Em entrevista exclusiva ao Correio Braziliense, o caseiro Alain Reis Santana, 34 anos, natural de Cipó (BA), contou, com detalhes o encontro que teve com Lázaro Barbosa Sousa, 32, suspeito investigado de assassinar uma família em Ceilândia Norte, balear quatro pessoas — entre elas um policial — e manter reféns. Alain chegou a ser preso na quinta-feira por suspeita de auxiliar na fuga de Lázaro, mas foi liberado em audiência de custódia no dia seguinte por não haver provas contundentes contra ele. O funcionário foi o responsável por mudar o rumo das investigações, pois até então, a polícia considerava que o fugitivo agia sozinho.
Morador de Águas Lindas de Goiás, Alain recebeu uma proposta de emprego há 21 dias. O serviço seria na Fazenda do Caetano, propriedade de 125 hectares em Girassol (GO), pertencente a Elmi Caetano Evangelista, 74, também preso por ajudar na fuga de Lázaro e por portar armas. Lá, ele cuidava da horta, dos animais e dos peixes. “Já tinha trabalhado para ele (Elmi) há alguns anos fazendo massa e mexendo com limpeza”, disse.
Alain chegou à fazenda dois dias depois da chacina que vitimou quatro pessoas da mesma família, no DF, e não tinha dimensão do perigo que enfrentaria. Em 18 de junho, logo no fim do expediente, por volta das 18h30, o funcionário se preparava para colocar a comida aos porcos, no curral, e, quando acendeu a luz, se deparou com Lázaro. “Ele estava em pé, encostado na parede, carregando o celular na tomada. Quando me viu, ele tirou o celular e saiu andando, mas não correu. De primeira, fiquei em dúvida, porque tinha visto o noticiário poucas vezes”, detalhou.O caseiro conta que Lázaro estava com a perna enfaixada, e que andava mancando.
Não demorou muito para Lázaro aparecer de novo na fazenda. Na quarta-feira, enquanto Alain estava agachado em frente ao galinheiro da propriedade, sentiu a pressão de uma mão no ombro. “Olhei para trás e achei que era o meu patrão (Elmi), mas era ele, o Lázaro.” O caseiro conta que reconheceu Lázaro imediatamente. O suspeito vestia uma camisa social e calça pretas, sapatos e estava com uma mochila preta e boné. “Ali, ele me ameaçou. Disse que sabia que eu morava no fundo da casa do pai dele, falou da minha família e deixou bem claro que se eu entregasse o esconderijo, iria matar eu, minha mulher e meus filhos. Depois, saiu”, detalhou.
Desconfiança
Frio: assim Alain definiu Lázaro. Quando ameaçado, o funcionário contou que o suspeito não ergueu a voz em nenhum momento. Pelo contrário, agiu com frieza e foi firme nas palavras. “Estava bem consciente. É um homem que tem coragem de matar mesmo. De doido, ele não tem nada”, frisou.
Até então, Alain não desconfiava que o patrão estivesse auxiliando na fuga de Lázaro, mas começou a desconfiar de Elmi. Uma das ordens dadas pelo fazendeiro a Alain foi de que ele impedisse a entrada da polícia na área. “Ele pediu para eu não autorizar os policiais a dormirem na chácara e para dizer que estava tudo bem”, relatou.
Alain contou que Lázaro permaneceu na fazenda por, ao menos, cinco dias, tendo livre acesso às dependências da casa. Em outra situação, quando ele chegou para trabalhar, por volta das 5h30, encontrou dois copos sujos de leite e sentiu falta do pão que estava sobre a mesa. “Eu que lavo a louça, e no dia anterior tinha deixado tudo limpo. Quando vi os copos, pensei: O que significa isso? Eu tinha ido embora e não ficou ninguém”, disse.
O funcionário começou a desconfiar do próprio patrão, justamente pelos rastros encontrados por ele. Na parede do curral, havia nomes escritos da mãe e do tio de Lázaro, um sinal de que Elmi conhecia muito bem o suspeito. Entre eles (Elmi e Alain) não havia conversa sobre Lázaro, nem mesmo o acompanhamento do caso pelos noticiários.
Em um outro acontecimento, o caseiro estava no quintal, e Lázaro, dentro de casa, quando os policiais se aproximavam da fazenda. Alain conta que Lázaro se escondeu rapidamente em um segundo quarto, que fica próximo a um corredor escuro, e estava com uma espingarda esperando os policiais para atirar. “Ele mandou eu sair de perto. Fui falar com a polícia e disse que estava tudo bem. Não denunciei por medo de morrer, já que ele disse meu endereço e citou toda a minha família.”
De suspeito a ajudante
Desde sexta-feira, quando deixou o presídio de Águas Lindas (GO), Alain permaneceu na base das forças de segurança, em Girassol, e auxiliou nas buscas por Lázaro. Casado e pai de cinco filhos, o caseiro conta que não tem para onde ir.
A mulher e os filhos estão ficando na casa de uma amiga, em Águas Lindas. “Já não tenho mais meu emprego e tivemos que nos mudar. Por enquanto, vou permanecer na base”, disse. Por meio de nota, os advogados de Alain, Adenilson dos Santos e Jonisvaldo José, afirmaram que o cliente colabora com as investigações. “Alain, mesmo estando em liberdade, de forma livre e espontânea colabora com as buscas do fugitivo Lázaro Barbosa Sousa, desde 26 de junho, em trabalho conjunto com a polícia, em razão de conhecer bem a região e o possível paradeiro dele (Lázaro). Tal situação comprova a boa fé, a boa índole”, finalizou.
480 horas de buscas sem sucesso
A busca por Lázaro Barbosa completa hoje 20 dias. São aproximadamente 480 horas que uma força-tarefa de mais de 200 policiais procura o homem acusado de quatro homicídios, sequestros, invasões e incêndios que aterrorizam a região de Cocalzinho (GO), onde um cerco está sendo realizado por agentes da segurança pública do estado. Uma barreira na BR-070, em Girassol sentido Edilândia, continua a postos parando todos os carros. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) pede para os motoristas abrirem os porta-malas e verifica se há algum vestígio do criminoso. Helicópteros patrulham áreas da mata da redondeza. Viaturas, com apoio de cães, realizam buscas em locais onde surgem denúncias de suspeitas de aparições do criminoso.
Trabalhador de Edilândia, Antônio Fagundes, 40 anos, comenta que todos andam aflitos pelos arredores de Edilândia, e que Lázaro não é conhecido pelos moradores. “Aqui todo mundo se conhece, todo mundo sabe da vida de todos, só não sabemos desse cara aí, porque ele não vivia aqui até querer se esconder perto da gente”, relata. A última suspeita foi a de o foragido ter sido visto em uma padaria de Girassol. A dona do estabelecimento e outros funcionários afirmam conhecer o sujeito e relatam tê-lo visto na noite de sexta-feira.
Enquanto os dias sem respostas aumentam a apreensão dos moradores da região, cresce também o desgaste da operação policial, como explica Moisés Martins de Sousa, advogado criminalista e delegado aposentado da Polícia Civil do Distrito Federal. “O tempo é inimigo da própria polícia, das forças de segurança, porque o desgaste humano contribui para a eficácia da operação. Claro que os policiais estão concentrados, com a intenção de o desfecho ser o mais rápido possível. Mas a situação é complexa, porque Lázaro não é só um fugitivo. Se fosse só um fugitivo, a estratégia seria desarmar o acampamento e deixar o serviço de inteligência localizar e efetivar a prisão. Mas o Lázaro, além de estar fugindo, está cometendo crimes graves, que trazem intranquilidade para a sociedade”, comenta o especialista em segurança pública.
Para Moisés, este é um dos momentos em que mais se faz necessário o acompanhamento e o trabalho do serviço de inteligência, com policiais infiltrados na região para receber informações, por exemplo. “Mas, o mesmo desgaste que as forças estão tendo, o Lázaro — caso se confirme que ele esteja na região, com o corte do elo de pessoas que estavam ajudando ele — também tem”.
Denúncias
A última atualização da Secretaria de Segurança Pública de Goiás, divulgada na noite de ontem, informa que “todas as denúncias recebidas pela força-tarefa são checadas”. A pasta reforça que isso não significa que o raio de atuação tenha mudado. “A força-tarefa informa que o perímetro continua o mesmo. As estratégias para reforçar o cerco são definidas à medida que as pistas de movimentação do fugitivo mostram que adaptações são necessárias”.
A operação está contando com o apoio de dois veículos da Secretaria da Polícia Militar do Rio de Janeiro que servem como repetidoras móveis de radiocomunicação. “Essas antenas repetidoras móveis facilitam a comunicação dos policiais em campo e a coordenação operacional da força-tarefa”, finaliza o informe.