Antes do início da perseguição a Lázaro Barbosa de Sousa, o povoado de Edilândia e o distrito de Girassol — ambos no município de Cocalzinho (GO) — recebiam muitos brasilienses e moradores de outras partes do país à procura de descanso, principalmente no fim de semana. Além da tranquilidade da região, o contato com a natureza permitia aos turistas se afastar da agitação dos centros urbanos e se refugiar nas chácaras do município. No entanto, desde que a caçada pelo foragido começou, há 15 dias, um fenômeno oposto predomina: habitantes deixam a área — até então pacata — em busca da movimentação das cidades maiores, onde se sentem mais seguros.
queda do movimento nos comércios foi uma das consequências do medo gerado pelas duas semanas de operação. Alguns empresários da região registraram diminuição de até 60% nas vendas, em relação ao período antes da caçada. Márcio de Matos, 32 anos, dono de uma loja de artigos para celular, conta que a situação o fez mudar o período de expediente. “Antes, abríamos às 8h; agora, às 9h ou 9h30. O horário de fechar também mudou. Dependendo do dia, ficávamos até as 18h30. Atualmente, dá 17h e começamos a nos organizar para ir embora”, relata o comerciante.
A A cautela também tem relação com a distância que Márcio precisa percorrer até chegar em casa, em Taguatinga. “Faço esse percurso todo dia. Preciso vir mais tarde (para Cocalzinho) e sair mais cedo, para passar pelas blitz em um horário seguro e chegar aqui com um movimento maior de outros lojistas. É aquela coisa: um comércio puxa o outro e, como a circulação está baixa, quando uma pessoa começa a fechar, todo mundo acompanha. Ninguém quer correr o risco de ficar sozinho com o estabelecimento aberto”, observa.
As perdas nas vendas passam de 50% do registrado antes da megaoperação na cidade. “Fazemos alguns trabalhos delivery, mas nem sempre compensa. Às vezes, o cliente mora em chácaras longe demais da loja. Além do custo da gasolina, entra de novo a questão do perigo, porque precisamos entregar um celular, por exemplo, em um local afastado”, completa Márcio.
Vaivém
A situação é a mesma em Edilândia. O gerente de um supermercado do povoado, que preferiu não ser identificado, relata que o movimento no fim de semana tem ficado abaixo do normal. “A maioria dos nossos clientes nesses dias é formada por pessoas que vêm da cidade passar um tempo aqui. Como eles não têm vindo para a roça, não há movimento. Além disso, os próprios moradores da região evitam ficar andando. Só saem mesmo quando não tem jeito. Até pensamos que Lázaro poderia tomar outro rumo, mas, pelo visto, ele insiste em ficar aqui nas redondezas”, opina o gerente.
O impacto econômico não se restringe a Cocalzinho. A população de Águas Lindas (GO), a cerca de 18km dali, também sofre com o medo. Os habitantes tentam manter a rotina, mas o fluxo das ruas deu lugar a um vaivém quase ininterrupto de carros de polícia, que percorrem a região de cima a baixo. Dono de uma lanchonete, Igor Freire Nogueira, 18, diz que, por enquanto, a procura dos clientes sobrevive ao clima de tensão.
“Funcionamos das 9h às 23h. Mas as pessoas estão preocupadas, quase não saem de casa. E tem muita gente falando que, caso ele (Lázaro) chegue mais perto, não vai nem sair mais. De um jeito ou de outro, o pessoal se prepara para o caso de precisar se isolar ou deixar a cidade”, comenta Igor. O jovem acrescenta que, apesar do movimento quase normal na lanchonete, um primo dele deixou Girassol, devido ao pânico. “Eles (o primo e a família) foram embora para Brasília. Levaram o cachorro e disseram que não voltam enquanto Lázaro não for pego.”
A reportagem tentou contato com a Secretaria Municipal de Turismo, Esporte e Lazer de Cocalzinho, para questionar sobre os impactos econômico registrados na cidade. Contudo, até o fechamento desta edição, nem o prefeito nem a pasta enviaram posicionamento.
Ciclismo
Com temperaturas de até 27°C em Cocalzinho, o último fim de semana convidava para um passeio de bicicleta Girassol adentro. Contudo, Laura Barreto Fonseca, 71, moradora de Águas Lindas, precisou mudar a rotina para evitar um possível encontro com Lázaro. “No sábado e no domingo, era sagrado eu sair com o grupo de ciclismo daqui (de Águas Lindas) para fazer trilha. Chegamos a percorrer de 40 a 45 quilômetros. Agora, com esse homem (Lázaro) solto, fica perigoso irmos e acabarmos dando de cara com ele”, afirma.
Com experiência em diversos campeonatos, Laura é a ciclista mais velha da cidade. Porém, precisou restringir a paixão pelo pedal para apenas 5 km de percurso dentro da própria cidade. “Não tem jeito, precisamos tomar cuidado. Mesmo que saiamos com cinco ou seis pessoas, sempre há o risco de algo acontecer. Algum pneu pode furar e, no meio do mato, se Lázaro aparece, já era. Não há o que fazer”, ressalta.
Para ela, o que atrapalha as buscas pelo foragido é, especialmente, a quantidade de informações falsas em circulação. Laura acredita que isso prejudica os policiais e amedronta mais a população. “Houve a história de que Lázaro estaria próximo ao presídio de Águas Lindas. Ninguém confirmou isso, e deve ser mentira, mas, ainda assim, ficamos com medo. Mesmo sendo, provavelmente, fake news, quem vai arriscar?”, questiona.
Apesar disso, Águas Lindas passa por rondas constantes de policiais. No Parque das Águas Bonitas 1, bairro afastado da cidade, equipes monitoram o perímetro. No intervalo de uma hora em que a equipe do Correio esteve no local, apareceram quatro carros das forças de segurança. Um integrante do grupo de buscas confessou: “Vocês que estão rodando por aqui, tomem cuidado. Nunca se sabe onde ele (Lázaro) vai aparecer. Não fiquem se expondo demais, não”, alertou.
Cinco dias sem pronunciamento
O 15º dia da megaoperação para capturar Lázaro Barbosa, 32 anos, levou as equipes de segurança a uma chácara em Girassol, distrito de Cocalzinho (GO) a cerca de 65km do centro de Brasília. Por volta das 18h30, policiais militares fizeram buscas em uma propriedade a 5km da base da força-tarefa, na Escola Municipal Alto da Boa Vista. As equipes chegaram às pressas ao endereço, em uma mata de difícil acesso. Não houve detalhes sobre o motivo da ação.
Pela manhã, peritos recolheram vestígios na chácara onde um caseiro trocou tiros com um suposto invasor, por volta das 20h40 de terça-feira. O funcionário da propriedade, um homem de 54 anos que pediu para não ser identificado, não conseguiu ver o suspeito. “Estava escuro e ouvi alguém tentar abrir a porta, batendo o pé nela. Dei um tiro e acendi a luz. Quando fiz isso, a pessoa fugiu. Estávamos a cerca de 50m um do outro. Não sei se ele queria me atingir, mas ele atirou”, relatou a testemunha.
A Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO) informou que os peritos têm recolhido vestígios em todas as áreas possíveis da chácara. A pasta também comunicou que o carro queimado encontrado na terça-feira “possivelmente não tem relação com o caso”. Contudo, a possibilidade não é descartada, pois o trabalho de análise levará mais tempo. Sobre os demais itens achados anteontem — um serrote e um lençol sujo de terra —, não houve novas informações.
O chefe da SSP-GO, Rodney Miranda, está há cinco dias sem se pronunciar sobre as buscas por Lázaro. O que se sabe, segundo nota de quarta-feira (23/6) da pasta, é que o perímetro da área monitorada está inalterado.
Colaboraram Darcianne Diogo e Samara Schwingel