose, e Coronavac, exclusivamente para a primeira dose de grávidas e puérperas e para a segunda dose dos grupos elegíveis".